Publicado em 12/08/2024 às 07h50.

O facão da liberdade e do respeito

Texto de André Curvello

Redação
Foto: Assessoria

 

Chico Mendes morreu em 22 de dezembro de 1988, aos 44 anos, em Xapuri, no Acre. Seringueiro brutalmente assassinado. “Chico, onde houver uma vida sua voz será ouvida como força de oração do amor pela terra que não se encerra no coração. Sou mais um nessa guerra quebrando a serra da devastação”. Dos autores Almir de Araujo e Marquinhos Lessa, a canção “Louvor a Chico Mendes” foi imortalizada na voz da baiana Simone em 1989.

Neste sábado, 10 de agosto, morreu Tuíre Kayapó, ícone da resistência indígena. Ela tinha 54 anos e foi vítima de um câncer no útero. Tem uma foto simbólica em que Tuíre, então com 19 anos, encosta o facão no rosto de um engenheiro da Eletronorte, durante uma audiência pública para debater a construção de uma usina hidrelétrica no rio Xingu. O fato é que as obras ficaram paralisadas por 20 anos, o projeto foi “melhorado”, transformando-se hoje em Belo Monte.

O gesto de resistência imortalizou Tuíre e o seu facão. Não pode ser interpretado como ato de violência. Ali, a guerreira Kaypó mostrou a sua indignação contra o sistema perverso vulnerável aos mais diversos tipos de tentação, quando esquece os princípios básicos de cuidado e atenção ao meio ambiente.

Chico Mendes e Tuíre Kayapó viveram suas vidas no Norte do Brasil, esquecido pela conveniência e pela distância de tudo, menos na vida global. Os dois guerreiros são símbolos de luta e de liberdade. Autênticos, gritaram pela vida de todos nós, não foram ouvidos como deveriam, mas deixaram um legado alicerçado no respeito. Sim, nada mais do que o respeito. Respeito pela vida.

Nos tempos de hoje, a velocidade nos induz a banalizar os fatos por mais terríveis que sejam. A vida parece passar tão rápido que nos faz perder o senso crítico com tudo. Ai, terminamos sendo cúmplices de crimes diários da desinformação que têm lugar nas redes sociais e na própria imprensa tradicional. Os veículos de comunicação passaram a se preocupar muito mais com a audiência e com a velocidade de informar do que com a qualidade do conteúdo. Isso contribui para formar uma sociedade cada vez mais rasa e superficial.

Os veículos de comunicação esqueceram da responsabilidade social que deveriam ter. Estão priorizando a audiência. Os meios digitais priorizam cliques e conteúdos sensacionalistas e mais nada. Nada mesmo. O objetivo é faturar cada vez mais, com seus proprietários estando distantes do compromisso de informar e contribuir com uma sociedade melhor e mais solidária. Os sites se proliferarm, a exigência do diploma de jornalista não existe mais e todos nós estamos reféns das informações produzidas à base do nada e muitas vezes eivada pelo ódio – motivada pela estupida polarização que tomou conta do Brasil -, sem qualquer cuidado com a reputação alheia.

Chico Mendes lutou contra a destruição. Tuíre e o seu facão defenderam a vida e o respeito. Este dois ícones devem sempre estar nas nossas mentes. Diferente de nós, eles tiveram tempo de lutar e se preocupar com os outros. Enfrentaram a velocidade e deram contribuição autêntica para o fortalecimento do Estado Democrático de Direito.

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