Gordo da Bahia: há 61 anos na Castro Alves, pipoqueiro também é monumento
Desde 1956, José Antônio Silva faz parte da região que ja foi a mais importante da capital e participou de histórias com governadores, roqueiros e ladrões

Imagine se Castro Alves sumisse da Praça Castro Alves por um dia. Melhor dito: imagine se a estátua de Castro Alves sumisse da Praça Castro Alves por um dia. Seria o maior bafafá, não é verdade? Pois é assim a cada vez que o pipoqueiro Gordo da Bahia não comparece, por um motivo qualquer, ao seu ponto de trabalho, ali mesmo na Praça Castro Alves, bem em frente ao cine Glauber Rocha. Vendedor da área desde 1956, José Antonio Silva, o famoso Gordo, já é um monumento do local. “Ah, basta eu não vir um dia que o pessoal faz uma agonia. Aqui, todo mundo me conhece, faço parte da paisagem”, diz ele, orgulhoso. Quem há de negar? Afinal, são 61 anos como pipoqueiro oficial da região que já foi o coração da cidade e hoje, mesmo com todas as mudanças urbanas, ainda é uma fatia fundamental do viver soteropolitano.
Se no próximo dia 23 de janeiro Gordo (Gordinho, para os íntimos) comemora 70 anos de vida, e sabendo que ele trabalha na região há 61 anos, não é difícil calcular a importância que o local também exerce em sua vida. Mas, a bem da verdade, ele não começou na praça e sim na Rua Ruy Barbosa, ali ao lado, e nem sempre foi pipoqueiro, mas baleiro. “Comecei vendendo doces e cigarros. Chocolate, queimado, essas coisas…, na frente do [cine] Tamoio. Mas logo depois passei para pipoca e estou aqui até hoje”, rememora. Mais que testemunha ocular da história, Gordo é personagem, ator desse filme que passa na memória de quem viu e viveu a época glamourosa da Rua Chile e arredores. “Era muito chique, lindo de se ver! Os letreiros iluminavam tudo! O letreiro da Pirelli mesmo, que ficava ali em cima [aponta para o edifício A Tarde, antiga sede do jornal, onde será o Hotel Fasano] dava pra ler lá da ilha de Itaparica…”, diz, de olhos acesos.
E o figurino não ficava atrás: “As pessoas se arrumavam para ir ao cinema. Maloqueiro não entrava. Eram aqueles vestidos longos, os homens de calça social, alguns de terno…”. Porém, nem tudo é motivo de saudade: “Tinha loja aqui em que preto não podia entrar, como a Sloper”, denuncia. Gordo era morador dos Barris quando começou a trabalhar, ainda criança, na zona rica da cidade.
Uma lembrança marcante é a das sessões especiais para o governador Luiz Viana Filho e sua comitiva, promovidas pelo Tamoio. Mesmo como trabalhador informal, o então baleiro também tinha que aderir às formalidades. “O gerente do cinema me avisava: ‘Olhe, amanhã o governador vem aí, se arrume’. E eu tinha que vir até de gravata borboleta”, ri, saudoso e divertido. Sobre a guloseima preferida do político, ele nem faz esforço para lembrar: “Sonho de Valsa”! Quando Gordinho começou a vender pipoca, ainda não havia os saquinhos que custam os olhos da cara nos cinemas. E muito menos baldes de pipoca. As mudanças que se sucederam desde então fazem o vendedor soltar a língua.

“O trânsito mesmo: a gente armava o baba, com os estudantes do curso de geografia que tinha ali, funcionários do Correio, os vendedores… O baba ia de 8 horas da noite até umas 10 e não passava um carro na Ruy Barbosa. Hoje em dia é esse engarrafamento desgraçado”, diz. O crescimento da violência é outra diferença fundamental que seu José Antônio destaca: “As pessoas passeavam aqui, compravam o ingresso antecipado e andavam pelas ruas, olhando as vitrines, tomando sorvete etc. Hoje em dia é muito assalto, ninguém pode nem andar com o celular tranquilamente. Isso também afasta muita gente da área”, lamenta.
E por falar em gente, ele conheceu todo mundo que passou pela região: de Raul Seixas a Antonio Carlos Magalhães, incluindo a legendária Mulher de Roxo. “Todos eles compraram em minha mão. Às vezes eu fazia dois turnos: um na frente do teatro, outro no cinema. Raul mesmo comprou comigo várias vezes. Caetano Veloso também”, afirma. Questionado sobre já ter sido assaltado, o vendedor comprova que o entrosamento ainda é a alma do negócio: “Nunca. Eu já estou aqui há tanto tempo que conheço todos eles [os bandidos]. Até me perguntam se tá tudo bem, se alguém buliu comigo. Quando me pedem um pouquinho de pipoca eu também não nego. Não tenho nada a ver com a vida deles, só quero trabalhar em paz”.
Ele também testemunha que a Praça Castro Alves, tradicional ponto de confluência dos trios elétricos no carnaval, também já foi palco de outras multidões, filas enormes, de cinema – podemos oportunamente classificar. “Os filmes de cowboy, principalmente, faziam muito sucesso. As filas davam voltas, muita gente mesmo. Filmes com Giuliano Gemma, então, tudo bilheteria! Inferno na Torre também foi assim, isso aqui encheu demais. Tinha gente que comprava o ingresso de um dia para o outro”, diz. E continua, procurando um parâmetro de comparação: “Foi como “Ghost”, lembra?”, cita, ao referir-se a um sucesso mais recente, mas ainda dos tempos em que o cinema de rua era comum. Solicitado a analisar o declínio da região, Gordo da Bahia acredita que a concorrência com os shoppings centers foi crucial. “O pessoal não vai deixar de ir ao shopping pra vir pra cá; a maioria. Ainda mais com essa violência”. E sobre um possível retorno dos tempos áureos, talvez com os adventos dos novos empreendimentos hoteleiros (o Palace Hotel já está funcionando), Gordo não acredita que aquela pujança se refaça nunca mais. “Quem viu, viu. Pode até melhorar, mas como era antes, acho difícil. São outros tempos”, diz.

Aposentado, torcedor do Bahia, com filhos criados, hoje em dia o trabalho é mais como uma terapia. Embora as vendagens não estejam mal. “Não vende mais como antes, é claro, mas vende sim. Eu estou aposentado, então estou tranquilo. Mas tiro um dinheiro daqui, com certeza. Só que o mais importante mesmo são as amizades, os papos”, afirma, secundado com dois fregueses, um deles com um saco de pipocas de R$ 3, o outro apenas com um exemplar de jornal, sentado em uma cadeira, empolgado em discutir música, política, fofoca, futebol. “Ele é muito querido, gente boa. Eu sei de gente que sai da Paralela só para vir passar um tempo aqui no carrinho, batendo um papo. Eu mesmo venho pela pipoca, que é gostosa, mas também por ele, Gordinho da Bahia, meu amigo”, declara-se Zé Luis dos Santos, cartorário, e torcedor do Vitória. “O unico defeito dele é ser Jahia”, brinca.
E enquanto a tarde cai atrás do poeta, o pipoqueiro segue seu ofício, homem comum, enfim, daqueles que, desde James Joyce e Bertolt Brecht, aprendemos a reconhecer como heróis. #GenteBoa
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