Publicado em 10/08/2016 às 16h19.

Rui compara valores de obras e levanta suspeita de Neto

“Não consigo ver como se gastou R$ 70 milhões no Rio Vermelho. Para fazer oito pistas na Orlando Gomes, com dois complexos de viadutos, eu gastei R$ 157 mi”, comparou governador

Evilasio Junior
Foto: Camila Souza/ GOVBA
Foto: Camila Souza/ GOVBA

 

O governador Rui Costa (PT) colocou em suspeição o prefeito ACM Neto (DEM), em entrevista exclusiva ao bahia.ba, pelo valor da obra de requalificação do Rio Vermelho. Além de comparar o custo anunciado com o complexo de viadutos executado recentemente em Salvador pelo Estado, o petista apontou para uma suposta irregularidade no projeto. “Eu não consigo enxergar como se gastou R$ 70 milhões naquela obra do Rio Vermelho. Para você ter uma ideia, para fazer oito pistas na Orlando Gomes, com dois complexos de viadutos, eu gastei R$ 157 milhões”, declarou.

Embora diga não ser “fiscal” e que uma possível auditoria caberia ao Tribunal de Contas dos Municípios (TCM) ou ao Ministério Público, o chefe do Executivo baiano ainda questionou a contratação da construtora responsável pelo projeto, alvo da Operação Copérnico da Polícia Federal. “A empresa que é especialista em obra de construção civil virou gestora hospitalar e o dono foi preso. Foi levada para depoimento ainda outra pessoa que é muito próxima da administração”, acusou.

Mesmo com o argumento de que o resultado do pleito municipal deste ano não interfere na sucessão estadual de 2018, em que ambos são listados como possíveis concorrentes, Rui pôs em xeque a capacidade de administrar do democrata, ao contestar outros projetos, como o BRT, e até compromissos eleitorais do gestor.

“Se eu pegar as dez maiores cidades da Bahia, Salvador é pior do que as outras nove em termo de oferta de ensino infantil. […] É, provavelmente, a pior cidade da Bahia em oferta de PSF. […] Ele prometeu um hospital na campanha de 2012. Alguém já foi atendido no hospital que ele construiu, não? […] Ele não disse que ia encerrar o mandato com uma licitação de hospital. […] Me socorra, Neto. Eu preciso de um hospital. Entregou? Não. […] Então, onde estão a eficiência, a competência, a rapidez e a prioridade para a saúde?”, cutucou.

No bate-papo, o governador falou também do impacto da crise econômica no Estado, das medidas para reduzir a folha de pessoal, da Ponte Salvador-Itaparica e confirmou ter um carinho especial pelo prefeiturável Pastor Sargento Isidório (PDT), entre os três postulantes da sua base. Ele classificou o trabalho na Fundação Dr. Jesus, de recuperação de dependentes químicos, como “algo singular no Brasil”. Confira a entrevista na íntegra:

Foto: Camila Souza/ GOVBA
Foto: Camila Souza/ GOVBA

 

bahia.ba – Como tem sido o relacionamento do senhor com o presidente interino Michel Temer?

Rui Costa – Eu diria que, até aqui, funcional (risos).

.ba – Nesse cenário de crise, o secretário da Fazenda, Manoel Vitório, cogitou, em entrevista à gente, até o desligamento de servidores efetivos, se não houver uma melhora na arrecadação. O cenário é tão dramático assim? Como está o planejamento do governo?

RC – O secretário da Fazenda sempre bota tintas mais fortes. Não tem esse cenário de desligamento de efetivos. O que nós vamos continuar fazendo é, no caso das empresas públicas, que são CLT [regidas pela Consolidação das Leis Trabalhistas], ajustar o quadro, porque tem muita gente aposentada que continua trabalhando. Isso é um custo alto e, evidentemente, as pessoas vão ficando mais idosas e a produtividade vai diminuindo. Tinha gente de 80 anos dentro das empresas. No passado, havia um entendimento do STF [Supremo Tribunal Federal] de que o empregado CLT, quando se aposentava, automaticamente estava desligado. A empresa, se quisesse, faria um novo contrato de trabalho com o mesmo empregado. Teve um julgamento há sete, oito anos, não me lembro que ano foi exatamente, e o STF entendeu que o ato da aposentadoria não rompe o vínculo empregatício. Depois desse entendimento, as pessoas deixaram de sair das empresas. As privadas continuam tirando as pessoas, mas as públicas pararam de desligar, porque havia sempre liminares mandando voltar. Teve até um rolo agora na Conder, em que nós conseguimos cassar uma liminar, mas existe essa polêmica na Justiça do Trabalho. Eu não vejo sentido nessa decisão. Há um debate hoje na sociedade sobre a reforma na Previdência e os que defendem a não mudança alegam que as pessoas precisam se aposentar, para cuidar da sua saúde, cuidar da sua família e tal. Quem é servidor público, antes, saía com 70 anos compulsoriamente. Hoje foi para 75. Na lei atual, quem é servidor, não tem jeito: bateu 75, sai. CLT não tem isso. Há pessoas que não têm condições físicas de se locomover direito e estão nas empresas. Estão há 10, 20, 30 anos recebendo dois salários: o salário da Previdência e o salário de funcionário. Então, essas pessoas nós estamos tirando progressivamente.

