Publicado em 16/05/2016 às 11h51.

Carlos Martins: ‘Não creio que Temer queira retaliar a Bahia’

Secretário estadual de Desenvolvimento Urbano, em entrevista ao bahia.ba, fala da integração entre ônibus e metrô e sobre os desafios para a Bahia pós-Dilma Rousseff

Evilasio Junior
Foto: Izis Moacyr/ bahia.ba
Foto: Izis Moacyr/ bahia.ba

 

Com o compromisso de tocar importantes obras para a mobilidade urbana de Salvador e Região Metropolitana, como o metrô, o Veículo Leve sobre Trilhos (VLT) e a nova rodoviária, o gestor da Secretaria de Desenvolvimento Urbano (Sedur) se mostra confiante na boa execução de seu trabalho, apesar do cenário político confuso e da economia cambaleante.

Às vésperas de uma grande mudança para a população usuária dos ônibus e metrô de Salvador, Carlos Martins descarta picuinhas políticas com a prefeitura e explica como funcionará o sistema que possibilitará aos soteropolitanos usar os dois modais com o pagamento de apenas uma tarifa.

Economista e ex-secretário estadual da Fazenda, Martins já presidiu a Companhia de Transportes da Bahia (CTB) e assumiu, em janeiro de 2015, a missão de tocar as diversas obras de mobilidade urbana e habitação do estado. Petista de longa data, ele vai explicar por que decidiu não sair de candidato à prefeitura de Candeias, seu território político, em 2016, e como está o andamento do metrô de Salvador.

Ainda sobre política, ele explica o que espera dos peemedebistas Geddel Vieira Lima, recém-empossado como ministro-chefe da Secretaria de Governo, e do presidente interino Michel Temer.

Foto: Izis Moacyr/ bahia.ba
Foto: Izis Moacyr/ bahia.ba

 

Bahia.ba: Foi anunciada a ampla integração do metrô com as linhas urbanas de ônibus. Vai funcionar mesmo dentro do previsto?

Carlos Martins: No âmbito do estado, nós estamos preparados para assumir a integração do ônibus metropolitanos. No entanto, persistem algumas dúvidas em relação à integração dos ônibus urbanos, que fica à cargo da prefeitura, e também de uma conversa conosco. Estamos aguardando esses dias uma definição  concreta sobre isso. Só a partir desses detalhes é que podemos definir uma data definitiva [para operação plena]. O certo é que entre 20/25 de maio estarão integrados todos os ônibus metropolitanos que saem das estações da Lapa e Pirajá.

.ba: Então, quem pega ônibus em Cajazeiras e desce na Estação Pirajá já tem o acesso gratuito ao metrô? 

CM: Atualmente a Estação Pirajá é uma estação fechada. O que acontece hoje é que o usuário pega um ônibus no seu bairro de origem e pode pegar outro gratuitamente na Estação Pirajá. Mas o sistema de integração exige uma estação aberta, porque as pessoas precisão circular e pegar o metrô, outro ônibus etc. Para garantir que o usuário de transporte urbano tenha essa vantagem de pegar outros modais sem pagar tarifa excedente é necessário garantir que ele tenha um cartão que possibilite essa ação sem causar danos. A prefeitura de Salvador ficou responsável pela distribuição desde janeiro, mas, infelizmente, apenas 60 mil pessoas resgataram esse cartão, apesar de ter feito campanha e ter feito distribuição gratuita do cartão de integração. Então, para não haver um tumulto [no dia de mudança do sistema da Estação Pirajá], a prefeitura, corretamente, está tentando ampliar a quantidade de cartões em circulação para que a gente possa levar a cabo essa integração tanto dos ônibus quanto do metrô. O que ainda não é bilhete único, que tem um alcance muito maior, por poder ser utilizado em qualquer modal, como, por exemplo, o cidadão que vem da ilha com o ferry boat poderia pagar o ônibus e o metrô com o mesmo cartão. O que vamos ter aqui é Salvador é um sistema chamado interoperabilidade de cartões, que poderá ser usado no metrô, nos ônibus urbanos e metropolitanos.

.ba: E o cidadão baiano pode já pode sonhar em ter um sistema de bilhete único em breve?

