Joseildo cogita Câmara e critica ‘corporativismo terrível’ dos colegas
Ao bahia.ba, deputado do PT fala sobre governo de Rui Costa, da derrota no pleito de 2016 e a “ajuda” do vereador Igor Kannario para eleger o seu adversário
Há quase oito anos na Assembleia Legislativa da Bahia (AL-BA), o deputado estadual Joseildo Ramos (PT) cogita arrumar as malas e embarcar para Brasília. Tudo, no entanto, depende da reforma política, que pode alterar as regras do jogo na eleição de 2018.
Ao bahia.ba, o petista afirmou que, em princípio, trabalha pela sua candidatura à reeleição no Legislativo baiano, mas tem conversado com o governador Rui Costa sobre a possibilidade de subir mais um degrau na carreira política.
No segundo semestre deste ano, Joseildo Ramos deixou a Comissão de Constituição e Justiça (CCJ) na AL-BA para ser líder do PT. Para ele, é um papel “extremamente desafiador”, porque tem o “ônus de segurar a posição do governo”.
Perguntado porque tantos projetos de deputados são declarados inconstitucionais, o petista atribuiu ao “corporativismo terrível” dos seus colegas. “O camarada tende a não confrontar com um projeto que é sem pé nem cabeça do colega. Então, é um corporativismo ruim”, condenou.
Ainda na entrevista, Joseildo considera o governo de Rui melhor que o de Wagner, fala sobre a derrota no pleito de 2016 e da “ajuda” do vereador de Salvador, Igor Kannario (PHS), para eleger Joaquim Neto (DEM) prefeito de Alagoinhas.
Confira a entrevista na íntegra:
bahia.ba – O senhor trocou a presidência da Comissão de Constituição e Justiça (CCJ) pela liderança do PT? É vantajoso para o seu mandato?
Joseildo Ramos – São papéis diferentes e importâncias separadas. A presidência da CCJ envolve uma responsabilidade muito grande, porque, dentro da Casa, é o maior filtro que tem, principalmente quando os projetos tramitam normalmente e não vêm do Executivo. Então, passamos lá um bom período e achamos que nos desincumbimos razoavelmente com apoio de todos. O exercício na coordenação independe, na maior parte, da sua posição na Casa. Ali você tem a oportunidade de agir como magistrado. Na liderança do PT, há uma diferença, porque a questão é totalmente política. Você tem a representação do maior partido da Casa e tem mais responsabilidade na situação pelo apoio que tem ao governo. Por conta disso, é o que fica mais sujeito aos ônus de segurar a posição do governo. Então, na realidade é o papel mais melindroso e, do ponto de vista da política, para quem tem mandato é extremamente desafiador. Confere muita experiência para quem passa por ele.
.ba – Antes era Paulo Rangel, passou para Rosemberg Pinto e agora é o senhor. Houve alguma pressão do partido ou da bancada para que ocorresse a alteração?
JR – Não. Por incrível que pareça, entre nós, sempre o que comandava todo o ritmo de troca de comando nas diversas comissões e na liderança seria o rodízio. Algumas figuras permaneceram pela qualidade do trabalho que fizeram. Rosemberg foi uma delas. Acho que o trabalho que ele fez, do ponto de vista de unir a bancada e fazer convergir os encaminhamentos, foi bom. E também na relação do PT com outros partidos, inclusive de oposição. Hoje, eu acho que o papel se torna mais melindroso quanto mais se aproxima do processo eleitoral, porque as tensões se aprofundam.
.ba – O senhor ficou bastante tempo na presidência da CCJ e deve ter observado que grande quantidade de projetos de deputados é inconstitucional. Ao que o senhor atribui o alto número?
