Publicado em 13/06/2018 às 12h26.

Problemática do índice de pessoal na gestão pública

Artigo de Terence Lessa

Redação
Foto: arquivo pessoal
Foto: arquivo pessoal

 

Por Terence Lessa*

Resumo

O índice de pessoal é um dos elementos de maior importância dentre as despesas públicas, contando com limites previstos em lei para a definição de seu orçamento. O gestor público encontra, em sua atuação, o desafio de lidar com a verba governamental destinada a esse fim, uma vez que o aumento de despesas pode levar o gestor municipal a incorrer em crime de responsabilidade por não atender aos ditames estabelecidos pela legislação em vigor. Diante do surgimento de programas federais, que são contabilizados como custos com pessoal, o administrador público busca soluções para evitar a dispensa de funcionários, enquanto atende à Lei de Responsabilidade Fiscal.

Introdução

Com orçamento previsto pela Lei de Responsabilidade Fiscal, o índice de pessoal, cujo limite de gasto deve comprometer até 60% do orçamento municipal, é o calcanhar-de-aquiles do controle fiscal do gestor público. Os programas federais, como Bolsa Família, são uma fonte de aumento natural dos gastos, o que torna o controle orçamentário ainda mais dificultoso, uma vez que avançar os gastos além do limite pode comprometer o gestor, que incorrerá em crime de responsabilidade. Discutir possíveis soluções que levem em conta a problemática contemporânea do controle de índice de pessoal, priorizando a obediência à Lei de Responsabilidade Fiscal e a manutenção do pessoal pertencente à administração pública, é essencial para a efetividade do planejamento dos gestores públicos em seus mandatos municipais.

1. A administração do orçamento público

A Constituição Federal de 1988 consagra o princípio da separação dos poderes, atribuindo e delimitando a cada um deles as suas competências, poderes, deveres, prerrogativas e funções. Incluída nas funções do exercício do poder Executivo, está a administração do orçamento público, que, além de ter sua previsão constitucional, está ventilada nas Leis Orçamentárias (LOA, LDO, PP) e na Lei de Responsabilidade Fiscal.

No Art. 165º da Constituição Federal, afirma-se que as leis de iniciativa do Poder Executivo estabelecerão: o plano plurianual; as diretrizes orçamentárias; e os orçamentos anuais. Na Lei Complementar nº 101, Art. 1º, § 1º, a Constituição Federal afirma que a responsabilidade na gestão fiscal pressupõe a ação planejada e transparente, em que se previnem riscos e corrigem desvios capazes de afetar o equilíbrio das contas públicas, mediante o cumprimento de metas de resultados entre receitas e despesas e a obediência a limites e condições no que tange a renúncia de receita, geração de despesas com pessoal, da seguridade social e outras, dívidas consolidada e mobiliária, operações de crédito, inclusive por antecipação de receita, concessão de garantia e inscrição em Restos a Pagar.

O orçamento público nada mais é do que um instrumento de planejamento e execução das finanças públicas. De maneira geral, seria o conjunto de despesas e receitas que o ente da federação pode efetuar e consegue arrecadar.

O Plano Plurianual (PPA), a Lei de Diretrizes Orçamentárias (LDO) e a Lei Orçamentária Anual (LOA) são as três leis que regem o ciclo orçamentário. Elas formam um sistema integrado de planejamento e orçamento, reconhecido na Constituição Federal, que deve ser adotado pelos municípios, estados e União.

É na Lei Orçamentária Anual (LOA) que a gestão define as prioridades contidas no Plano Plurianual (PPA) e as metas que deverão ser atingidas naquele ano do orçamento, ou seja, a LOA disciplina todas as ações do governo, já que ela estima a receita e fixa a despesa.

Nenhuma despesa pública pode ser executada fora do orçamento. Todavia, nem tudo é feito pelo governo, devido à insuficiência de recursos financeiros. Com efeito, para Ataliba (1969), o Estado pode conseguir dinheiro de duas formas: “auferindo lucros, na venda de bens e serviços, ou usando de seu poder para exigir o concurso compulsório das pessoas sujeitas a seu poder, para as necessidades públicas”.

Fato é que todo dinheiro que ingressa nos cofres públicos, a qualquer título, é chamado de entrada. Contudo, nem toda entrada constitui receita pública, de acordo com o Senado Federal. As entradas que não têm caráter definitivo e se destinam à devolução ou constituem mera movimentação de caixa, não são consideradas receitas.

Desse modo, receita pública é a entrada de dinheiro em caráter definitivo nos cofres públicos. Pode ser definida como o complexo de valores recebidos pelo erário público em caráter definitivo, destinado a fazer frente à despesa pública e se divide em originária e derivada.

De acordo com Baleeiro (2008), receita pública é “a entrada que, integrando-se no patrimônio público sem quaisquer reservas, condições ou correspondência no passivo, vem acrescer o seu vulto, como elemento novo positivo”.

