Publicado em 08/12/2016 às 10h05.

Fazendas promovem turismo com exploração da escravidão no Brasil

Por R$ 45 ou R$ 65 é possível ser atendido por uma pessoa negra caracterizada como escrava, em um passeio de época

Redação
Foto: Igor Alecsander / The Intercept
Foto: Igor Alecsander / The Intercept

 

O “Turismo de Época” é um viés de sucesso no mundo inteiro. Porém, alguns temas históricos podem ser muito delicados para servirem à exploração dessa indústria. O Holocausto é um deles; a escravidão, outro. Mas é justamente o período da escravidão no Brasil que tem sido oferecido como tema de passeio no Vale do Paraíba fluminense, Região Sul do Rio de Janeiro.

Um dos pontos de maior destaque na oferta do serviço é a Fazenda Santa Eufrásia, em Vassouras, única propriedade particular tombada pelo Instituto do Patrimônio Histórico e Artístico Nacional no Rio de Janeiro (Iphan-RJ) no Vale do Café.

Construída por volta de 1830, a Santa Eufrásia foi comprada em 1895 pelo Coronel Horácio José de Lemos, cujos descendentes, como sua bisneta Elizabeth Dolson, são até hoje proprietários do local. E é Elizabeth, caracterizada como sinhá, quem recebe os turistas, mediante agendamento prévio. “Geralmente eu tenho uma mucama, mas ela fugiu. Ela foi pro mato. Já mandei o capitão do mato atrás dela, mas ela não voltou (…) Quando eu quero pegar um vestido, eu digo: ‘duas mucamas, por favor!’. Porque ninguém alcança lá em cima”, diz, com naturalidade.

Por R$ 45, o visitante tem direito a explorar os jardins, o cafezal, a casa e ainda ganha um “Lanche Imperial” no final, devidamente servido por “escravas” negras. “Racismo? Por causa de quê? Por que eu me visto de sinhá e tenho mucamas que se vestem de mucamas? Que isso! Não! Não faço nada racista aqui. Qual é o problema de ter… não!”, defende-se Elizabeth, que assumiu o comando da fazenda em 2011.

"Escravas" são contratadas por um mucamo de pele clara. Foto: Igor Alecsander / The Intercept
“Escravas” são contratadas por um mucamo de pele clara. Foto: Igor Alecsander / The Intercept

 

Sobre a contratação dos funcionários-atores, ela explica: “É um empregado, que mora aqui, que me ajuda, que se veste de mucamo também. Mas ele é branquinho! Então, a cor não tem nada a ver. Eu sou mais morena que esse empregado”, justifica. Em um vídeo em que apresenta a propriedade, Elizabeth exibe um “vira-mundo”, instrumento de tortura para escravos, mas assegura que o objeto não pertencia ao latifúndio: “Foi-me dado por uma pessoa que vinha pescar aqui com frequência”.

No entanto, o histórico de brutalidade na região é tão contundente que em 1829, o então fiscal da Vila de Valença (hoje Valença, município vizinho a Vassouras), Eleutério Delfim da Silva, demonstrou preocupação com os “castigos brutais que os escravos daquela Vila recebiam”, fazendo inclusive uma representação à Câmara para expor tais brutalidades. E você, o que acha de tomar um chazinho de capim limão servido por uma descendente de escravos caracterizada como seus ancestrais?

*Com informações do portal Geledés.

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