JR – Nós tivemos um cuidado enorme com relação a isso, mas existe, como bem você disse, uma limitação. Primeiro porque quem está coordenando não vota. Dificilmente há empate. É muito raro. E existe um corporativismo terrível. O camarada tende a não confrontar com um projeto que é sem pé nem cabeça do colega. Então, é um corporativismo ruim. A gente conseguiu implementar depois de muita discussão um núcleo de apoio jurídico. Pelo menos, cria um espaço de crítica. É uma espécie de pré-parecer. Não afasta a responsabilidade da pessoa que vai aviar o parecer, mas, pelo menos, leva a que reflita sobre aquela matéria. Isso tem ajudado bastante. Isso acontece em todas as casas legislativas.
“Existe uma possibilidade [de ser candidato a Câmara dos Deputados] por conta da estratégia que o partido está usando. Obviamente, tudo depende do que vai acontecer na reforma política, que, no fundo, não vai acontecer.”
.ba – O senhor era favorável à mudança na Constituição estadual para possibilitar que deputados apresentassem projetos que impusessem gastos ao Executivo. No entanto, o governador Rui Costa se posicionou contrário. O senhor mudou de posição?
JR – Deixa eu dizer, a minha resposta vai do ponto de vista prático. Quem fez aquela matéria para ter uma emenda constitucional foi Luciano Ribeiro, que é advogado. Então, está no texto que você não pode ter projeto de iniciativa legislativa que acarrete despesa para o Executivo. Isso é clássico e tem em todas [as constituições]. Mas, ao contrário do que todos nós pensamos, e por isso o projeto não foi à votação, no momento que tira aquela linha, então, não pode nada. Na Bahia, ao contrário do que a gente imaginava, não era só eu, mas todos, de que manter a redação do jeito que está, cria um espaço para aquilo que não gera despesa. Em todas as constituições estaduais, não tem essa referência. Na interpretação, no geral da Casa, não é porque não tem quórum para votar, mas porque ficou tácito que a forma como a emenda veio tira a prerrogativa do governador. Então, era inconstitucional. Não foi uma mudança de posição. Todos nós, inclusive eu, achávamos que [a Constituição da Bahia] era mais restritiva, mas quando a gente foi verificar o texto com calma, na realidade, a mudança prevista tirava prerrogativas claras do governador e, portanto, é inconstitucional.
.ba – Já estamos em um processo pré-eleitoral. Na eleição do próximo ano, o senhor disputa a reeleição ou pode ser candidato a deputado federal?
JR – Veja. Existe uma possibilidade [de ser candidato a Câmara dos Deputados] por conta da estratégia que o partido está usando. Obviamente, tudo depende do que vai acontecer na reforma política, que, no fundo, não vai acontecer. Será uma reforma meramente eleitoral, o que é um pecado para todos nós. Sempre que a gente tem oportunidade de avançar nesse processo político, a gente mexe naquilo que é eleitoral, e quem mexe é quem tem interesse. É raposa tomando conta de galinheiro. É muito difícil vir coisa boa por aí. Tenho a impressão, salvo o melhor juízo, de que a reforma foi para as cucuias. Por conta disso, tem um planejamento de determinados grupos petistas, e eu dentro deles, o Reencantar, e estamos discutindo com o governador que papel a gente pode jogar. A princípio, o que eu quero dizer é que estamos preparados para enfrentar o debate e a candidatura a estadual. E é o meu maior interesse.
.ba – Por enquanto, o projeto de reforma deve aprovar o “distritão” e muda a configuração, porque entram os mais votados. Muitos apostam que o PT deve perder espaço após ficar com imagem arranhada na Operação Lava Jato. Qual é a perspectiva do partido em relação à Assembleia Legislativa da Bahia? Hoje a legenda tem a maior bancada, com 12 deputados. A meta é ampliar ou manter?
