Ravengar, do pó ao pó
Treze anos após ser capturado na Estrada do Coco, Raimundo Alves de Souza, volta à prisão pelo mesmo crime: tráfico de drogas
Diz a sabedoria popular que “O pau que nasce torto, não tem jeito: morre torto”. É o que se pode depreender da trajetória do ex-empresário, ex-taxista, ex-apontador de jogo do bicho e tantas outras atividades exercidas ao longo de 64 anos, recém-completados em 30 de janeiro por Raimundo Alves de Souza, o Ravengar. Treze anos após a caçada espetacular que resultou em sua prisão, em um condomínio de luxo na Estrada do Coco, o homem de fala mansa e ar aparentemente inofensivo que chegou a ser dono de uma comunidade, o Morro do Águia – comunidade pobre do bairro de São Gonçalo do Retiro – volta a ser manchete. E a ser preso.
No que constitui uma das mais consistentes vitórias da polícia baiana, ele foi encarcerado em 2004. Sentenciado a 25 anos de prisão em 2006 (reduzidos depois para 22), Raimundo foi transferido para o regime semiaberto em 2012, após cumprir seis anos de reclusão.
Desde que viu seu império ruir, Raimundo, também conhecido como Raimundão, experimentou duras provações. Perdeu o status de maior traficante de cocaína de Salvador, foi abandonado pela mulher (que o trocou por um policial militar), teve um filho assassinado, viu minar a saúde. Mas, como provam os últimos acontecimentos, conservou o gosto pelo crime. Nesta quinta-feira (16), um dia antes do 13º aniversário de sua captura na Estrada do Coco, ele volta ao sistema prisional.
De acordo com informações da Policia Civil, Raimundo foi preso hoje pela manhã, sob a suspeita de comandar uma quadrilha da qual fazem parte dois filhos, um neto e sua atual companheira. Aliás, atuar em família não é novidade na carreira de crimes do velho Ravengar. Quando teve seu império desmontado, em 2004, levou consigo vários familiares, inclusive a mulher, que, tempos depois o trocaria por um PM.
Além de familiares, Raimundo costumava se cercar de policiais. Civis e militares. As investigações que levaram ao desmonte do Império Ravengar mostraram que, entre colaboradores e clientes, ele mantinha estreitas relações com oficiais e praças da PM, agentes da Polícia Civil, artistas, empresários, jornalistas, serventuários da Justiça, políticos… Não por acaso, mesmo com todas as evidências de suas atividades ilícitas, jamais foi flagrado com a mão na droga. O mais próximo de um flagrante de que foi alvo, aconteceu em agosto de 1993: foi encontrado próximo a um papelote com aproximadamente 15 gramas de cocaína – um nada, perto do montante que ele costumava movimentar, conforme testemunhas.
Nem mesmo durante a megaoperação de janeiro de 2004, quando uma força-tarefa invadiu e fez uma devassa no Morro do Águia, foram encontradas quantidades expressivas de entorpecentes no local.
Mas, do pó ao pó, a prisão desta quinta-feira, de certo modo, confirma a avaliação que em sua sentença, proferida em 28 de abril de 2006, o juiz Reginaldo Costa Rodrigues Nogueira, então titular da Segunda Vara de Tóxico de Salvador, faz do emblemático personagem: “(…) Embora tecnicamente primário, [o réu] não possui antecedentes recomendáveis, tendo respondido a processo da mesma natureza, apresenta desvio de conduta e uma personalidade voltada para o mundo criminoso (…)”. Ou seja, há 11 anos, um magistrado já previa a natureza irrecuperável do réu. Aquilo, portanto, que a sabedoria popular preconiza: quando o pau é torto, até suas cinzas serão tortas.
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