Liliana Peixinho é jornalista, ativista social, integrante de diversos grupos de luta e defesa de direitos humanos. Fundadora e coordenadora de mídias livres como: Reaja – Rede Ativista de Jornalismo e Ambiente, Mídia Orgânica, O Outro no Eu, Catadora de Sonhos, Movimento AMA – Amigos do Meio Ambiente, RAMA -Rede de Articulação e Mobilização em Comunicação.
Desperdício de alimentos, crime, fome e doações
O Brasil ainda não tem leis, como a França, a Itália e outros países, que proíbem, penalizam e consideram crime o desperdício de alimentos

A insensatez humana é criminosa, quando não se dá conta de que o que uma pessoa desperdiça aqui, falta logo ali, para outrem. O egoísmo, a insensibilidade, a falta de razão, e o agir de forma rasa, apressada têm negado direitos sagrados, como o de comer e beber. E tem muita gente ainda morrendo de fome e sede, no mundo. Conforme dados das Nações Unidas, 30% dos alimentos produzidos no mundo, todos os anos, não são consumidos. No Brasil, há dados de que 40% de toda a produção se perdem, em vários caminhos sujos, irracionais, insustentáveis, do campo à mesa.
Em todo lugar que chego, pode ser a casa de um amigo, parente, ou até de um desconhecido; uma cantina, uma lanchonete, um restaurante, uma empresa, seja onde for que tenha comida e gente, tento, com muito cuidado, diante da chatice que é tentar mudar comportamentos, levar informações que, de alguma forma, chamem a atenção do consumidor sobre a importância de não se desperdiçar alimentos.
Independentemente de campanhas e leis que existam para conscientizar as pessoas sobre o crime que representa o desperdício, como alimentador da fome, mundo afora, acredito que é a partir do próprio prato, o de cada um, que conseguiremos alcançar o combate ao desperdício, em larga escala, planeta afora!
Com as crianças, esse processo educativo é maravilhoso, porque, de forma lúdica, elas entram na brincadeira e se estimulam, com o devido acompanhamento, a deixarem seus pratos, limpinhos, sem restos, para depois fazer o zero, com os dedinhos, como símbolo da campanha do Desperdício Zero = Lixo Zero = Fome Zero. Com adolescentes e jovens é mais complicado, porque eles não têm interesse em pensar no outro, no amanhã, no depois. Nesse sentimento, o olho é sempre maior que a fome, ou a necessidade de se alimentar. Com idosos, é superfácil, pois eles já foram educados, no passado, nessa perspectiva de não desperdiçar.
O que não podemos entender, e aceitar, é que o Brasil ainda não tenha leis, como a França, a Itália e outros países, que proíbem, penalizam e consideram crime o desperdício de alimentos. Em supermercados e outros estabelecimentos comerciais, o combate ao desperdício tem funcionado bem e são diversos os exemplos de coletivos, em movimentos diários ou semanais, para a coleta do que seria descartado como resíduo não aproveitado, virando lixo, como sinônimo de sujo, sem valor.
Apesar da fartura que o Brasil ostenta,
a fome ainda é realidade no país
Segundo pesquisas, o desperdício de alimentos tem um custo elevado, pois entre os processos da produção, colheita, armazenamento, escoamento e tratamento, gasta-se tempo e energia que poderiam ser racionalizadas.
Há bons exemplos na Europa. Na Itália, por exemplo, onde há leis contra o desperdício, o custo é de 12 bilhões de euros por ano. Em declaração pública, o ministro da Agricultura italiano, Maurizio Martina, disse “consegue-se recuperar atualmente 550 milhões de toneladas de alimentos por ano, mas queremos atingir o dobro em 2016”. O nosso lema é doar, em vez de desperdiçar”.
Na França, os supermercados que ainda descartam alimentos no, ou como, lixo, sem necessidade, serão multados em valores que podem chegar a 75 mil euros. E movimentos franceses dão bons exemplos de projetos que coletam e aproveitam bem os alimentos.
A ideia, em desafios de sensatez, solidariedade e racionalidade humana, tem sido estimular a doação.
Com toda a fartura que o Brasil sempre ostentou, a falta de alimentos, a fome mesmo, ainda é realidade. No interior de cidades nordestinas, por exemplo, é comum se ver pés de manga, pitanga, acerola, limão, mamão, condessa, pinha, e outras frutas, apodrecidas, ao chão, onde galinhas, pássaros e outros bichos, não dão conta de consumir.
Desde 1999, quando criei, por conta própria, o Movimento AMA – Amigos do Meio Ambiente, desenvolvemos, em escolas, condomínios, coletivos diversos: de feiras livres a universidades e residências, a campanha permanente, itinerante, e sem recursos: Desperdício Zero = Lixo Zero =Fome Zero, com valores também em outros consumos, como água, energia e papel.
O AMA é movimento livre, independente, e como tal os desafios são muitos para levar a campanha adiante. Quem quiser e puder nos ajudar, entre em contato, que fazemos oficinas e rodas de diálogos sobre o consumo racional, inteligente e solidário, de alimentos e outros produtos.
Liliana Peixinho é jornalista, ativista, autora de “Por um Brasil Limpo”. Fundadora da Rede Ativista de Jornalismo e Ambiente (Reaja), do Movimento Amigos do Meio Ambiente (AMA) Mídia Orgânica e outras mídias alternativas. Especializada em Jornalismo Científico e Tecnológico. Vencedora do Prêmio Shift – Agentes Transformadores – 2015.
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