STF começa a julgar ações que questionam decisão do CNJ de acabar com manicômios judiciários
Opositores dizem que ações retiram direito de pessoas que necessitam de internamento; Conselho argumenta que SUS e Caps podem suprir esta necessidade
O Supremo Tribunal Federal (STF) começa a julgar nesta quinta-feira (10) a validade de uma resolução do Conselho Nacional de Justiça (CNJ) que determinou o fechamento de manicômios judiciários — estabelecimentos que abrigam pessoas que cometeram crimes e têm transtorno mental.
Segundo matéria da Folha de São Paulo, a norma afirma que pessoas consideradas inimputáveis pela Justiça —quando o réu não pode responder por seus atos— devem ser transferidas para atendimento nos Centros de Atenção Psicossocial (Caps) do Sistema Único de Saúde (SUS). Quatro entidades entraram com ações no STF questionando a diretriz: os partidos Podemos e União Brasil, as associações Brasileira de Psiquiatria e a Nacional dos Membros do Ministério Público. Todos os processos são de relatoria do ministro Edson Fachin.
Para os autores das ações, a resolução tira o direito de pessoas que necessitam de internamento em estabelecimentos médicos psiquiátricos do direito de restaurar sua saúde mental. Além disso, eles argumentam que o CNJ teria extrapolado suas atribuições ao editar a norma e alterar a aplicação de regras previstas no Código Penal. O texto cita, por exemplo, a previsão de medida de segurança de internação e a exigência de perícia médica psiquiátrica para avaliação, algo que poderia ser feito apenas por meio de lei federal.
Em complemento, eles apresentaram ainda uma nota de entidades médicas afirmando que a norma possibilitaria a soltura de pessoas sem condições de conviver em sociedade, o que representaria violação do direito à segurança pública e argumentam também que o fim dos estabelecimentos manicomiais atingiria direitos fundamentais das pessoas presas e submetidas a medidas de segurança, contrariando os parâmetros estabelecidos pela Convenção Internacional sobre os Direitos das Pessoas com Deficiência.
As ações ainda alegam que o número de Caps, unidades e profissionais especializados em saúde mental disponíveis para atendimento seria insuficiente para a demanda atual de pacientes, situação que seria agravada com a implementação da resolução. Gestores públicos estaduais e municipais já chegaram a afirmar que o SUS carece de estrutura adequada para receber estas pessoas por causa de restrições orçamentárias.
O vice-presidente do Conasems (Conselho Nacional de Secretarias Municipais de Saúde), Geraldo Reple Sobrinho, aponta também a falta de familiares dispostos a acolher as pessoas que saem dessas unidades e que devem ser encaminhadas aos serviços residenciais terapêuticos.
Sobrinho dá como exemplo o caso de São Bernardo do Campo (SP), onde ele atua como secretário municipal de Saúde, em que o custo de uma residência terapêutica para oito pessoas é de R$ 75 mil por mês e que muitas poderiam ser encaminhadas para moradias ou abrigos, sem precisar de toda essa estrutura, que demanda médicos e equipes 24 horas.
Ele acrescenta que o órgão tem dialogado com o CNJ para flexibilizar a resolução e que também há casos de pessoas que deveriam estar em presídios, pois representam riscos para a sociedade. O CNJ, por sua vez, sustenta que a resolução é direcionada ao Poder Judiciário e regulamenta disposições já previstas pela Lei Antimanicomial, de 2001 e pela convenção para pessoas com deficiência.
O Conselho argumenta ainda que o objetivo da norma é proteger o direito fundamental à saúde das pessoas com transtorno mental ou qualquer forma de deficiência psicossocial no âmbito do processo penal e da execução da medida de segurança e que um estudo realizado por eles mostrou que a maioria das pessoas internadas em manicômios judiciários possuem o perfil de homens pardos e pretos com diagnóstico de esquizofrenia e envolvidos em crimes de homicídio.
Desde fevereiro do ano passado, o CNJ tenta desativar essas instituições e encaminhar 2.276 internos para tratamento pelo SUS. Os tribunais terão até 29 de novembro deste ano para pedir a prorrogação dos prazos para implementação da resolução. A estrutura da Rede de Atenção Psicossocial (Raps) é composta por diferentes serviços de atenção à saúde mental e hospitais gerais com leitos psiquiátricos.
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