Publicado em 03/12/2021 às 18h33.

Vivendo com HIV: soropositivo relata que estigma adoece mais do que o próprio vírus

'É possível viver bem com o HIV. O vírus me fez entender que precisava cuidar mais de mim e do meu corpo', diz Thon Shübber em conversa com o bahia.ba

Leilane Teixeira
Foto: Thon Shübber
Foto: Thon Shübber

 

“Ao receber o diagnóstico positivo para HIV eu não me desesperei como ouvi em muitos relatos. Foi uma notícia que veio aos poucos começar a fazer sentido, e devo isso a educação sexual que tive acesso nas escolas onde passei”.

A fala acima é do designer e fotógrafo, Thon Shübber, 35, portador do HIV há três anos, que, diferente de grande parte da população que não tem acesso à uma educação adequada, conseguiu encarar e viver com o diagnóstico.

Em conversa com o bahia.ba, Shübber relatou um pouco da sua experiência de ser soropositivo e desmitificou a ideia, que, muitas vezes por preconceito, leva a crê que as pessoas que possuem o vírus vão morrer.

“O fato de ser um homem gay, nascido em uma família de tradição militar, sempre me fez ser muito focado nos estudos e tinha as informações necessárias naquele momento para saber que eu não ia morrer e eu podia me tratar. A sentença de morte evidente diante do abandono do tratamento, foi uma sentença de vida para mim. A ciência me possibilita viver com HIV, tomar meus remédios na hora certa, realizar meus exames semestrais, marcar e comparecer nas consultas com os infectologistas”, explica.

Apesar de atingir tantos brasileiros, a síndrome da imunodeficiência adquirida (AIDS), causada pelo vírus HIV, desacelerou no começo deste século. De acordo com a Organização Mundial da Saúde (OMS), do ano 2000 até 2019, as novas infecções pelo HIV caíram 39%, e as mortes relacionadas a vírus caíram 51%.

Indetectável

Foto: Arquivo pessoal
Foto: Arquivo pessoal

Representante do Grupo de Apoio à Prevenção à Aids da Bahia (Gapa-BA), Thon pontua ainda que tomar os devidos cuidados é fundamental para conviver com a doença. Para ele, saber que tinha o vírus possibilitou cuidar mais de si.

“Eu sempre digo que o HIV me fez entender que precisava cuidar mais de mim e do meu corpo. Eu passei a tomar mais cuidado com a saúde de uma forma mais ampla, onde envolvem o meu corpo, a minha mente e minha alma. As medicações antirretrovirais me eleveram à condição de indetectável, ou seja, não conseguem achar carga de vírus na corrente sanguínea, e minha células de defesa voltam a se multiplicar, portanto, estou intransmissível, não posso transmitir o vírus, e não desenvolvo a AIDS. Consigo continuar a minha vida de forma plena, estudo, trabalho, namoro, luto pelos meus direitos como uma pessoa que não vive com o vírus” conta.

O médico infectologista Rico Vasconcelos explica que pessoas vivendo com HIV com carga viral persistentemente suprimida, ou seja, pessoas que têm o vírus indetectável, são incapazes de transmitir o vírus por relação sexual, mesmo sem preservativo. Segundo ele, essa informação precisa repassada de uma forma mais ampla para que possa evitar estereótipos.

“Carga viral indetectável é a coisa mais importante no tratamento de uma pessoa que vive com HIV, é a meta de ouro. Com isso, estou impedindo a replicação do HIV, estou impedindo também que o vírus faça doença no corpo da pessoa”, pontua o infectologista.

De acordo com a OMS, seis em cada 10 infectados pelo HIV estão indetectáveis devido ao tratamento com remédios antirretrovirais. O órgão estima que de 2000 até 2019, mais de 15 milhões de vidas foram salvas por esses tratamentos.

Perigo de não ser ter um tratamento adequado

Se por um lado, existe a possibilidade de conseguir viver normalmente com o diagnóstico, do outro, pessoas que não conseguem ter os cuidados e acompanhamento necessários para controlar o vírus enfrentam outra realidade. De acordo com Organização Mundial da Saúde, para um quinto dos infectados, a descoberta ocorre tarde demais, quando a Aids já se desenvolveu. Como aconteceu com o companheiro de Thon, que entrou para estatística das 33 milhões de pessoas que morreram por causa da doença em todo o mundo, sobretudo por ter o diagnóstico tarde demais.

“Não tive o diagnóstico sozinho. Vivia numa relação, morávamos juntos, tínhamos um ateliê de design e estes sonhos foram interrompidos pela notícia do diagnóstico da AIDS em estágio avançado em meu companheiro. Infecções oportunistas vieram a vitimá-lo após longos 5 meses internado no Hospital Couto Maia”, contou.

Estigma

Foto: Arquivo pessoal
Foto: Arquivo pessoal

Apesar de ser indetectável, o representante da Gapa conta ainda que isso não foi o suficiente para evitar olhares negativos. Segundo ele, a sociedade carrega uma série de preconceitos e com portadores do HIV é ainda mais nítido.

“Ainda vivemos uma face triste da epidemia de HIV/AIDS no mundo. O Estigma gera preconceito e discriminação, levando muitas pessoas a abandonarem seus tratamentos, cometerem suicídio ou viverem com seus diagnósticos ocultos com medo de sofrerem violência de pessoas queridas ou serem demitidos de seus empregos. As pessoas precisam entender que é possível viver com HIV e combater a AIDS com informação e ciência”, reiterou.

Novos tratamentos

Dando um passo a mais no tratamento contra o vírus, A Agência Nacional de Vigilância Sanitária (Anvisa) aprovou, no dia 29 de novembro, um novo medicamento para o tratamento do HIV. Trata-se da combinação de duas substâncias – a lamivudina e o dolutegravir sódico – em um único comprimido.

O novo medicamento será indicado como um regime complemento para o tratamento da infecção pelo vírus da imunodeficiência humana tipo 1 (HIV-1) em adultos e adolescentes acima de 12 anos pesando pelo menos 40 quilos, sem histórico de tratamento antirretroviral prévio ou em substituição ao regime antirretroviral atual em pessoas com supressão virológica.

Para a agência, a aprovação representa um avanço no tratamento, já que reúne em uma dose diária dois antirretrovirais. “A possibilidade de doses únicas simplifica o tratamento e a adesão de pacientes”, informou a Anvisa.

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