Publicado em 20/03/2017 às 10h06.

Carne fraca, um soco no estômago de um setor bom da nossa economia

A pecuária brasileira lutou e conseguiu o reconhecimento internacional de livrar-se da famigerada febre aftosa e por isso tornou-se grande exportador mundial de carne, in natura e beneficiada

Levi Vasconcelos

Frase da vez

“A carne é fraca, a alma é safada e o diabo ainda atenta!”

Caio Fernando Abreu, jornalista e escritor gaúcho (1948-1996)

Foto: Marcelo Camargo/Agência Brasil
Foto: Marcelo Camargo/Agência Brasil

 

Não é à toa que o ministro da Agricultura Blairo Maggi disse ter sofrido um soco no estômago com a Operação Carne Fraco, deflagrada no fim da semana passado pela Polícia Federal contra grandes frigoríficos.

O desserviço é planetário. A pecuária brasileira lutou e conseguiu o reconhecimento internacional de livrar-se da famigerada febre aftosa e por isso tornou-se grande exportador mundial de carne, in natura e beneficiada. E agora vem uma dessa, é realmente um soco para botar a língua de fora.

É simples de entender. É fundamental para a saúde do boi as vitaminas C e D. A vitamina C quem dá é a grama, já a D quem dá é o sol. E o Brasil, com as suas imensas pastagens, tem isso em abundância. Na Europa e nos países mais frios, acima e abaixo da linha do equador, o boi é confinado e as tais vitaminas são injetadas. Encarece bastante. Foi daí que a carne brasileira ganhou o mundo.

Blairo está particularmente indignado com o que chama de “fantasias” da PF ao dizer que os frigoríficos botavam papelão na carne, uma mentira já comprovada (que põe em dúvida o resto da operação). E o ministro ainda questiona: “Por que o Ministério da Agricultura não foi convidado para compartilhar a operação?”.

Resposta da PF: porque tinha gente do Ministério como alvo da investigação. Mas se fosse, os policiais teriam sabido que colocar cabeça de porco em embutidos não é nenhum disparate.

O advogado criminalista Antônio Carlos de Almeida Castro, o “Kakay”, carimba as preocupações gerais. Chama a operação de “irresponsável”.

Óbvio que boa parte do cabedal de credibilidade que o Brasil tinha voou pelos ares, também detonado por outra doença, a corrupção, ao que parece, não só incurável, como disseminada de cabo a rabo na pátria amada.

O escândalo da carne ganhou manchetes no mundo inteiro. Atinge, em cheio, a cadeia produtiva agropecuária. O governo agora corre atrás do prejuízo com a convicção de que a PF, com a habitual espetacularização das suas operações, fez gol contra.

A corrupção, como sempre

O escândalo da carne vem quando a moral dos políticos está no limbo. E a PF também aponta o envolvimento deles, além de servidores do Ministério da Agricultura no bolo.

É lamentável. Quando você vota, está delegando a alguém o poder de representá-lo. Em essência, a representação política é o povo, a sociedade, com os seus vários segmentos, lá representado, mas nosso modelo político construiu um sólido casamento promíscuo com grandes empresas que se volta contra o próprio povo, que ao invés de beneficiário vira vítima.

Levi Vasconcelos

Levi Vasconcelos é jornalista político, diretor de jornalismo do Bahia.ba e colunista de A Tarde.

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