JR – Sobre o distritão, em primeiro lugar, perde a política brasileira como um todo. Por quê? Porque além de personalizar a política efetivamente, nós poderemos ter a estreia de figuras notáveis que não são do meio da política e que podem despolitizar o ambiente. Enfraquece o que já é frágil, o conjunto de diversos políticos. É um golpe de morte. O distritão vem para fazer pior o que já não é bom. Agora, quando existe a expectativa do distrital misto, aí boa parte das pessoas do Partido dos Trabalhadores entende que haverá um fortalecimento não só do PT, mas de todos os partidos. A maior parte das pessoas dentro do PT tem interesse em ver isso estabelecido. Há um ano, quando nós saímos às ruas, percebíamos o olhar de profunda desconfiança. Hoje, nós do PT, em função dos últimos acontecimentos, temos muito mais possibilidade de andar livremente e aqueles que apoiam Temer não podem se pronunciar publicamente. São agredidos com palavras e até fisicamente. Então, eu acho que, para o Partido dos Trabalhadores, esta situação melhora na sua relação com o eleitorado. Mas se vai manter a bancada é um exercício a se fazer. Até hoje, acho que a gente vai ter mais trabalho para manter a bancada.
.ba – O deputado estadual Zé Neto está há bastante tempo na liderança da maioria, enquanto na liderança do PT tem um rodízio. Por que o comando do governo foi mantido? Falta um deputado com perfil para fazer o papel?
JR – Na realidade, a liderança do governo não é algo que seja afeito ao Partido dos Trabalhadores. A lógica é diferente, porque ali está quem o governo quer. Então, não é que falta alguém que queria, ou tope ser. Observe o perfil de quem era o líder do governo, Waldenor [Pereira, atualmente deputado federal], o quanto é diferente do deputado Zé Neto. É uma amplitude de comportamento da política.
.ba – Mas há uma coisa em comum. Os dois são do PT. Desde quando Wagner assumiu, a liderança do governo sempre foi do Partido dos Trabalhadores.
JR – É. Eu diria que, para qualquer governo, se o seu partido é majoritário, e me parece que nos dois momentos foi, é muito difícil o governante não escolher alguém do PT. Só se não tivesse. Agora, o Zé Neto é fato. Já se colocou várias vezes à disposição para cumprir outros papéis igualmente importantes, mas os governadores entenderam que ele deveria permanecer. Não acredito que há ausência de alguém que possa cumprir esse papel. Até porque, naquela Casa, as coisas vão rodando e você se apropriando das relações.
.ba – O senhor perdeu a disputa em Alagoinhas no fim do ano passado. E há agora uma expectativa de que a próxima eleição tenha dois pólos semelhantes ao de sua cidade. De um lado, o grupo do prefeito de Salvador, ACM Neto. Do outro, o do governador Rui Costa. Qual é a influência de ACM Neto hoje no pleito estadual, na sua opinião?
JR – Eu não diria que a gente perdeu [em Alagoinhas], mas deixamos de ganhar. Há uma diferença muito grande. Da primeira vez, o PCdoB lançou antes de um ano a campanha para minha sucessão e manteve até o final. Isso tirou uma capacidade de mantermos a frente na gestão. Agora, por um tensionamento interno, do ex-vereador Radiovaldo Costa, excelente vereador e sindicalista reconhecido, que achou que era preterido como candidato, ele saiu do PT e foi para a Rede. E aí fica o vereador Luciano Sérgio, que também era um pretendente. Internamente, o vereador Luciano tinha muito mais uma relação construída e constituída dentro do PT. Então, do ponto de vista da agremiação, ele passava melhor. E, eleitoralmente, muito melhor do que Luciano, estava o Radiovaldo. Na minha opinião, acho que houve uma precipitação e já falei com ele [Radiovaldo] sobre isso. Tentamos várias vezes demonstrar que quem estivesse melhor receberia o apoio do outro. Aritmeticamente, teríamos entre quatro e cinco mil votos de frente do atual prefeito [Joaquim Neto]. Foi isso que aconteceu. Nós não tivemos condições objetivas de mantermos unidos.
“Em parte [Igor Kannario decidiu a eleição em Alagoinhas para Joaquim Neto]. Acredito que ele ajudou. Mas não foi decisivo. Foi muito maior. Poderia ter não sei quantos ‘Igor Kannarios’ e eles não ganhariam.”
.ba – Dizem que Igor Kannario definiu a eleição em favor de Joaquim Neto. O senhor concorda com a tese?
