Publicado em 31/05/2024 às 13h29.

‘Engajamento do ódio’ fomenta filiação partidária, revela pesquisa

PT é partido mais odiado, mas fenómeno afeta também outras siglas dizem especialistas

Redação
Foto: Agência Senado

 

Uma pesquisa realizada por cientistas políticos da Universidade Federal de São Carlos (UFSCar) e da Universidade de São Paulo (USP), revelou que apesar da desconfiança crescente em relação aos partidos políticos, a filiação partidária tem aumentado no País, e um dos principais motivos é a rejeição dos filiados aos adversários do campo político oposto. O estudo revela que, entre os filiados, cerca de 70% consideram, em algum grau, a aversão e o ódio ao rival político como motivos relevantes para aderir a uma legenda.

Em matéria, a Folha de São Paulo apurou que a pesquisa de abrangência nacional, realizada nos anos de 2020, 2022 e 2023, com 32 partidos, enviou questionários com 52 perguntas para filiados e dirigentes partidários, com o objetivo de descobrir as motivações para a filiação, os elementos que incentivam a participação nas atividades partidárias, além de identificar os partidos mais odiados e rejeitados. Foram consideradas as respostas de 3.266 integrantes dessas legendas que responderam o questionário inteiro. A pesquisa tem margem de erro de 2% e grau de confiança de 95%. Em matéria, o Estadão ouviu cientistas políticos, que apontaram que a nova dinâmica não só fomenta a polarização entre os eleitores, especialmente em anos eleitorais, como também enfraquece a democracia.

“Queríamos entender por que a filiação partidária estava aumentando, mesmo diante do crescente descrédito e desconfiança da opinião pública com relação aos partidos. Então, descobrimos que o ódio e a rejeição ao adversário motivam não só a filiação, mas também são fatores que tornam os filiados muito mais engajados na vida partidária”, diz Pedro Paulo de Assis, pesquisador do Departamento de Ciência Política da USP.

O cientista político americano Steven Levitsky, autor do best-seller ‘Como as democracias morrem’, explica que a polarização pode ser benéfica para estimular o ativismo politico, porém, ressalta que a intensificação da polarização nos últimos anos no País fomentou o sentimento do “medo exagerado de perder” entre os partidos, levando figuras políticas a se posicionarem contra a democracia e colocando em risco a alternância de poder.

“Quando a polarização atinge um ponto em que líderes ou membros de um partido começam a temer que um governo do outro partido representará uma ameaça existencial, seja para eles, suas comunidades e suas famílias, isso se torna perigoso para democracia”, ressalta.

Engajamento pelo ódio

O estudo aponta que o ódio ao partido rival é um elemento fundamental para incentivar a participação dos filiados partidários. Segundo levantamento, 36% dos entrevistados se tornam altamente engajados nas atividades partidárias quando confrontados com a possibilidade de vitória do partido que mais rejeitam e odeiam em uma eleição. É o que os pesquisadores classificaram como “engajamento pelo ódio”. O percentual está à frente de motivadores tradicionais, como a possibilidade de influência dentro da própria legenda (32%), além de se aproximar cada vez mais do que até então era considerado um dos principais aspectos de incentivo: a vitória do partido ao qual a pessoa se filiou (41%).

Os pesquisadores questionaram também quantas horas os filiados dedicavam às atividades partidárias em diferentes cenários de estímulo. Para a análise, foram considerados apenas aqueles que responderam que se dedicam mais de 30 horas mensais.

“Para 36% desses filiados, a principal motivação para o alto engajamento é a possibilidade de vitória do partido que mais odeiam e rejeitam em uma eleição presidencial. Portanto, o ódio atua como um incentivo negativo fundamental para que os filiados se tornem altamente engajados. Daí surge a expressão ‘engajamento pelo ódio’”, explica Vinícius Alves, pesquisador da UFSCar e um dos coordenadores da pesquisa.

Alves destaca que a aversão extrema identificada na pesquisa vai além das divergências e debates políticos, aspectos nos quais são normais e presentes em uma democracia.

“Estamos falando de um passo adiante no sentimento de rejeição. Não se trata de debates sobre programas partidários ou da ideia de simples competição entre partidos, por exemplo. É o sentimento de que o outro não pode existir. É o medo, o receio extremo de perder ou do adversário ganhar”, ressalta.

Partidos mais odiados e rejeitados

A pesquisa apontou também, os partidos mais rejeitados e odiados entre filiados e dirigentes partidários. O PT (Partido dos Trabalhadores) lidera com 34% de rejeição, seguido pelo PSOL com 27%, porém, o fenômeno não se restringe apenas ao antipetismo, é mais amplo e afeta outras siglas de diferentes matizes politicas. O PSL (25%) e DEM (20%) por exemplo, que deram origem ao União Brasil, aparecem na lista entre os seis partidos mais rejeitados. No entanto, o levantamento não captou a rejeição ao União Brasil, já que a fusão ocorreu recentemente, em meados de 2022, quando o levantamento já estavam em andamento.

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