Publicado em 22/09/2025 às 19h15.

Mudanças no cenário da violência em Salvador revelam migração de facções

Capital baiana registrou violência em 146 bairros em 2025, o que corresponde a 85,38% do total de logradouros da cidade

Otávio Queiroz
Foto: Gerado por Inteligência Artificial

 

Um levantamento divulgado pelo Instituto Fogo Cruzado mostrou mudanças no cenário da violência armada em Salvador em 2025. Bairros historicamente conhecidos pela criminalidade, como Amaralina, Calabar e Saramandaia, não registraram tiroteios neste ano. Já regiões antes vistas como pacatas, a exemplo da Federação, passaram a figurar entre as mais violentas da capital baiana. Para o doutorando e mestre em Direito com ênfase em sistemas de política criminal, Cleifson Dias, uma das hipóteses para esse deslocamento está na migração das facções criminosas.

De acordo com o estudo, Salvador teve registros de violência em 146 bairros, o que corresponde a 85,38% do total de logradouros da cidade. Entre janeiro e 17 de setembro, foram contabilizados 856 tiroteios, resultando em 647 mortes e 188 feridos. Tancredo Neves lidera o ranking com cerca de 29 confrontos, seguido por Lobato, Mussurunga, Federação e Fazenda Coutos.

Segundo Cleifson, a movimentação das facções entre bairros pode estar relacionada tanto à disputa de territórios quanto ao impacto da atuação policial. “A concentração da segurança pública em certas áreas pode ter deslocado grupos armados para outras regiões. Isso ajuda a explicar por que bairros antes violentos hoje aparecem sem ocorrências, enquanto outros registram aumento de casos”, afirmou em conversa com o bahia.ba.

Aumento da letalidade 

O pesquisador também destacou que os dados expõem um aspecto preocupante: a letalidade dos confrontos que envolvem forças de segurança. Apenas em agosto, mais de 130 tiroteios foram registrados em Salvador. Desses, 57 tiveram participação policial. Apesar de representarem menos da metade dos episódios, responderam por quase metade das mortes. “A atuação policial tende a ser mais letal do que quando os tiroteios não envolvem a polícia”, observou Cleifson.

Para ele, a realidade aponta para a necessidade de repensar estratégias de segurança pública que priorizem a preservação da vida. “Quando analisamos a predominância de população negra nas áreas mais afetadas, percebemos que a preservação da vida não tem sido prioridade”, avaliou.

Investimento em políticas sociais

Cleifson Dias reforçou ainda que o enfrentamento à violência não pode se restringir a operações policiais. Segundo ele, estudos criminológicos apontam que a forma mais eficaz de reduzir a criminalidade passa pelo fortalecimento de políticas sociais. “A melhor política criminal ainda é uma boa política social. Investir em educação, saúde, transporte, trabalho e melhor distribuição de renda é o que precisa ser feito”, disse.

Ele também ressaltou a distância entre o discurso político e a prática. “Se perguntarmos a qualquer político sobre a importância da educação, todos vão concordar que é essencial. Mas onde está essa prioridade nos investimentos? Sem qualidade de ensino, valorização de professores, merenda adequada e infraestrutura, dificilmente teremos mudanças efetivas na realidade da população mais vulnerável”, completou.

O pesquisador concluiu que a segurança pública deve ser pensada de forma integrada, em conexão direta com outras áreas essenciais, como moradia, emprego e saúde. “Nenhuma agenda isolada é capaz de resolver um problema tão complexo. A violência só pode ser enfrentada com um projeto mais amplo de inclusão e justiça social”, finalizou.

Otávio Queiroz

Soteropolitano com 7 anos de experiência em comunicação e mídias digitais, incluindo rádio, revistas, sites e assessoria de imprensa. Aqui, eu falo sobre Cidades e Cotidiano.

Mais notícias

Este site armazena cookies para coletar informações e melhorar sua experiência de navegação. Gerencie seus cookies ou consulte nossa política.