JR – É possível. Inclusive, o prefeito [Joaquim Neto] responde a alguma coisa neste sentido, por usar a figura de Igor Kannario no que é vedado pela legislação.
.ba – O senhor então acredita na tese?
JR – Não, em parte. Acredito que ele ajudou. Mas não foi decisivo. Foi muito maior. Poderia ter não sei quantos ‘Igor Kannarios’ e eles não ganhariam.
.ba – Nas últimas eleições, o PT perdeu em algumas cidades importantes, como Vitória da Conquista e Camaçari. Isso reflete na eleição do próximo ano?
JR – Olhe bem. A dinâmica que está sendo experimentada no processo político-eleitoral nos últimos anos é uma coisa maluca. Por exemplo, em Vitória da Conquista, se chegar lá hoje, vai ver uma comoção, assim como em Alagoinhas e Camaçari. Vou explicar. O nosso governo, em uma época ruim, conseguiu deixar determinadas marcas. Não atribuo isso a mim como gestor, mas ao momento e à participação da população. No segundo momento entra Paulo Cezar, que entrou no melhor momento macroeconômico vivenciado no governo Lula e Dilma. Querendo ou não, da base aliada, teria todas as condições e havia recursos suficientes. Somos hoje um pólo produtor de bebidas dos mais forte do país. Isso em menos de uma década. Mesmo assim, o Paulo Cezar perdeu. Ele como grande eleitor de Sônia Fontes. E entra um cidadão que governou Sátiro Dias, que é pequeninho, e até hoje o eleitorado de Sátiro Dias tem uma reflexão não muito positiva em relação à passagem de Joaquim Neto por lá. E, hoje, lá em Alagoinhas, ele passa por um momento esquisitíssimo e, na minha opinião, a cidade está bastante razoável quando comparada a municípios de igual grandeza.
.ba – O senhor acha que a saída de Marcelo Nilo da presidência da AL-BA atrapalha mais o governo de Rui Costa em relação aos projetos do Executivo? Com Coronel tem sido mais complicado?
JR – A bancada do governo tem o dobro do tamanho da oposição. E aí existe uma insatisfação confessa com relação ao cumprimento das emendas impositivas. E algumas votações deixaram de acontecer, mas o governo não se ressentiu porque não havia uma matéria vital que tivesse de ser votada nesse ano de 2017. Mas acho que agora as coisas estão muito mais claras. Houve uma boa reunião de bancada com o governador e o clima estava muito bom.
.ba – No primeiro semestre, ficou quase três meses sem votar. Talvez, tenha sido o momento mais difícil do governo este ano…
JR – Foi, foi.
.ba – Dos seus liderados, do PT, tem alguém que admite abertamente fazer boicote?
JR – Não. Nenhum. Mas não tem ninguém. Posso garantir.
“Acho que Rui está superando qualquer expectativa que tivéssemos na figura dele enquanto governador do Estado.”
.ba – Diante desse cenário, se ensaiou um movimento batizado de “Volta, Wagner” que defendia o nome do secretário de Desenvolvimento Econômico como candidato na eleição do próximo ano. Dentro do PT, há alguém que abrace isso?
JR – Não. Nenhuma. Em tudo o que é lugar, a gente houve dizer que, do ponto de vista da administração e até na manutenção da base, o Rui andou surpreendendo até os seus adversários. Então, do ponto de vista da gestão, ele pode estar celebrando um momento que não é vivido por quase nenhum outro Estado dentro do país. E quando compara o que a Bahia está fazendo, relativamente, com São Paulo, o nosso estado é que o mais investe. Isso é um dado relativamente positivo.
.ba – Na sua avaliação o governo de Rui é melhor que o de Wagner?
JR – É um governo bom. Eu, sinceramente, e pessoalmente, acho que Rui está superando qualquer expectativa que tivéssemos na figura dele enquanto governador do Estado.
.ba – Mas o governo de Rui é melhor do que o de Wagner?
JR – Sem sombra de dúvida. Wagner diz isso todo dia.
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