Publicado em 02/03/2021 às 15h25.

Margareth Menezes: ‘Sempre lutei e sempre mantive meu trabalho com minha personalidade’

A cantora conversou com o bahia.ba sobre carreira como um todo e os desafios enfrentados durante a pandemia do coronavírus, que freou diversos planos da artista para o ano de 2020 e de 2021

Bianca Andrade
Foto: Coletivo ISO 314
Foto: Coletivo ISO 314

 

O que vem a sua cabeça quando pensa em Margareth Menezes? A baiana, soteropolitana, de 58 anos, voz por trás de um dos principais hits da Axé Music, Faraó Divindade do Egito (1987), de Luciano Gomes, a artista é uma das principais representantes da cultura baiana para o Brasil e o Mundo, e fez a sua marca na música traçando seu caminho de forma solo até conseguir conquistar seu público e espaço.

“Não sou de me queixar, sou de fazer acontecer. Portas que se fecharam pra mim no começo da carreira eu consegui abrir por outros caminhos. Só posso agradecer a Deus, aos meus fãs e ao povo da Bahia, do Brasil e dos muitos que estão aí pelo mundo e que curtem o meu trabalho”, afirma a artista.

Criadora do Movimento AfroPopBrasileiro, a cantora, que assume o título de ser uma artista independente, sempre buscando um espaço para ela e para os seus, conversou com o bahia.ba sobre carreira como um todo e os desafios enfrentados durante a pandemia do coronavírus, que freou diversos planos da artista para o ano de 2020 e de 2021. Confira:

bahia.ba: 2020 foi um ano diferenciado para o mundo como um todo e para a classe artística em especial, que precisou se adaptar ao universo sem plateia presencial, como você vem pensando seus projetos nessa nova realidade?

Margareth Menezes: O ano de 2020 realmente foi um ano que mexeu com a maioria das atividades profissionais que lidam com o contato direto com o público. Todas as áreas das artes e o universo de expressões culturais ainda estão buscando alternativas para se manter e com certeza as lives abriram uma janela, mas ainda é um espaço pequeno se comparado ao grande número de profissionais que estão ligados e que vivem da economia gerada pela produção artística e cultural no Brasil. Estamos em um momento muito difícil e precisamos encontrar uma solução. Temos vários projetos pela frente e todos estarão adaptados aos novos formatos do mercado. Procurei me informar e trazer para o meu trabalho as ferramentas novas e me adequar a essa realidade.

bahia.ba: Quais projetos você precisou paralisar devido à pandemia? Eles serão retomados ainda este ano?

MM: Nós paralisamos todos os projetos, tour Autêntica, Mercado Iaô, Festival AfroPop, Tour Internacional, enfim, paramos todos os shows que estavam programados. Eles serão retomados na medida do possível e, como disse anteriormente, adaptados a novos formatos possíveis e seguros para esse momento.

(Assista a última live realizada por Margareth Menezes)

bahia.ba: Você já pensa em seu próximo Carnaval? Em 2022, caso o Carnaval seja realizado, Margareth estará nos Mascarados?

MM: Não estou pensando no Carnaval. Nem estou preocupada com isso agora. Acho que teremos um ano bem difícil pela frente e daqui até lá será uma longa caminhada. O Brasil está numa situação muito delicada sendo um dos países que pior tratou a pandemia. Estamos perdendo muita gente todos os dias.

bahia.ba: Você costuma se tratar como artista independente e por anos afirmou que não teve oportunidades iguais na Bahia. Agora, estabilizada após a criação do Selo do Mar, você tem planos para oferecer aos novos artistas essas oportunidades que lhe foram negadas?

MM: Sim, eu sou uma artista independente. Essa é a minha história. Tenho selo desde 2005. E todas as produções que fiz, de lá pra cá, têm a participação da minha produtora. Eu fui e sou a grande mantenedora do meu trabalho. Tenho meu escritório que me gerencia há mais de 20 anos. Criei juntamente com Jaqueline Azevedo o Bloco Os Moscardos e criei o Movimento AfroPop Brasileiro. Sempre lutei e sempre mantive o meu trabalho com a minha personalidade. Tiveram dois escritórios ou três no máximo ao longo de minha carreira que me representaram por pouquíssimo tempo. Esse é o aspecto e a base de eu me declarar que sou artista independente.

