Publicado em 17/10/2024 às 16h41.

Vingança contra Hamas coroa vitória improvável de Netanyahu

Morte de Sinwar e obliteração do Hezbollah colocam Irã como objetivo final do premiê

Redação
Foto: Redes sociais

 

Israel havia acabado de sofrer uma humilhação militar sem precedentes, com seus preciosos serviços de inteligência incapazes de prever o mais brutal ataque terrorista de sua história, de acordo com informações do jornal Folha S.Paulo.

As fronteiras do Estado judeu pareciam prontas para serem atacadas com força em frentes múltiplas, como os movimentos iniciais da guerra hoje em curso desenhavam: o Hezbollah, grupos palestinos na Cisjordânia, o próprio Hamas e até os distantes houthis do Iêmen pressionavam Tel Aviv.

Binyamin Netanyahu, o mais longevo premiê do Estado judeu, comandava um país cindido, com manifestações gigantes contra sua investida autoritária sobre o Judiciário. Sua coalizão de radicais religiosos exigia um acerto de contas geral, com foco no financiador de todos os inimigos, o Irã.

A situação de Bibi, como o premiê é chamado, era desoladora. Foi obrigado a montar o hoje defunto gabinete de guerra com adversários para demonstrar a necessária união nacional após a violação chefiada pelo Hamas no 7 de Outubro.

Acerte os ponteiros para este 17 de outubro de 2024. O psicótico Yahya Sinwar, a mente por trás do mega-atentado que mudou a história do Oriente Médio, está morto. Seu antecessor como chefe do Hamas, Ismail Haniyeh, também, assim como quase toda a chefia do grupo em Gaza.

O Hezbollah viu ser explodido da existência não só o líder Hassan Nasrallah, mas camadas sucessivas de comandantes e seus adjuntos. O Líbano está novamente sob invasão de Israel. Os houthis seguem sendo uma distração, assim como os jihadistas pró-Irã no Iraque e na Síria.

Após dois ataques com mísseis ao Estado judeu, o Irã está exposto a uma retaliação certa. Engrossando o caldo, ao até enviar soldados ao aliado, os Estados Unidos (EUA) até aqui dão aval ao belicismo em curso enquanto fingem se horrorizar com a destruição de Gaza em documentos estrategicamente vazados.

Isso dito, por tudo o que de negativo que as políticas de Netanyahu e os seus inspira, é inegável que ele chega a esse primeiro ano de guerra com improváveis e poderosos trunfos à mão. Nenhum governante de Israel teve tanto a mostrar em tão pouco tempo.

Este é o problema principal, claro. De Sun Tzu a Clausewitz, passando por Marco Aurélio, gerações de pensadores da arte da guerra alertam contra a soberba. Magnanimidade não é qualidade usualmente associada a Bibi, alguém que nem mesmo antigos aliados dizem ser um homem de fácil leitura.

O risco é de não haver o que ler e, a acreditar nos seus críticos, os inauditos sucessos militares de Israel após a debacle do 7 de Outubro servem ao fim apenas ao prolongamento do poder de Netanyahu e sua turma.

Assim, o propalado “redesenho do Oriente Médio”, que de fato está em curso, pode servir ao fim à instalação de um Estado que, se já era guerreiro desde que surgiu em 1948, poderá amparar sua retórica no mesmo messianismo religioso que guia a teocracia iraniana.

Resta saber, claro, o que a sociedade israelense, muito mais diversa e dinâmica que seus líderes possam sugerir, tem a dizer.

O país é, ao contrário dos vizinhos, uma democracia para seus cidadãos —ainda que haja uma degradação clara da situação dos árabes com esse título, para não falar da obliteração de Gaza e na precarização da vida na Cisjordânia.

Como por ora a dita questão palestina está sendo enfrentada a balas no território que era do Hamas e com violência e expropriação na corrupta faixa sob a Autoridade Nacional Palestina, a dúvida segue: se for às vias de fato, totais ou parciais, com o Irã, o que Netanyahu fará depois?

As sugestões não são alvissareiras para quem defende a falida solução dos dois Estados. Mas optar pelo estado de guerra sem fim tem seu custo, e se um ícone como Golda Meir teve de enfrentar o escrutínio após deixar o poder, o atual premiê poderia lembrar do final de “Patton” (Franklin J. Schaffner, 1970).

O general americano que dá título ao filme lembra de conquistadores romanos em seus desfiles da vitória, no qual um escravo trazia atrás deles uma coroa e sussurrava-lhe ao pé do ouvido: “Toda glória é efêmera”.

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