Publicado em 25/11/2016 às 11h34.

Dia da Baiana: acarajé é fonte de renda e prazer

Reconhecidas como "Patrimônio Imaterial da Bahia", as baianas têm verdadeiros devotos, como times de futebol. Qual é a sua preferida?

James Martins
Foto: Ipac / Divulgação
Foto: Ipac / Divulgação

 

A profissão de baiana de acarajé foi oficializada com o decreto de lei municipal de Salvador nº 12.175/1998. Em 2004, as quituteiras passaram a ser consideradas “Patrimônio da Humanidade” pelo Instituto do Patrimônio e Artístico Nacional (Iphan). Em 2012, elas foram também reconhecidas como “Patrimônio Imaterial da Bahia” e “Patrimônio Cultural de Salvador”. Tudo isso, na verdade, revela o grande atraso de nosso tecido social, diante da importância gigantesca das baianas para a construção das culturas soteropolitana, baiana e brasileira. Demorou, podemos dizer.

Seja como for, 25 de novembro é a data escolhida para celebrar essas mulheres (e homens, por que não?) que no tabuleiro sustentam famílias, sonhos e anseios. Mas o que é que a baiana tem? “Quando ele morreu, mandaram um caixão de indigente. Eu devolvi. Peguei outro na funerária, que ele não merecia aquele. E fiz questão de pagar tudo, no tabuleiro do acarajé”, o depoimento comovente é de Romélia, viúva de Mestre Pastinha, ao comentar o descaso oficial com o grande capoeirista, quando da sua morte. Porém, sem desdenhar o brilho dele, o que se destaca na declaração é de fato a força, a altivez dela, a baiana de acarajé, também uma guerreira. E uma guerreira que, assim como os capoeiristas, também luta com arte, com dança, com sorriso no rosto.

Segundo a Associação das Baianas de Acarajé, Mingau, Receptivo e Similares do Estado da Bahia (Abam), existem cerca de quatro mil baianas (contando os baianos) espalhadas por diversos pontos de Salvador. Algumas são famosas, como Dinha, falecida em maio de 2008, mas que ainda empresta seu nome ao famoso largo onde comercializava seus produtos no Rio Vermelho: acarajé, abará, cocada, bolinho de estudante etc. Cira e Regina são outras estrelas da profissão e já foram até musas de canção de Lucas Santtana.

Mas há também muitas baianas menos conhecidas que têm uma verdadeira legião de seguidores fiéis, muito antes das redes sociais. É o caso de Binha, que vende a iguaria em sua própria casa, na Ladeira de São Cristóvão (Liberdade), sempre à noite, a partir das 22h. Natural de Santa Bárbara, interior do estado, ela oferece outra peculiaridade além do horário, o tamanho: seus acarajés e abarás são gigantes e chegam a pesar um quilo e meio! “Eu faço questão de sair de casa, moro no São Caetano, só para comprar o acarajé dela. Tem gente que nem acredita que existe um daquele tamanho”, conta o eletricista Edmar Bispo. Assim como ele, muita gente faz do ponto de Binha um verdadeiro relógio de ponto, e comparece diariamente.

Menos peculiar, mas também gigante no sabor, o acarajé de Meire faz tanto sucesso que ela, que começou com um tabuleiro no Extra da Rótula do Abacaxi, já tem filiais no Shopping Conexão (Cabula), Bompreço do Cabula e Bompreço Garibaldi. Todos vendem muito bem, obrigado. Aliás, coisa rara é tabuleiro de acarajé falir. Mesmo nas crises mais ferozes. Muito pelo contrário: o tabuleiro de acarajé serve tantas vezes como socorro quando outras profissões não garantem o sustento. “Algumas pessoas oscilam entre o tabuleiro e outras funções consideradas mais estáveis. Nem sempre pela lucratividade, mas sobretudo por questões de status, já que ainda há muito preconceito em relação a certas funções, principalmente as de raiz afro”, explica a socióloga Tatiane Muniz. E completa: “Mas, quando a coisa aperta mesmo, vêm as demissões das empresas, aí se recorre ao acarajé como tábua de salvação”. E é vendendo acarajé que muitas mulheres conduzem, sozinhas, suas famílias.

Já o baiano Gil, que há mais de 30 anos comanda o Campo da Pólvora, é uma exceção que, quando surgiu, gerou polêmica. Homem vendendo acarajé? “Hoje as pessoas se acostumaram, mas no início rolava muito estranhamento sim. Ainda acontece de vez em quando, mas é difícil”, explica ele, que decidiu inovar e inventou o acarajé vegetariano. Alérgico a camarão, Anderson Santos só come lá. “Eu prefiro, porque sei que aqui é garantido e delicioso”, diz. Para o jornalista Luís Filipe Veloso, o melhor acarajé da cidade é o de Marcita, em Pau da Lima. Já na opinião de Leila Silva, vendedora, é o de Cláudia, na Rua da Alegria (Liberdade). A cantora Laurinha Arantes garante que o de Maria, do ponto de ônibus do Colégio Manoel Devoto, é sensacional. E assim, como times de futebol, todo soteropolitano tem sua baiana do coração. No dia delas, que este ano cai em uma sexta-feira, o dia tradicional de se comer acarajé, deixamos a pergunta: qual é a sua?

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