CM: Esse sistema só poderá ser aplicado aqui em um futuro longo. Atualmente no Brasil o sistema de bilhetagem única só é usado no Rio de Janeiro. Isso porque é necessária uma complexa integração dos vários modais e sujeitos que compõem essa rede e alguém que tem que pagar. No caso do Rio de Janeiro é o governo do Estado quem subsidia. Então, a gente tem que trabalhar com o metrô, com os ônibus urbanos e metropolitanos, depois com o VLT (Veículo Leve Sobre Trilhos) metropolitano e do Subúrbio [projetos ainda em fase de planejamento]. Hoje o ferry boat já é com a Agerba [Agência Estadual de Regulação de Serviços Públicos de Energia, Transportes e Comunicações da Bahia], ou seja, ainda vai demorar um pouco.

.ba: Mas na prática, secretário, com o sistema oficialmente aberto, quem não tiver o cartão vai ter que pagar duas tarifas se quiser pegar dois transportes? Houve alguma motivação política da prefeitura em atrasar a integração?

CM: É, quem tiver o cartão passa direto, quem não tiver vai ter que pagar, tanto na Estação Pirajá quanto na Lapa. Não teve motivação política da prefeitura, senão eles não distribuiriam os 60 mil cartões gratuitamente. E a integração já existe na prática, mas está restrita a algumas linhas. O que acontece é que a integração em toda a cidade é um projeto ambicioso, porque só na Estação Pirajá a circulação diária é de 250 mil pessoas, mas apenas 60 mil pegaram o cartão. Imagine, então, o tumulto que seria se 190 mil pessoas quisessem acessar a estação sem o cartão? Então, se a integração não começou a valer plenamente já neste domingo (15) é por precaução da prefeitura, que ainda busca ampliar a distribuição desses cartões.

Foto: Izis Moacyr/ bahia.ba
Foto: Izis Moacyr/ bahia.ba

 

.ba: Uma crítica eu se faz ao metrô é justamente o horário reduzido de funcionamento e a inoperância aos domingos e feriados. O problema já está resolvido?

CM: Sim, mas é normal que até agora o metrô não tenha funcionado plenamente, porque todos os sistemas de metrô do mundo todo não começam a pleno vapor. Para chegar ao esquema de sete dias na semana, com quase 24 horas de funcionamento, é necessário ter um conjunto de aprendizagem, de reforços e de lógicas que só vêm com o tempo. O metrô de Salvador começou com a operação assistida, depois integração parcial e agora vai para a integração plena, em que vamos ganhar mais cinco trens novos (11 trens em operação), e um centro de operações e um sistema de telecomunicações mais modernos. Tudo isso obedecendo a uma lógica de segurança, que é a prioridade de todo o sistema. Então, desde domingo, passamos a funcionar de 5 da manhã até à meia noite. Todos os dias!

.ba: E sobre a linha 2 do metrô, como andam as obras, qual será a próxima estação a ser inaugurada?

CM: Nós temos duas estações em nível avançado, a Estação Acesso Norte, que já está com 98%, e a Estação Detran, que está em torno de 60% concluída. Essas duas estações, já devem estar em testes operacionais a partir de julho. Então, se a gente quiser colocar um trem operacional que saia da Estação Acesso Norte para o Detran, para alimentar a linha 1, já é possível. Já estamos com as vias permanentes praticamente concluídas, as catenárias elétricas em construção…

.ba: Então, já dá para saber quando uma pessoa vai pegar o metrô na Estação Pirajá, acessar a Estação do Detran e ir para a área do Iguatemi?

CM: Não, ainda não temos esse prazo para adiantar agora. Até porque, no início vamos começar com operação assistida. O que eu posso dizer é que em julho já teremos novas estações prontas para operação, mas quando vão estar em operação plena não dá pra adiantar, porque depende de uma série de fatores.

Foto: Izis Moacyr/ bahia.ba
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.ba: Até o final do ano, quantas estações devem ser inauguradas?

CM: O principal problema é que a construção da linha 2 está em uma região muito complexa, principalmente as estações Rodoviária e Pernambués, que inclusive está atrasada em relação às outras. Por causa das necessidades de readequação do tráfego, tivemos que retirar a uma faixa exclusiva de ônibus e mexer com a estrutura da região, construindo vias paralelas. Já as demais estações, Imbuí, CAB e Pituaçu, estão em ritmo acelerado. Pode acontecer de no final do ano eu ter várias estações concluídas, mas não tenha condição de colocar em funcionamento por causa das estações Rodoviária e Pernambués.

