Antonio Jorge Ferreira Melo é coronel da reserva da PMBA, professor e coordenador do Curso de Direito do Centro Universitário Estácio da Bahia e docente da Academia de Polícia Militar.
PM-BA: história, memória e lembrança
A Polícia Militar da Bahia acaba de completar 192 anos de existência. Pouquíssimas organizações no mundo chegam a esta marca
As comemorações fazem parte da vida social, nas esferas pública e privada. Assim, se na esfera privada, nascimentos, casamentos, aniversários são motivos para celebrações, no cotidiano público festejam-se aniversários de datas consideradas historicamente importantes, tais como “descobertas” de territórios ou saberes, de nascimento e morte de personagens, de publicações de obras, de fundações de cidades, de instituições, e assim por diante.
Nessa lógica, na linha do tempo da esfera pública baiana, na última sexta-feira (17), a Polícia Militar da Bahia comemorou merecidamente, com uma solenidade na sede do Batalhão de Polícia de Choque, em Lauro de Freitas, mais um aniversário da sua criação, pois completar 192 anos de existência não é apenas raro; é motivo para muita celebração. Afinal, pouquíssimas organizações no mundo chegam a esta marca.
Criada oficialmente por decreto do imperador Dom Pedro I, em 1825, como um “pequeno exército”, na feliz expressão de Dalmo Dallari, com o objetivo de manter a tranquilidade e segurança pública na província, a Polícia Militar da Bahia, na maior parte dos seus quase dois séculos de existência, foi mais uma corporação militar do que uma organização policial. Sendo, ao longo de sua existência, muito mais empregada para fins de segurança interna e de defesa nacional do que para as funções de segurança pública.
Mesmo sendo poucos os períodos em que, de fato, pode atuar como polícia urbana e ostensiva, a Polícia Militar da Bahia sempre buscou cumprir a sua missão constitucional de mantenedora da ordem pública, com a evolução do seu papel social se processando, ao longo do tempo, em consonância com a dinâmica político-social da própria sociedade onde se inseria.
Nesse sentido, o desenvolvimento da corporação, no aprimoramento de métodos e estratégias, formação de doutrina de atuação etc., foi influenciado, direta ou indiretamente, por diversos fatores, às vezes acelerando, às vezes retardando o processo. A maioria deles, porém, impulsionando a Polícia Militar para aquela que viria se tornar a sua atividade principal: o policiamento ostensivo.
Infelizmente, a história do Brasil e da Bahia reproduzida nos livros didáticos e aprendida nos bancos escolares está repleta de lacunas em relação a determinados fatos, sobretudo aqueles ligados à polícia ou às Forças Armadas, tendo em vista que, ao longo da nossa história, principalmente depois dos governos militares, estar ao lado da lei e da ordem se confunde, simplesmente, com o ser um mero instrumento da repressão.
A Polícia Militar da Bahia tem muita história e muita memória que se confundem com a própria história e a memória do Estado, pois o território onde hoje se localiza o Estado da Bahia, desde sua fundação, foi palco de conflitos, que, de certa forma, sempre forjaram em seus habitantes uma cultura de uso da força.
Com o passar do tempo, cada acontecimento histórico pode ser reescrito
Como memória e história, mesmo possuindo como matéria prima o passado, não são sinônimas, as relações entre ambas, não raro, são tensas. Assim, a grande pergunta é: o que se quer lembrar? Afinal, o que é que a Polícia Militar da Bahia tem? Qual a relevância da corporação para a história do Brasil e da Bahia? O que representou, de fato, o dia 17 de fevereiro de 1825? Ele é apenas mais um dia, no decorrer desses 192 anos? Ou merece ser mais conhecido como data histórica estadual?
Apesar de o mundo estar, sempre, em constantes transformações, comemorações de aniversários, queiramos ou não, têm a ver com histórias e memórias que contribuem positivamente para a autoimagem e a identidade de pessoas ou instituições que, ao fim e ao cabo, não podem ser compreendidas sem a ação dos sujeitos históricos e as memórias nelas envolvidas.
Na eterna dialética da lembrança e do esquecimento, não se pode preservar tudo, claro, a memória e a história são seleções, mas também não dá para se apagar todos os momentos vividos pela Polícia Militar da Bahia, ao longo de 192 anos. Afinal, com o passar do tempo, cada acontecimento histórico pode ser reescrito, através da história oficial e das releituras dessa história dialogada com as diferentes memórias dos diversos atores sociais.
Nesse sentido, ainda sob os ecos das comemorações do 192º aniversário, de criação da PM-BA, desejo que seus acertos possam ser aprimorados e que seus erros possam ser analisados e transformados em acertos. Tenho certeza de que experiência, conhecimento profissional e, sobretudo, espírito público não faltam aos homens e mulheres que escolheram como profissão servir e proteger a população baiana.
Se é verdade que a memória é um fenômeno sempre atual, uma ligação vivida no eterno presente, não menos verdadeiro é que a história é do passado uma representação. Portanto, por mais que a percepção não seja espelho da realidade, com certeza, ambas, rimam com saudade, no coração de um velho soldado.
E por falar em saudade, parodiando o famoso poeta e repentista paraibano Severino Lourenço da Silva Pinto, conhecido como Pinto do Monteiro, posso dizer que a PM-BA conheço desde criança e que a saudade de em suas fileiras não estar mais presente, não é saudade, é pura lembrança!
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