Publicado em 18/04/2016 às 17h34.

Bellintani: ‘Entrei no DEM com objetivo de participação eleitoral’

O secretário municipal de Educação, em entrevista exclusiva ao bahia.ba, fala dos desafios e resultados da pasta e não descarta uma chapa 'puro sangue' na eleição de 2016

Evilasio Junior
Guilherme Bellintani | Foto: Izis Moacyr/ bahia.ba
Foto: Izis Moacyr/ bahia.ba

 

Recém-filiado ao DEM, o secretário municipal de Educação, Guilherme Bellintani, é um dos “meninos de ouro” do prefeito ACM Neto e nos últimos meses tem sido um nome comentado para disputar o cargo de vice na eleição municipal deste ano. Depois de dois anos à frente da Secretaria de Desenvolvimento, Turismo e Cultura, ele aceitou o desafio de chefiar, desde janeiro de 2015, uma pasta no mínimo problemática em qualquer gestão pública e aponta os resultados em entrevista exclusiva ao bahia.ba. “Tivemos um avanço no Ideb [Índice de Desenvolvimento da Educação Básica], reformamos ou reconstruímos 163 escolas, o que corresponde a 40% da rede, e vamos entregar a rede muito melhor do que quando pegamos”, afirmou.

O secretário deixa claro que a sua atuação na política soteropolitana não será duradoura, mas admite que está disposto a participar da eleição este ano. “Naturalmente, se eu ingressei em um partido, foi com o eventual objetivo de algum momento ter participação nessa eleição de 2016. Mas isso não é elemento principal”, diz. Sobre a possibilidade de o prefeito ACM Neto não sair candidato à reeleição este ano, como deu a entender, Bellintani prefere acreditar que a hipótese não irá se concretizar. “Olha, acho que tudo é possível dentro da movimentação política, independentemente dos movimentos nacionais. Em Salvador temos uma aprovação muito grande do prefeito e uma tendência, eu diria, bem provável de uma candidatura dele a reeleição”, frisa.

Na área em que atua, o secretário tem projetado melhorias e anuncia um centro de educação integral no bairro de Coutos que prevê investimento total de R$ 15 milhões. “Isto não está divulgado porque o prefeito só divulga quando acontece. Temos em curso uma obra de R$ 15 milhões que é um grande modelo que vamos implementar. Nos moldes do modelo de Anísio Teixeira”, comparou. Embora assuma ter uma vivência política, dentro de casa, com forte vertente de esquerda, Bellintani diz se sentir bem no DEM e ao lado do prefeito, considerado por ele como um político “moderno e ousado”. Reconhece que a pasta da Educação, embora seja uma prioridade da gestão, é pouco conhecida pela população. “A classe média soteropolitana sabe quantos trios elétricos saem no circuito Barra-Ondina, mas não sabe quantas escolas municipais têm perto de sua casa. Sequer sabe o que é escola municipal ou estadual”, pontuou.

Guilherme Bellintani | Foto: Izis Moacyr/ bahia.ba
Foto: Izis Moacyr/ bahia.ba

 

Bahia.ba – Ficou mal esclarecida a sua ida para o Democratas. Em um evento, a imprensa perguntou e a resposta foi de que a sua saída do PPS não iria interferir no tempo de TV. Qual foi a motivação para ingressar no DEM?

Guilherme Bellintani – Se você for observar, temos uma legislação eleitoral que de fato não incentiva a presença em partidos médios ou pequenos. Estou falando, logicamente, de densidade eleitoral, sobretudo através do número de deputados. Naturalmente, se eu ingressei em um partido foi com o eventual objetivo de, em algum momento, ter participação eleitoral nessa eleição de 2016. Mas isso não é elemento principal. Quando fizemos isso, não tínhamos a avaliação dessa legislação eleitoral. Depois, há uma interpretação ainda conflituosa sobre isso, que na verdade já restariam aos seis principais partidos a ocupação de espaço na TV e o PPS não está entre eles. O prefeito sugeriu mudanças e me pediu que eu fosse um democrata para fazer novos ajustes como, por exemplo, o Sílvio (Pinheiro) que foi para o PSDB.

.ba –  Sobre a sua participação na eleição 2016. Quando você ingressou no PPS, o comentário que foi feito é de que você se habilitava para ser uma das opções a vice do prefeito ACM Neto. Agora, com você no DEM, acredita na possibilidade de uma chapa ‘puro sangue’? 

