Pintura roubada pelos nazistas é encontrada em casa na Argentina

Uma pintura do século 17, roubada pelos nazistas em Amsterdã durante a Segunda Guerra Mundial e desaparecida por décadas, foi encontrada na Argentina, pendurada sobre o sofá da sala de estar de uma das filhas de um ex-oficial nazista, informou o jornal holandês Algemeen Dagblad (AD), que localizou o retrato nesta segunda-feira (25).

Na terça-feira (26), a polícia argentina realizou uma operação na casa, localizada na cidade costeira de Mar del Plata, em busca da obra, que se acredita ter sido saqueada há cerca de 80 anos de um colecionador judeu.

A pintura, intitulada Retrato de Dama, do pintor italiano Giuseppe Vittore Ghislandi, fazia parte da coleção do comerciante judeu Jacques Goudstikker, que morreu em 1940 enquanto fugia dos nazistas. Mais de 1.100 peças de sua galeria em Amsterdã, incluindo obras de Rembrandt e Vermeer, foram compradas por valores muito abaixo do real por altos oficiais nazistas, entre eles Hermann Göring.

O retrato acabou nas mãos de Friedrich Kadgien, oficial nazista próximo a Göring e membro da organização paramilitar SS, que fugiu para a Suíça e depois para a Argentina, falecendo em Buenos Aires em 1978. Documentos da época indicam que ele adquiriu diamantes e obras de arte por meio de extorsão em Amsterdã.

O banco de dados oficial holandês de arte desaparecida da Segunda Guerra Mundial, mantido pela Agência do Patrimônio Cultural da Holanda, identifica a obra como pertencente a Goudstikker, que possuía uma importante galeria antes da invasão nazista em maio de 1940.

O AD tentou por anos contato com as filhas de Kadgien, que sempre evitaram comentar o passado do pai. A obra foi finalmente descoberta quando uma das filhas colocou sua mansão à venda em uma imobiliária argentina, e fotos internas mostraram a pintura pendurada na sala de estar.

Especialistas: obra autêntica

Especialistas da Agência do Patrimônio Cultural da Holanda afirmam não haver motivo para acreditar que se trate de uma cópia, pois as medidas correspondem aos registros do arquivo. Apenas uma análise do verso da pintura poderá confirmar sua autenticidade por meio de marcações ou etiquetas originais.

A imobiliária Robles Casas & Campos não respondeu a pedidos de comentário. O anúncio da casa ainda estava ativo na noite de terça-feira (26/8), mas a imagem do retrato parece ter sido retirada.

O promotor federal Carlos Martínez disse à Associated Press que a pintura não foi encontrada na casa, mas que outros itens, como armas e gravuras, foram apreendidos e podem ser úteis na investigação. A polícia investiga possíveis acusações de ocultação e contrabando.

Herdeiros reivindicam obra

Os herdeiros de Goudstikker anunciaram que vão reclamar a pintura.

“Minha busca pelas obras do meu sogro começou no final da década de 1990 e continua até hoje. Nosso objetivo é recuperar todas as peças roubadas da coleção e restaurar seu legado”, afirmou Marei von Saher, de 81 anos.

Em 2006, após longa batalha judicial, o governo holandês devolveu 202 obras saqueadas da coleção de Goudstikker a Von Saher. A pintura agora localizada pode se tornar alvo de novo processo judicial se os atuais proprietários se recusarem a entregá-la.

Além disso, investigadores localizaram outra obra desaparecida, uma natureza-morta floral de Abraham Mignon, nas redes sociais das filhas de Kadgien.

Refúgio de nazistas na Argentina

O caso reabre a memória de nazistas que se refugiaram na Argentina após a Segunda Guerra Mundial, incluindo altos membros do partido e arquitetos do Holocausto, como Adolf Eichmann. Sob o governo do general Juan Perón (1946–1955), fugitivos nazistas trouxeram consigo propriedades judaicas saqueadas, incluindo ouro, depósitos bancários, pinturas, esculturas e móveis, cujo destino continua sendo investigado até hoje.