.ba: Ainda há problemas de licença e alvará com a prefeitura de Salvador?

CM: Não, não, isso já foi resolvido. Era problema com um alvará. A prefeitura não deu o alvará para as estações Rodoviária e Pernambués até que fosse apresentado um sistema adequado para a diminuição do impacto no trânsito da região. Nós fizemos isso, construímos duas marginais para ampliar a trafegabilidade. A própria CCR tem um plano para a redução do impacto no trafego da região. Mas não temos mais nenhum problema com a prefeitura.

.ba: Então, a linha 2 só chegará ao aeroporto em 2018?

CM: Não, a Estação Aeroporto estará concluída em 2017. Daqui a um ano todas as estações estarão concluídas. Aí faremos parte de um seleto grupo de cidades que têm o aeroporto ligado à cidade. Um dos poucos do mundo.

.ba: Na entrevista com o secretário municipal de Mobilidade Fábio Mota, conversamos sobre o problema cultural do soteropolitano, que cristalizou a ideia de que precisa pegar o transporte na porta de sua casa e só descer no destino final, sem fazer baldeações. O governo pensa em algum tipo de campanha para acostumar os usuários a usarem o serviço, que ainda tem uma adesão muito baixa?

CM: Isso acontecerá aos poucos. Um metrô muda a mentalidade das pessoas em qualquer lugar do mundo, porque é possível fazer um planejamento de horário correto e fazer estimativas do tempo mais precisas. E a demanda do metrô aqui ainda só não é maior do que a projetada por causa da ausência da integração. O nó da questão é a integração. Na época da fase assistida, as pessoas já faziam essa integração autonomamente para cortar caminho e ganhar tempo. Mas, quando o serviço passou a ser pago, houve uma redução natural do fluxo. Hoje, entre 1,5 mil e 2 mil pessoas aceitam pagar duas tarifas para ganhar entre 40 e 50 minutos no deslocamento. Lógico que essa não é uma realidade para todo mundo. Com a integração plena, muita coisa vai mudar para melhor e as pessoas devem usar menos o sistema de transporte irregular.

Foto: Izis Moacyr/ bahia.ba
Foto: Izis Moacyr/ bahia.ba

 

.ba: O processo de impeachment foi aprovado pelo Senado, a presidente Dilma Roussef já foi afastada e o seu vice, Michel Temer, assumiu o cargo interinamente. O senhor teme que, com o PMDB no poder, a Bahia possa sofrer atrasos em suas obras, especialmente a do VLT?

CM: Não acredito nessa possibilidade. Somos um estado no muito influente na Federação e qualquer presidente, independentemente da coloração partidária, precisa do nosso estado para governar, por conta da nossa importância política e econômica. Eu não creio que o presidente, qualquer que seja ele, queira retaliar a Bahia. Inclusive, as obras de mobilidade são uma exigência do plano nacional. Nós temos projetos estruturantes na área de mobilidade. Acredito que qualquer presidente queira dar continuidade, até porque irá querer capitalizar também. O VLT do Subúrbio vai beneficiar uma ampla parte da população baiana carente, que precisa de um trem de qualidade, rápido. Ou seja, além de mudar a vida das pessoas, vai também gerar empregos e fomentar o turismo. Assim como VLT metropolitano, que propõe interligar as cidades da Região Metropolitana de Salvador. Eu não creio que ninguém vá querer atrapalhar esses projetos, não.

.ba: Todos os recursos para a linha 2 do metrô, R$ 3,6 milhões,  já foram repassados?

CM: Não. Uma parte da parte que cabe à União e ao governo do Estado, que é R$ 2,6, milhões ainda não foram repassados integralmente. O R$ 1 bilhão restante é a parte que cabe à CCR.

.ba: Com base na acusação que a prefeitura faz, de que houve retaliação política no não repasse de recursos para o projeto do BRT, Geddel Vieira Lima (PMDB) é o homem forte da política do governo temporário de Temer. Se, por acaso, ele fizer um revide, pode impactar na conclusão do prazo para a conclusão da linha 2 do metrô de Salvador?

CM: Não, a equação financeira do metrô está resolvida. Apenas uma parte pequena do recurso, que cabe ao OGU (Orçamento Geral da União) é que ainda não foi repassada. Não creio que mesmo com comportamentos antirrepublicanos, que possam vir a acontecer, essa obra esteja ameaçada.