GB – Na política tudo é possível. Acho isso legítimo, mas não acho que esteja como prioridade do prefeito e nem acho que haja motivo específico para que aconteça. Que é possível é, mas é improvável, apesar de ter sido comum na década de 90 e até mesmo nos anos de 2000 aqui na Bahia. Acho que o movimento e a configuração mais abrangente torna essa opção improvável, mas possível é.

.ba – O PMDB se fortalece com o processo de impeachment e consequentemente o enfraquecimento do PT. O próprio Geddel falou que no momento adequado vai fazer as exigências ao prefeito ACM Neto. Um movimento qualquer que não fosse indicar o vice do PV para dizer ‘a gente está mantendo a coligação que venceu em 2012’ ou do PMDB, que é o maior partido da coligação, pode causar problemas desnecessários ao possível futuro governo do prefeito. Você concorda com isso?

GB – Não. Primeiro acho que a escolha não vai se dar exclusivamente pelo prefeito e isso está muito claro. Ela vai se dar por uma conjunção de fatores, que passa pela consulta e consideração de todos os partidos aliados, inclusive o PMDB, que é o maior partido da nossa base aliada. Acho que é indiscutível a consideração do PMDB como força representativa. Acredito que tanto Geddel, quanto o prefeito e as lideranças de outros partidos querem a melhor chapa possível, seja ela do ponto de vista de densidade eleitoral, seja do ponto de vista gerencial e administrativa. Desde o começo do governo do prefeito, a gente tem uma harmonia plena das forças partidárias dentro da gestão, sem que necessariamente se contabilize quantos secretários são de quais partidos. O que o prefeito buscou foi associar pessoas competentes, sejam elas de origem técnica, ou do setor privado, como é meu caso, ou de origem política, mas sempre com habilidades claras no processo de gestão. E dentro disso a gente está, cargos e técnicos e quadros de cada um dos partidos, independentemente até do posicionamento político do secretário. Vou te dar um exemplo: na minha secretaria tem pessoas sugeridas por partidos muito diferentes, e todas passaram por avaliação técnica muito consistente. Hoje eu tenho uma equipe formada pelas 25, 30 pessoas principais e, se eu fosse escolher, escolheria todas novamente. Temos cuidado na seleção. O que o prefeito fez foi considerar como relevante as relações partidárias, mas não colocar isso como imposição. Acho que isso para a próxima gestão também vai ser cuidado, e sendo o vice do PMDB, do PV, ou de qualquer outro partido, o que importa é manter densidade eleitoral e a qualidade da gestão, claro, considerando a hipótese de o prefeito ser reeleito.

.ba – Quando você entrou no PPS, falou de identificação com o partido. Essa mudança para o DEM é muito radical?

GB – É bem diferente. O PPS e o Democratas têm origens muito diferentes, apesar de hoje no plano de atuação política estarem razoavelmente próximos. O PPS tem origem socialista, até comunista, que passou pelo movimento de atualização e modernização, em seu curso, da sua linha programática. O DEM com uma linha um pouco mais conservadora, faz um governo totalmente aberto. O prefeito tem uma mente aberta. O governo do prefeito torna muito à vontade a atuação de uma pessoa como eu, que vim de formação mais progressista de casa. A política caseira que eu vivi, da minha família, foi uma política com ideias liberais e menos conservadoras, mais abertas, progressistas. Naturalmente, eu me sinto muito à vontade no governo de ACM Neto. O que eu faço hoje, meus ideais, poderia fazer em qualquer governo de qualquer vertente ideológica que respeitasse a minha opinião, como o prefeito respeita. Não só respeita como estimula.

.ba – Vamos falar de um possível governo Temer que elenque ACM Neto como provável ministro. Ou até mesmo se tiver uma convocação de eleições gerais, ACM Neto em uma chapa nacional e Bellintani alavancado ao posto de candidato do prefeito para concorrer em 2016. Isto seria absurdo no seu entendimento?