Talvez eu tenha sido a primeira artista da minha geração na Bahia a ter seu próprio selo. Quanto a dizer que não tive oportunidades iguais aos artistas brancos, isso é uma constatação de quem acompanha meu trabalho. Eu, graças a Deus, não perdi anos da minha vida me queixando de nada, nem esperando ninguém. Eu sempre fui à luta buscando oportunidades e, com isso, concretizei e estabilizei minha carreira. Se tenho uma construção sólida ao longo desses 34 anos de carreira, só eu e quem me acompanha sabe o trabalho que tivemos. Não sou de me queixar, sou de fazer acontecer. Portas que se fecharam pra mim no começo da carreira eu consegui abrir por outros caminhos. Só posso agradecer a Deus, aos meus fãs e ao povo da Bahia, do Brasil e dos muitos que estão aí pelo mundo e que curtem o meu trabalho. Ao longo da minha carreira, sempre gravei músicas de compositores novos e convidei novos artistas a cantarem comigo em várias oportunidades. Se um dia o selo Pedra do Mar puder produzir outros artistas, farei. Na verdade, eu sonho com isso. Penso que estamos caminhando para que isso aconteça.

Foto: Coletivo ISO 314
Foto: Coletivo ISO 314

 

bahia.ba: Como foi para você a experiência de sair da sua zona de conforto para estrelar a websérie ‘Casa da Vó’ na plataforma de streaming Wolo?

MM: Nunca estive em nenhuma zona de conforto. Durante a pandemia, além de todo o estresse que vivemos, eu fiz quatro lives, participei do júri do Festival da Educadora 2020, ouvindo e julgando mais de duas mil composições, participei da equipe da curadoria da Casa Natura 2020, fiz colaborações em vários coletivos, gravei música com vários artistas novos e ainda topei fazer a Vó Tereza, papel principal da série comédia “A Casa Da Vó”. Foi muito legal.

bahia.ba: O serviço Wolo foi criado para empregar e valorizar o trabalho de pessoas negras. Como você enxerga em um cenário macro as oportunidades para profissionais e artistas negros? Você acredita ser negra foi o motivo das oportunidades te serem negadas no passado?

MM: A plataforma Wolo TV chega com uma proposta super legal e necessária. Quanto a essa questão de oportunidades, é um assunto muito batido e é muito sabido por todos como funciona o mercado. Acho que agora começam a apetecer ações mais reais para mudanças em relação a melhores oportunidades para os profissionais afro brasileiros. Não vamos ficar chovendo no molhado com esse assunto. Já estamos em um novo movimento e isso é o que importa. Já caminhei, graças a Deus, os ‘nãos’ que recebi na vida só me serviram de combustível pra eu fazer acontecer o SIM!

 

Foto: Wolo TV
Foto: Wolo TV

 

bahia.ba: De uns anos para cá, muito se fala sobre a cultura negra ter se tornado pop, e com isso ter virado ‘objeto’ na mão de alguns artistas sem carregar a essência, tratando algo apenas como comercial. Você percebe esse movimento?

MM: A cultura negra é Pop tanto quanto as outras. Temos memória, mas também somos ativos e urbanos. Quantas vezes o diferencial nas produções pop chegou pela presença de elementos e comportamento Afro nas suas expressões? O que é o Tribal? Nós somos agentes e agimos no presente. Pop significa popular e o que é popular se relaciona com a macro comunicação e, para haver isso, tem que gerar identidade com o povo e, para haver identidade, tem que haver simbiose. Se houver simbiose com o povo negro é porque tem inspiração Afro em alguma célula no que está sendo proposto. Fora isso, não geraria identidade. Podes crer, amizade. Simples assim.

bahia.ba: No último ano você tomou posse como nova embaixadora Unesco, Fundo das Nações Unidas para a Educação, Ciência e Cultura no Brasil. Quais projetos e ideias você pensa em pautar e atrair a atenção, em especial aqui na Bahia?

MM: Eu fui nomeada pela IOV, que é um organismo internacional, como Embaixadora do Folclore e da Cultura Popular do Brasil. Este órgão tem o apoio da UNESCO e mobiliza diversos projetos e festivais no Brasil e no mundo. Em função da pandemia, os projetos presenciais também precisaram parar e a volta vai depender da melhora do cenário. Mas, independente disso, continuamos articulando possibilidades e fazendo encontros pelas redes sociais sobre projetos e retomada. Para saber mais, as pessoas podem visitar os canais da IOV na internet: iovbrasil.com.br e @iov_brasil, no Instagram.

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