Liliana Peixinho é jornalista, ativista social, integrante de diversos grupos de luta e defesa de direitos humanos. Fundadora e coordenadora de mídias livres como: Reaja – Rede Ativista de Jornalismo e Ambiente, Mídia Orgânica, O Outro no Eu, Catadora de Sonhos, Movimento AMA – Amigos do Meio Ambiente, RAMA -Rede de Articulação e Mobilização em Comunicação.
Brasil em direitos negados
Num momento em que o país passa por mudanças no comando central, há sinais de que pouco (ou nada) mudou para o cidadão brasileiro comum

Num país onde o povo fica horas em filas, seja para esperar ônibus lotados e sem segurança, tentar disputar uma dose de vacina contra vírus mortais, lutar por uma vaga em creche pública, agendar um horário no INSS para uma perícia médica e esperar meses e meses para ouvir um não a benefícios negados a quem não pode andar nem usar as mãos. Num país onde as leis elastecem mordomias, mas restringem direitos básicos como acesso a água limpa e esgoto sanitário. Num país onde se prende quem rouba uma fruta e deixa solto quem sucateia as riquezas naturais; onde se fica rico de um dia pro outro, mas se perpetua a miséria em engodos sociais; onde se sai de casa em labuta diária, sem a garantia de volta para a família, o que esperar desse país, cujas composições ministeriais, historicamente, são responsáveis por esse quadro de desigualdade social?
Quanto tempo (anos, décadas) será necessário para se restabelecer um país, cujos bens patrimoniais – como o Rio Doce, o Velho Chico, a Amazônia, o Cerrado, a Caatinga, a Mata Atlântica, os bancos de fomentos – e as comunidades tradicionais indígenas, quilombolas, agricultores familiares, artesãos, pescadores, são explorados em nome da expressão sustentável, em conceito desgastado, mal utilizado, sem prática real da necessidade entre produção e consumo?
O que esperar de um país que se vangloria de políticas econômicas cujas commodities agrícolas registram imagens áreas de uma terra em monoculturas transgênicas ou plantios envenenados em agrotóxicos? Um país que mata na mesa e resiste em mudar sistemas produtivos desumanos, insanos, indignantes, em estado similar ao da escravidão de mão de obra? O que esperar de um sistema onde o faz de conta ainda engana, seduz cidadãos que não perdem a esperança em discursos rasos, falhos, comprovadamente criminosos, como os apurados na Operação Lava Jato?
Se alguns continuam com tantas regalias, o
que esperar do país, seja em que governo for?
O que esperar de um país onde recém-formados fazem fotos como futuros desempregados e sabem que toda a criatividade, coragem e conhecimento não serão suficientes para enfrentar uma crise onde mais de 10 milhões de trabalhadores, muitos experientes e bem preparados, amargam a agonia de não poder pagar contas básicas como luz, água, condomínio, transporte?
O que esperar de um novo governo, com práticas de velhas políticas, excludentes, concentradoras de renda, cegos a anseios de direitos básicos como moradia decente; e que paradoxalmente, imprime, sustenta, garante um sistema que privilegia mansões desocupadas enquanto espreme famílias numerosas em casinhas sem estruturas mínimas como esgoto sanitário, transporte decente ou posto de saúde que cuide da vida, antes da morte?
O que esperar de um sistema político, historicamente viciado em corromper o porteiro, a merendeira, a secretária, o professor, o diretor, com escolas onde até o alimento para os alunos, é desviado, superfaturado? Para os sem partidos, sem representação política, sem rabo preso, que resistem ao mais de mesmo, ao faz de conta, a cenários de selfies rasas, em práticas de ostentação egoístas, o Brasil dá sinais de que vai demorar a se recuperar.
Temos escutado por ai que há esperança. Essa pode ser para os netos e bisnetos de uma geração que muito lutou para ver o país, não concentrador de renda, mas que pudesse espalhar, distribuir, compartilhar sua riqueza com todas as camadas sociais, sem privilégios desse ou daquele grupo social, mas, em especial, para os que, historicamente pagam uma conta alta por acreditar em promessas de vida fora do faz de conta, em mudanças reais e de direitos, que continuam negados e até quando? Se vereador, deputado, senador, presidente, funcionário público dessa ou daquela instituição, continuar com regalias como foro privilegiado, assessores, moradia, salários, assistência médica e tudo o que um ser humano precisa, em detrimento de outros, que nem mesmo podem pagar pela morte matada, em dados que falam em cerca de 50 mil homicídios por ano. O que esperar desse país, seja em que governo for?
Liliana Peixinho é jornalista, ativista, autora de “Por um Brasil Limpo”. Fundadora da Rede Ativista de Jornalismo e Ambiente (Reaja), do Movimento Amigos do Meio Ambiente (AMA), da Mídia Orgânica e outras mídias alternativas. Vencedora Prêmio Shift – Agentes Transformadores – 2015.
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