GB – Olha, acho que tudo é possível dentro da movimentação política, independentemente dos movimentos nacionais. Em Salvador temos uma aprovação muito grande do prefeito e uma tendência, eu diria, bem provável de uma candidatura dele à reeleição. Mas sabemos que dentro do movimento político o prefeito tem o direito, e é até compreensível, de não querer partir para reeleição. Isso não é facilmente percebido pelas pessoas. A partir do momento que, na prática política, existe a hipótese da reeleição, presume-se que todos partirão para reeleição. O que o prefeito colocou publicamente, e eu comento, é que ele não se sente obrigado e a reeleição não é algo impositivo. É provável que ele decida pela reeleição mas, se não escolher, partirá para melhores rumos e saberá escolher, independentemente de movimentação nacional.

Guilherme Bellintani | Foto: Izis Moacyr/ bahia.ba
Foto: Izis Moacyr/ bahia.ba

 

.ba – No caso de ser convidado a assumir a cabeça da chapa, Guilherme aceitaria?

GB – É uma coisa que o prefeito pode responder melhor. Não acredito que ele vai decidir sozinho pelo nome de Guilherme, Sílvio, Fábio Mota, Bruno Reis, João Roma, Luiz Carreira ou Célia (Sacramento). Ele vai passar por uma consulta plena aos partidos da base que participaram intensamente da gestão. Não seria em um momento como esse que ele decidiria isso sozinho.

.ba – O prefeito, caso faça esse movimento, fica um pouco mais livre para atuar nos bastidores para as eleições de 2018…

GB – Nesse sentido, de uma eventual, e eu diria até pouco provável opção pela não reeleição, tem vantagens e desvantagens. Tem a desvantagem de ter que escolher um novo candidato, trabalhar o nome dele, marcar uma eventual transferência de votos para outra pessoa que não o próprio prefeito… É mais trabalhoso. Mas, por outro lado, é uma decisão ousada que mostra, e pode mostrar, uma atitude mais pioneira do prefeito ACM Neto. Têm vantagens, como ele poder ficar mais livre para atuar no interior ou seja lá o que for, mas tudo isso ainda está em um grau especulativo por mais próximo que estejamos do processo eleitoral.

.ba – Em entrevista à Rádio Vida, o seu colega de partido, deputado Alan Sanches, opinou que para ele o melhor cenário seria Neto candidato à reeleição este ano e a governador em 2018. Qual a sua opinião?

GB – Acho que essa é uma tendência natural. Quando o prefeito deu as primeiras entrevistas dizendo que pode não considerar a reeleição, houve quem tomasse um susto inicial. Mas quando vamos ver os sentidos e os argumentos, vemos que é algo palpável. Mas todos nós desejamos, inclusive uma percepção do que fala a população, que ele vá para a reeleição.

.ba – E em 2018, ele sai candidato a governador?

GB –  Não sei avaliar ainda. Não dá para avaliar um cenário de 2018 sem ter passado pelo cenário de 2016. Sequer chegamos à conclusão específica sobre o cenário deste ano… Até 2018, quantas voltas o mundo vai dar em torno dele mesmo? Pelo menos duas ao redor do sol. Então, tem muito tempo.

.ba – Se você não disputar a eleição este ano, e o prefeito vier a ser reeleito, continua na gestão, se for convidado?

GB – Isso também é algo que vai se tornando não mais um desejo de retornar [à vida empresarial]… Para mim é cada vez mais uma necessidade, tenho minhas empresas e, em algumas dessas atividades, eu tenho pessoas que dividem comigo, que assumiram. É o caso da gestão da faculdade, da editora, algumas coisas que temos funcionamento pleno sem minha presença direta. Outras não, que ficaram prejudicadas. Quando decidi vir para a vida pública deixei muita coisa no meio do caminho. E vários acordos previam esse trabalho de quatro anos. Então eu digo isso: a vida pública para mim está sendo uma passagem, uma boa passagem, e minha pretensão de fato é cada vez mais encerrar no final de 2016.

Guilherme Bellintani | Foto: Izis Moacyr/ bahia.ba
Foto: Izis Moacyr/ bahia.ba

 

.ba – Em relação à imagem de Bellintani, você acha que perdeu mais quando saiu da Secretaria de Cultura e Turismo, que tem uma boa visibilidade, e passou para a Educação, que tem mais problemas e relação mais tensa com os servidores?

GB – Não sei de imagem. Certamente em percepção de inovação. A outra secretaria, apesar de pequena, foi onde conseguimos, eu e a equipe, dar visibilidade a uma secretaria que foi a última a ter secretário escolhido. Era um orçamento muito limitado e fizemos um trabalho com projeção, de fato, muito grande. Na Educação é diferente. A minha percepção é que, se priorizasse mais a exposição midiática, o trabalho ia parecer esvaziado. Eu hoje resisto mais aos programas que são mais midiáticos, mas pouco consistentes, porque acho que a gente precisa na Educação fazer uma transformação muito de base. Na educação, o que tem que aparecer não é o trabalho do secretário.