.ba: E a obra do VLT, já teve o repasse garantido? Qual é a previsão de conclusão?

CM: Não, essa obra ainda não teve o repasse garantido, aí sim pode ser que aconteça. É uma obra com prazo de 36 meses. E a licitação está prevista para acontecer  no início do segundo semestre deste ano.

.ba: O senhor teme que o trabalho técnico de dimensionamento e remanejamento de linhas seja adiantado e que, por questões políticas, não seja concluído adiante?

CM- Acho difícil, porque a grande pauta nacional de todos os governos é mobilidade, tanto pelo aspecto econômico, quanto pelo aspecto de atendimento à população. O nosso projeto estruturante de mobilidade, que contempla VLT, metrô, corredores estruturantes das linhas vermelhas e azul, é muito bem estruturado. Acho difícil que seja paralisado só por questões políticas.

Foto: Izis Moacyr/ bahia.ba
Foto: Izis Moacyr/ bahia.ba

 

.ba: O senhor acha que Geddel, como ministro, vai ajudar o governo do Estado, tanto quanto se espera que ajudará a prefeitura?

CM: O que Geddel tem dito que é que, onde ele estiver, vai sempre defender a Bahia. Quero acreditar nisso.

.ba: A saída de Dilma causa, pelo menos, um impacto simbólico?

CM: Sim, sobretudo porque o governador Rui Costa tem uma relação muito boa com Dilma. Mas volto a dizer que a Bahia tem muita representatividade no campo político e que por isso não deve sofrer um impacto forte.

.ba: O senhor, como um petista histórico, como avalia o comportamento do seu partido nos 13 anos que comandou o governo federal? Assim como o ex-governador Jaques Wagner, acredita que houve excessos e que muita gente do partido “se lambuzou” no poder?

CM: Quem é que leva 13 anos no governo e não comete erros? Mas eu prefiro pensar e enumerar os acertos, que são muitos. Durante 200 anos, a Bahia só teve uma universidade federal, hoje nós temos seis. Durante décadas, nós tivemos só uma escola técnica, hoje nós temos 35. Nós duplicamos o número de universitários no país de 3,5 para 7 milhões. O índice de analfabetismo no país caiu quase 6%. A relação de alunos frequentando escolas praticamente se igualou entre as áreas urbanas e rurais. O Samu atende a milhões de pessoas, isso sem falar nas pessoas que receberam luz elétrica, as que não passam mais fome por causa do Bolsa Família. O filho da faxineira, do agricultor e do pedreiro hoje frequentam as universidades. Em 13 anos, foram três milhões de pessoas com casa própria. Treze anos com quase pleno emprego. Acho que temos muito do que nos orgulhar. Erros existiram: em relação à governabilidade, parceiros que não deveríamos ter, uma postura frouxa com relação à corrupção, e muitos de nós não tiveram os valores de fundação, mas creio que isso é menor do que os legados positivos que vamos deixar. Além de tudo isso, acredito que fortalecemos as instituições, como a Polícia Federal e o Ministério Público.

Foto: Izis Moacyr/ bahia.ba
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.ba: Por que o senhor desistiu de Candeias?

CM: A desistência de concorrer à Prefeitura de Candeias faz parte de um contexto de análise mais profundo. Hoje eu estou na Sedur, que é uma secretaria muito importante e que tem funções estratégicas, tanto na área de habitação, quanto na mobilidade e gestão territorial, que são prioridades para o governo. Além disso, o quadro político faz com que a gente pense em sair para uma campanha com três ou quatro quadros da base, com dificuldades não muito claras em relação ao financiamento de campanha.

.ba: O PT ainda não escolheu o candidato de Salvador, quem é o seu preferido para a disputa?

CM: Sinceramente, para mim o candidato mais viável do partido é Nelson Pelegrino.

.ba: Mas ele já falou que não quer…

CM: Mas é o nome mais consolidado, apesar das derrotas, e conhecido… Evidentemente que, se ele não quer, vou deixar para a direção do partido se debruçar em outros nomes (risos).

.ba: Não seria a hora de apoiar outros nomes da base?

CM: Sim, outros nomes são possíveis, como Alice Portugal ou Olívia Santana, ambas do PCdoB; Isidório (PDT), que foi candidato contra mim em outra eleição em nossa cidade. Não tenho problemas com nenhum deles.

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