Publicado em 09/11/2016 às 14h21.

Imposto provisório sobre grandes fortunas – a hora pode ser agora

Num momento em que os governos buscam reduzir gastos, a ampliação da arrecadação deve ser considerada onde tecnicamente for possível e economicamente for viável

Jaciara Santos

 

Imagem ilustrativa (Fonte: Fecomércio)
Imagem ilustrativa (Fonte: Fecomércio)

 

Em 27 de outubro de 2015, no comentário econômico que fazia no programa “A Voz do Trabalhador”, do sindicalista e amigo Magno Lavigne, na Radio Tudo FM, ainda no governo da presidente Dilma, tratei de um tema polêmico, um verdadeiro mito, que deveria estar no meio do debate nacional diante da necessidade de se encontrar saídas para a crise do déficit público em meio à profunda recessão econômica do país. Falei da instituição do “IGF – Imposto sobre grandes fortunas”.

O único dos sete tributos federais previstos na Constituição de 1988, no seu Inciso VII do Artigo 153 da Constituição Federal de 1988, que não foi instituído. Lembrando que em 1989 o presidente FHC colocou a proposta, mas não avançou no Congresso.  Em 2010, a CCJ do Congresso Nacional aprovou, mas o projeto de lei complementar até hoje não foi submetido ao plenário.

Penso que neste momento, quando o governo federal e demais governos da federação buscam reduzir gastos, a ampliação da arrecadação deve ser considerada onde tecnicamente for possível e economicamente for viável.

Esse tema deve voltar a ser discutido no Congresso Nacional e na sociedade, de forma pragmática, sem paixões ideológicas.

Não tenho a pretensão de esgotar o tema, mas sim provocar o debate a partir do que escreveu o economista francês Thomas Piketty em seu livro de muito sucesso “O Capital no Século XXI”, e em artigos interessantes com visões favoráveis e antagônicas sobre o mesmo tema. Na ocasião, no programa da semana anterior, já tinha comentado sobre o IGF considerando o ambiente da absurda ampliação da concentração da riqueza nas economias pós-globalização.

No seu livro, Piketty afirma que não discutir impostos sobre riqueza é loucura. O IGF poderia ser atrelado à diminuição da carga tributária sobre o consumo. Além da regulamentação do imposto sobre grandes fortunas, fala ainda na importância de taxar a herança.

Como disse anteriormente, não tenho a pretensão de dizer verdades absolutas, sou economista, mas não sou acadêmico e meus comentários econômicos têm a pretensão de estimular apenas reflexões e o debate produtivo na sociedade.

No final de 2015, o mestre em finanças públicas e ex-secretário de finanças na gestão da prefeita Luiza Erundina em São Paulo, Amir Khair, em entrevista, calculou que a taxação de patrimônios poderia render, aproximadamente, R$100 bilhões por ano se aplicada alíquota média de 1%, em uma simulação hipotética, sobre valores dos bens das pessoas superiores a um milhão de reais. O IGF teria uma arrecadação semelhante àquela que tinha a CPMF. Hoje, essa estimativa pode ser exponencialmente ampliada se considerarmos os bilhões de reais declarados fruto da lei da repatriação.

 

Pessoas com mais riqueza são mais bem

agasalhadas pela legislação brasileira

 

Na realidade, sabemos que o Brasil tem uma distorção tributária muito grande porque taxa em excesso o consumo e subtributa o patrimônio e a renda. Quando você tem uma tributação mais equilibrada, como nos países desenvolvidos, essa tributação sobre o consumo não excede 30%.

Nas visões de Piketty e Khair, quando você tem imposto sobre grandes fortunas entrando na base tributária, você permite aliviar uma parte dessa tributação do consumo sem sacrificar a arrecadação pública.  Ambos concordam que deve haver isenção de parcela da população, no caso Brasil, superior a 90%.

Quanto à tributação da herança, também prevista na Constituição, é de fato usada no Brasil. A tributação sobre herança é conhecida como Imposto sobre Transmissão Causa Mortis, imposto que pertence exclusivamente aos estados. Essa alíquota é de 4%, uma das mais baixas do mundo. Então se você tivesse uma tributação sobre herança no nível internacional, por volta de 30%, você estaria também aliviando impostos sobre consumo e consequentemente melhorando atividade econômica e arrecadação pública.

Os adversários dessa ideia o chamam de “imposto da inveja”. Afirmam prejudicar o enriquecimento de uma economia. Alegam que a medida causaria a fuga de grandes patrimônios para outros países ou paraísos fiscais. Discordam do montante a arrecadar. Alegam se tratar de um imposto injusto que desestimula o empreendedorismo, a poupança e o investimento nos meios de produção. Seria a inveja disfarçada em justiça social. Dizem que “A competitividade do mercado se encarrega de distribuir a renda entre os mais eficientes, garantindo a eterna busca pela excelência, que sustenta nossa evolução”.

Nesse aspecto, penso que não haveria fuga de capitais, até porque nos outros países o Imposto de Renda não é de 27,5% como aqui. Em outros países são 40%, 50%, 60%. Pode ser que exista alguma ilha no mundo, mas talvez não caiba tanta gente como sugerem.

Também é importante citar que em contraponto às ideias de Piketty, o economista George Reisman – PHD em economia e autor do livro em inglês, traduzindo – “Capitalismo: Um tratado sobre economia”, afirma em seus estudos que é fato óbvio que a acumulação de capital e o progresso econômico dependem da poupança e da inovação. E estas, por sua vez, dependem da liberdade de se obter altos lucros e de se acumular grande riqueza.

O imposto de renda de pessoa física e suas alíquotas progressivas, o imposto de renda de pessoa jurídica, o imposto sobre heranças e o imposto sobre ganhos de capital são todos pagos com fundos que de outra forma teriam sido poupados e investidos em meios de produção. Todos esses impostos reduzem a demanda das empresas por mão de obra – em relação à demanda que haveria sem os impostos – e, consequentemente, reduzem ou os salários ou o volume de emprego que essas empresas podem oferecer, uma vez que os impostos destituem as empresas dos fundos com os quais pagariam esses salários.

Bem, está aí um bom debate econômico para o momento. O certo é que: “Pessoas que têm mais renda, mais riqueza, são muito bem agasalhadas pela legislação do Brasil”. Lembremos dos dados da pesquisa da Receita Federal que mostrou que a tributação proporcional sobre a renda incide muito mais sobre a classe média do que sobre os mais ricos.

Dadas a complexidade e polêmica do tema e a necessidade iminente de recursos para fazer face ao déficit, por essa razão proponho a instituição do IPGF – imposto de natureza provisória sobre grandes fortunas, a ser estabelecida não inferior a R$ 5 milhões, com data de início e término da tributação, assim como foi o IPMF, o que substancialmente facilitaria a sua aprovação em regime de urgência na Câmara Federal e no Senado. Vale lembrar que O Código Tributário Nacional prevê que, na iminência ou no caso de guerra externa, a União pode instituir, temporariamente, impostos extraordinários compreendidos ou não entre os referidos nesta Lei, suprimidos, gradativamente, no prazo máximo de cinco anos, contados da celebração da paz.

Lembremos que na crise surgem grandes ideias para transformação.

dultra-artigoAntonio Carlos F. Dultra é economista com MBA Executivo Internacional em Marketing pelo Instituto Português de Adm. e Marketing – Ipam – Portugal, pós-graduações em Política e Estratégia pela Adesg-BA e em Administração Financeira pela Faculdade Estácio de Sá-RJ. Atualmente é diretor de Administração e Finanças da Companhia de Processamento de Dados do Estado da Bahia – Prodeb.

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