.ba – Em sua gestão, ficaram expostas algumas reclamações sobre a Secretaria de Educação, inclusive, para muita gente, surpreendentes, como a deflagração da greve dos professores há um mês e meio, em que foi revelada a falta de docentes de disciplinas essenciais como português e matemática. Também problemas de infraestrutura de escolas, falta de ambientes adequados… A paralisação foi encerrada, mas em relação às críticas, o que de fato foi sanado ou quais são as garantias de que as questões serão resolvidas? E quando?

GB – A greve teve um motivo único que foi a não implantação no período determinado pela união da reserva da jornada. A reserva foi uma lei aprovada, enviada pelo Executivo, aprovada pelo Legislativo com a força da nossa base de sustentação de vereadores, e é uma lei que dá ao professor direito de ficar um terço da sua jornada fora da sala de aula, dando ajuda pedagógica, planejamento de aula, conversa com os pais e atividades pedagógicas. Esta foi uma lei pioneira, com investimento de R$ 80 milhões por ano em ampliação de docentes, porque quando um professor sai da sala de aula temos que colocar outro. Oitenta milhões por ano, em um ano de absoluta crise no sistema financeiro nacional, principalmente na gestão pública… Menos de 1% dos municípios brasileiros tem essa lei. Entre as grandes capitais, praticamente nenhuma. Foi um ato de extrema ousadia.

A partir do momento que começou o ano e não tínhamos contratado o número de professores suficientes, eles deflagraram a greve, que, em nossa opinião é intempestiva. A greve foi de natureza política e não tem nada que me convença do contrário. O que estava em discussão era disputa pelo espaço político no comando do sindicato, especialmente pelo PCdoB, que é hoje quem comanda, e a oposição ligada ao PSOL. O que havia era um racha dentro do próprio sindicato. Com a deflagração da greve isso ficou muito claro. Tanto que 18 dias depois a greve foi encerrada.  Não é possível que em um processo de contratação de mil professores tenhamos conseguido resolver isso em 18 dias. Não foi em dezoito dias que tornou possível a implantação da reserva. Isso veio desde junho do ano passado. O final da greve foi decretado sem nenhuma proposta diferente do Executivo. A assembleia que aprovou o fim da greve não teve nenhuma proposta nossa aprovada.

Sobre outros problemas que considero relevantes, são históricos. Temos 418 escolas em funcionamento e em 90% delas a energia da Coelba que chega não é suficiente para instalar sequer um ar-condicionado. E, apesar disso, 20% das salas da rede municipal têm ar condicionado de janeiro do ano passado para cá. O problema da climatização é sério, mas é um problema de toda cidade, a partir do momento que um morador de Paripe ou em Periperi, ou em Valéria, por exemplo, não consegue ter ar-condicionado por falta de estrutura elétrica da Coelba. Notificamos a Coelba com ofício para a Aneel (Agência Nacional de Energia Elétrica) sobre as 418 escolas que queremos instalar ar. Isso custa R$ 7 milhões. É um volume  grande, sim, mas é pouco para a dimensão da secretaria e para o impacto na melhoria da qualidade de aula. Esse ofício foi enviado no final de janeiro. Espero que a Coelba mude isso e a gente consiga resolver essa questão.

Temos problemas, sim. Mas temos uma rede que avança também. Mais de cem reformas feitas de janeiro para cá, dobrando as vagas de educação infantil, implementando um novo projeto pedagógico, que é um desejo dos professores. Inclusive implantamos esse novo projeto pedagógico com participação de quatro mil docentes em apenas nove meses. Hoje, alunos estudam com material didático feito por professores da própria rede. Isso é uma economia ao longo de oito anos de R$ 40 milhões. Dá mais de R$ 5 milhões de economia por ano.