A saber: A receita originária decorre da exploração, pelo Estado, de seus próprios bens ou desenvolvimento de suas atividades (empresas públicas, por exemplo), bem como do recebimento de doações ou de heranças vacantes, e não inclui os tributos. Segundo Alberto Deodato apud Fernandes (2016), é a que o Estado aufere dos seus próprios recursos, da venda de seus bens, do exercício de sua própria atividade, como se fosse um indivíduo. (…) A receita originária é também chamada de economia privada. O Estado a arrecada de uma coisa que lhe pertence e que ele explora por meio de vendas ou contratos. É como se fora uma pessoa privada.

A receita derivada, por sua vez, decorre do recolhimento de tributos (impostos, taxas e etc.). De acordo com Fernandes (2016), as receitas derivadas são provenientes do constrangimento do Estado sobre o patrimônio particular. Nesse contexto, seriam classificadas como derivadas as receitas obtidas pelo Estado por meio da arrecadação de qualquer tributo previsto na legislação brasileira, incluindo-se aí os impostos, taxas, contribuições de melhoria, empréstimos compulsórios e as contribuições. Estas últimas subdividem-se em sociais ou de intervenção no domínio econômico e de interesse das categorias profissionais ou econômicas.

A receita por transferência, também chamada de repartição de receita tributária, ocorre, como regra, quando o ente de maior abrangência repassa parte de sua arrecadação para os entes de menor abrangência (é quando o Estado transfere parte de sua arrecadação para o município, por exemplo).

2. Despesas Públicas

Quanto às despesas públicas, Baleeiro (2008) define como “Conjunto de dispêndios do Estado, ou de outra pessoa de Direito Público, para o funcionamento dos serviços públicos”. Tathiane Piscitelli (2017), no mesmo sentido, afirma que é “o conjunto de gastos do Estado, cujo objetivo é promover a realização de necessidades públicas” ou “aplicação específica de dinheiro público (e não a soma de todas elas), visando o custeio da estrutura estatal”.

Dentre as despesas públicas, destaca-se o gasto com pessoal, para o qual a Lei de Responsabilidade Fiscal atribui, em seu artigo 19, III, o limite de 60%, nos termos do que dispõe o Art. 169º da Constituição Federal.

Ademais, esse limite de 60% deve ser dividido entre os poderes executivo e legislativo do município, de sorte que reste para o executivo um limite de 54% e para o legislativo um total de até 6%.

Diante tal previsão legal, por vezes, é necessário fazer ajustes financeiros para evitar o corte de funcionários, uma vez que o aumento no patamar de despesas, recebendo o mesmo repasse do governo, pode levar o gestor municipal a incorrer em crime de responsabilidade por não atender aos ditames estabelecidos pela legislação em vigor.

O cerne da questão é que, desde o ano de 2003, alguns programas federais foram criados para serem administrados pelos municípios, a exemplo do Programa Saúde da Família (PSF), SAMU, Bolsa Família, Cras e Creas, etc., com a contrapartida financeira do Governo Federal. Entretanto, os municípios preconizam serem insuficientes esses repasses para compensar no cálculo todo o gasto com o pessoal para executar os programas. Assim, os prefeitos forçosamente desobedecem ao que é previsto pela lei, já que o índice de pessoal naturalmente aumenta, ultrapassando o limite legal. A consequência do não entendimento dessa matemática financeira é a penalização dos prefeitos, tanto pelo Tribunal de Contas quanto pela população e pelos seus próprios funcionários.

Em 13 de maio de 2018, o Tribunal de Contas do Município, atendendo a consulta realizada pela União dos Municípios da Bahia (UPB), submeteu à votação a retirada dos custos com programas federais do cálculo do índice de gasto com pessoal. Segundo a análise da votação preliminar, já existem votos suficientes para o tribunal editar uma resolução sobre o tema, uma vez que foram computados quatro votos favoráveis ao pleito dos municípios.

A matéria segue para votação em plenário no dia 14/06/2018, consolidando o pleito dos municípios através da UPB, isso será um marco na vida dos gestores públicos que, por sua vez, terão um fôlego maior e uma tranquilidade a mais no julgamento de suas contas. Com efeito, pela Lei de Responsabilidade Fiscal, os municípios só podem comprometer 54% da receita líquida com gasto de pessoal, o que estava tornando inviável atender aos ditames legais diante do cenário atual.

3. Conclusão

Em vista dos argumentos apresentados, a votação do plenário, favorável à retirada do cálculo do índice de gasto com o pessoal dos trabalhadores terceirizados, dará aos gestores públicos uma oportunidade de um melhor desenvolvimento e funcionamento da administração local, não se submetendo mais aos riscos de rejeição de contas, bloqueios de repasses de valores, dentre outras penalidades mantendo-se, dessa forma, suas garantias e operações de crédito.

*Terence Lessa é prefeito de Ibotirama. É pós graduado em gestão pública.

 

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