Publicado em 11/07/2021 às 09h13.

Caretas de Acupe: conheça a tradição que domina os domingos de julho em Santo Amaro

Presente há mais de 175 anos, o evento é herança de negros escravizados

Erem Carla
Foto: Flickr/André Motta de Lima
Foto: Flickr/André Motta de Lima

 

Todos os domingos do mês de julho, às ruas de Acupe, em Santo Amaro, na Bahia, são tomadas por caretas repletas de simbolismo, cultura e história. De acordo com moradores e pesquisadores, a origem da festa surgiu ainda na época da escravidão, quando haviam engenhos no Recôncavo Baiano.

Mestre Dodô é responsável pelas Caretas de Acupe há 38 anos e contou ao bahia.ba como surgiu essa tradição.

“As Caretas de Acupe surgiram em 1850, quando em Acupe existia engenho. Um senhor de engenho fez uma festa para alegrar o povoado, quando de repente surgiu um negro disfarçado. Todos da festa gostaram, mas ninguém sabia quem era aquele homem”, relata.

Ao perceber o homem negro, o senhor mandou que recolhesse todos os escravizados para contagem. “Faltava um. Era justamente aquele que estava na festa. Ele se disfarçou e brincou com as pessoas, mas o plano dele era fugir. E enquanto todos estavam distraídos, ele conseguiu fugir. Foi assim que nasceu o grupo Caretas de Acupe”, explica Dodô. 

Foto: Nicolau Almeida
Foto: Nicolau Almeida

 

Ele contou que a expansão do desfile aconteceu gradualmente, já que por muito tempo ficou limitado ao distrito. “Começamos a apresentar em Saubara, Cabuçu, Cachoeira, Salvador, Feira de Santana, Brasília… Chegamos a ir na África!”, diz ao bahia.ba.

O molde das caretas é feita por Dodô com barro branco, papel de cimento molhado e goma de mandioca. Quanto ao traje, ele explica que existe uma ordem de vestimenta. “Começamos com um casaco que cubra nossos braços, uma calça, uma saia de palha de bananeira por baixo de uma saia redonda, um lençol para cobrir a cabeça e luvas de plástico na mãos para que as pessoas não reconheçam quem está por baixo da máscara”, conta.

Foto: Nicolau Almeida
Foto: Nicolau Almeida

 

Com a pandemia do coronavírus em todo país pelo segundo ano consecutivo,  poucos integrantes do grupo saem às ruas para desfilar neste mês. Willes Santos faz parte da Caretas desde 1994 e diz que os componentes do grupo se preparam durante todo o ano para ornamentar as caretas. 

“Nós fazemos uma vaquinha para comprar tintas para pintar as máscaras e as roupas que compõem o traje, porque mesmo sendo um evento histórico não recebemos nenhum auxílio financeiro para isso”, conta Willes.

Ele declara que o maior incentivo em meio às dificuldades é manter a tradição do povo. “Já fizemos viagens pelo Brasil e visitamos países como Haiti, Togo e França. É um prazer fazer parte do grupo e representar nossos antepassados para o mundo. Acupe é uma terra rica em cultura!”, afirma.

Foto: Willes Santos
Foto: Willes Santos

 

Melô das Caretas de Acupe

“Eu sou de um distrito pequeno, já venho dizendo querido povão, ponhamos a máscara no rosto, nós temos bom gosto, somos todos irmãos. Chegamos fazendo barulho, fazemos de tudo para te alegrar, queremos ver assustados o pobre coitado começa a gritar, acredite com toda certeza que nós somos a riqueza que Acupe tem à mostrar. Já passamos das festas juninas, cuidado menina com o que vou revelar: no primeiro domingo de julho, só se ouve barulho neste lindo lugar! Quer brincar conosco? É só fazer assim: bruuáá! Estas são as caretas de Acupe e você um dia vai apreciar!”

Foto: Nicolau Almeida
Foto: Nicolau Almeida

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