Infelizmente, temos também o processo na gestão educacional de que só costumam aparecer os elementos negativos. A classe média soteropolitana sabe quantos trios elétricos saem no circuito Barra-Ondina, mas não sabe quantas escolas municipais têm perto de sua casa. Sequer sabe o que é escola municipal ou estadual. Fala que é escola pública. Não sabe sequer se uma criança de dez anos estuda na municipal ou estadual. Isso é uma ignorância da classe média soteropolitana, e brasileira como um todo, que infelizmente termina com a concepção de que o que vem da escola pública não presta. E isso não é verdade. A gente tem uma rede educacional brasileira e em Salvador que vem, de forma objetiva, melhorando. Os índices de avaliação do Ideb são cada vez melhores no Brasil inteiro.

.ba – Há cinco anos, aproximadamente, começou uma mobilização nacional em relação às escolas públicas de tempo integral. O Município chegou a acenar para isso na gestão anterior, mas parece que a questão não caminhou tanto. Outras pautas relevantes vieram e isso saiu da agenda? Como a secretaria vê o conceito de educação integral?

GB – Isso na saiu da nossa agenda. A viagem que eu faria com o prefeito ACM Neto em março deste ano [para o Vale do Sicílio, na Califórnia, EUA], suspensa por razão da greve, e que foi reprogramada para maio, tem como objetivo principal o novo projeto de educação em tempo integral. A gente está com a construção do primeiro centro de educação integral em Coutos. Isto não está divulgado porque o prefeito só divulga quando acontece. Temos em curso uma obra de R$ 15 milhões que é um grande modelo que vamos implementar. Nos moldes do modelo de Anísio Teixeira, com as escolas satélites, que em um contraturno absorvia as escolas do entorno em uma escola parque central. Este modelo de Anísio nos serviu de inspiração. Será um centro de alta tecnologia e com experimentação, chamada escola-laboratório. O aluno não vai lá para ter aulas de reforço. Ele vai lá para aprender a matemática sobre outra ótica: games de matemática, jogos, laboratórios, uma série de outros elementos… Tudo isso faz parte de um conceito pedagógico elaborado por nós a partir do meu ingresso, em janeiro passado, na Secretaria de Educação. Agora vou dizer algo que é incomum: a educação em tempo integral não é a solução dos problemas educacionais do Brasil. Prefiro muito mais uma escola com tempo parcial, bem sólida e com fundamentos, do que tempo integral feito para meramente preencher tempo do aluno e mostrar estatísticas de crescimento de tempo integral. Não acredito nisso. Aliás, os projetos em tempo integral da educação pública, os que são bons são muito restritos, absorvem uma quantidade pequena. Não há grandes projetos no Brasil com qualidade em tempo integral que tenha alcançado dimensão grande dos alunos. Este nosso projeto tem o objetivo de conseguir experiências bastante positivas e ser replicável a um custo possível para grande parte dos alunos. Essa é a nossa esperança.

.ba – Em relação à educação especial, à obrigatoriedade da presença do cuidador na sala de aula, à necessidade de suprir demandas excepcionais de crianças com limitação, retirando do professor essa cobrança única, como o Município tem agido para dar conta?

GB – Temos um desafio grande na educação das crianças com deficiência. Temos cada vez mais rede crescente no nosso público de conveniados. Vou citar aqui o NACPC (Núcleo de Paralisia Cerebral. Um trabalho que tem manutenção e investimento forte do Município todo mês. Atende a uma grande quantidade de crianças, mas não é suficiente. Temos o próprio trabalho de inclusão na própria sala, os ADs  (Agentes de Desenvolvimento) que trabalham. Temos a escola que também foi formada no ano passado, a Escola Municipal Hospitalar Irmã Dulce, que não tem sede fixa e gira em torno dos hospitais e clínicas de Salvador, atendendo a cerca de mil crianças ao mesmo tempo. Temos 47 professores que atendem mensalmente em torno de mil crianças. Alguns alunos permanentes da escola recebem em seu domicílio, três vezes por semana, visita de professores e outras são flutuantes, que estão temporariamente no hospital. Nosso professor se comunica, dando sequência com o trabalho pedagógico. E isso no Hospital Irmã Dulce, Martagão Gesteira… todos esses têm unidades das nossas escolas. Os orfanatos não entram na classificação. Não estão na lógica da criança com deficiência. Os orfanatos e creches comunitárias compõem um sistema educacional próprio.

Guilherme Bellintani | Foto: Izis Moacyr/ bahia.ba

 

.ba – Como foi que a mosca da política partidária picou Bellintani?

GB – Acho que é natural que, quando temos envolvimento e gostamos do que estamos fazendo, esse vínculo vai aumentando. Mas essa expressão da mosca é usada para mais ou menos assim: ‘quem entra na política nunca mais sai’. Eu não considero isso como verdade. No sentido da política macro, sim. Pela experiência que tenho de vida e pela experiência que tive, vou sair do movimento político, mas não de forma ampla. Qualquer ser humano com visão mais crítica e aguçada dos movimentos sociais, jamais sairá da movimentação política. Mas a gestão pública é uma tendência passageira.

Você citou a minha primeira experiência empresarial que foi o curso Podium. Depois fui para outro caminho: fundei uma faculdade, depois fiz uma editora, fui para a área do mercado imobiliário… Tenho um movimento cíclico, assim como acredito que a minha vida na gestão pública tem um tempo determinado. O que eu busco é fazer uma avaliação do que está sendo feito. Não vamos sair com a rede perfeita, mas temos hoje um índice de rendimento dos alunos em 2015, comparando com 2014, de 3% a menos de reprovação na sala. Isso sem nenhum tipo de interferência, sem adoção de modelos criticados como aprovação automática. Simplesmente movimentamos a rede com novos projetos pedagógicos.

Três por cento em um ano significa quase quatro mil crianças que deixaram de ser reprovadas. Tínhamos índice de distorção por idade/série e hoje temos seis mil crianças a menos em 2016 do que tínhamos em 2015. Ou seja, crianças com dois anos ou mais de atraso. Crianças com 11 anos na turma de 9 anos. Outras seis mil devemos conseguir em 2016. Temos hoje um projeto pedagógico próprio. A gente deve ter uma tendência de elevação do Ideb em torno de 10% a mais, de 4% para 4,3%, 4,4%. Quer dizer, para um ano que trabalhamos com esse foco, é um resultado muito bom. É muito difícil para o modelo da educação pública brasileira conseguir avanços de curto prazo. O que vamos fazer é entregar uma rede municipal melhor do que recebemos.

.ba – Qual sua expectativa, como cidadão e como secretário, com a aprovação do processo de impeachment da presidente Dilma?

GB – Primeiro é preciso avaliar que esse processo que está acontecendo no Brasil é ao mesmo tempo admirável e lamentável. Admirável porque as pessoas passaram a se envolver com os processos da política no país, passaram a cobrar responsabilidade e o país institucionalmente está funcionando. Está mostrando que funciona, e que tem respeito, seja no Congresso, no STF, no juízo de primeira instância, com Sérgio Moro. As instituições funcionam. E é lamentável por ter chegado a esse ponto. Não avalio ser favorável ou não ao impeachment. Avalio dentro de um processo político como um todo. Ter um governo bem sucedido, como foi o governo Lula, que com todas as suas críticas, inclusive com o mensalão, conseguiu avanços significativos para sociedade brasileira. Avanços sociais que são históricos, e que o levaram à altíssima popularidade, que não devem ser desconsiderados.

E uma sequência disso (do governo) foi mal formulada. Um governo que permaneceu como governo de coalizão, fazendo diversas alianças que, de certa forma, sustentavam aquele governo quando ele se tornou inapto, como foi. O governo mostrou uma total incompetência gerencial, que deveria ser a principal característica de Dilma, que foi colocada ali como grande gerente, mas mostrou ser inábil. O governo que deu R$ 500 bilhões de isenção fiscal, ou de negativa fiscal, a diversos setores, como energia elétrica e automotivo… O que é isso? Aumentar o sistema de consumo desenfreado que, o tempo todo, os grandes economistas no Brasil diziam que estava errado. E prolongou a crise, justamente para sustentar um processo eleitoral.

Agora, eu acredito muito nas instituições e acredito que o impeachment é um sintoma de ruptura. Em minha opinião, poderia e deveria ser evitado. O melhor para o país seria que não tivesse impeachment, não quero dizer desse impeachment em específico, e que tivesse sido respeitado todo o processo temporal. O melhor para o país é que o mandato tivesse início, meio e fim. Acho que vamos passar por muito tempo de trauma e sofrimento. A questão do desemprego não tenho perspectiva que melhore, nem o crescimento, em um curto prazo. Acho que vai ser um momento, se confirmado o impeachment dela também no Senado, de grande sensibilidade e nervos à flor da pele no sentido político. Mas acho que o país vai poder se recuperar. O país já passou por isso na sua história e mostrou que pode se recuperar.

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