.ba – Elas não têm mais condição laboral? O senhor não teme críticas?

RC – Não há nenhum dano social. As pessoas já estão aposentadas há 10, 20, 30 anos. Todos nós, com a chegada da idade, principalmente quem precisa de mais locomoção, mais atividade física para exercer suas funções, começa a ficar comprometido. É evidente que nem todo ser humano é igual. Tem gente com 90 anos que está andando, mas tem gente que com 70 já está com problema.

.ba – O senhor sabe precisar o contingente?

RC – Mais de mil, com certeza.

 .ba – E a venda da Ebal [Empresa Baiana de Alimentos]?

RC – Nós estamos remodelando. Fizemos uma primeira tentativa, mas demos o azar de estar no meio da crise. Vamos fazer uma segunda tentativa agora, porque não é possível manter uma empresa pública que sempre deu prejuízo e continua dando.

.ba – Até quando o governo pretende concluir o negócio?

RC – Vamos fazer a segunda e última agora no segundo semestre. Se não der [certo], vamos liquidar a empresa de outro jeito.

.ba – Vai vender o patrimônio e a marca?

RC – O ativo, mas a maior parte do ativo está em nome do Estado, não está no nome da Ebal. Essa não vai à venda. Nós vamos vender em outro momento, em separado. Agora serão a rede, a marca, que tem o cartão de crédito, e um terceiro item, que por incrível que pareça tem um valor de mercado, que é o prejuízo registrado. Ela tem R$ 800 milhões de prejuízo registrado.

.ba – Isso vale, é?

RC – Vale, porque quem tem lucro líquido pode deduzir no imposto de renda. Isso dá um ganho para quem fizer esse uso. A lei permite. Então, isso tem um valor de mercado e nós pretendemos vender também. Nós pretendemos vender tudo junto. Se não conseguirmos, vamos separar ainda este ano.

 

“Eu estou sacando por ano R$ 2,7 bilhões da receita corrente mensal. Com esse dinheiro eu faria todas as estradas da Bahia duas vezes. Só para dar a dimensão do valor e do quanto algo feito ou mal feito na gestão passada impacta hoje no nosso governo.”

 

.ba – Venda da Ebal, corte de aposentados. Os cargos comissionados o senhor também pretende enxugar?

RC – Quando eu entrei, eu já enxuguei. Já tirei dois mil.

.ba – Não vem mais nenhuma leva?

RC – Não. Isso não tem representatividade em termos de economia e causa um grande prejuízo ao funcionamento da máquina. Hoje, muito dos serviços das secretarias depende dos cargos comissionados. Toda a área administrativa e toda a área de apoio funcionam com os cargos. Então, se você tirar, isso causa um prejuízo grande no funcionamento das secretarias e a economia é irrisória, porque é pouca coisa. O que tem quantidade é tudo com salário de R$ 1 mil, R$ 1,5, R$ 2 mil… e o peso dessas pessoas nem conta para a Previdência.

.ba – Por falar em Previdência, como está a situação hoje da Bahia?

RC – A maior dificuldade para os estados é algo estrutural em relação à Previdência, além da queda de arrecadação. Os governadores de hoje, principalmente do Nordeste, mas também do resto do país, naqueles estados que não fizeram a previsão, estão pagando o preço da forma de governar das gestões anteriores. Na época [de Paulo Souto] foi feita inclusive a privatização da Coelba, com o intuito de capitalizar as previdências. Isso não foi feito e, na verdade, não se criou o fundo das previdências. Ou seja, não houve o depósito nos fundos ao longo dos anos. Se assim fosse feito, hoje nós teríamos o dinheiro das aposentadorias depositado. Em 2009, [Jaques] Wagner criou o Baprev. Os funcionários que entraram de 2009 até 2016 estão no Baprev, que hoje tem um saldo positivo de R$ 1,1 bilhão. Daqui a 20, 30 anos, quando esse pessoal se aposentar, o governador de 2036 não terá esse problema, porque ele vai sacar esse dinheiro para pagar os aposentados. Eu estou sacando por ano R$ 2,7 bilhões da receita corrente mensal. Com esse dinheiro eu faria todas as estradas da Bahia duas vezes. Só para dar a dimensão do valor e do quanto algo feito ou mal feito na gestão passada impacta hoje no nosso governo. Se o governador lá atrás tivesse criado esse fundo, ou mesmo que o fundo cobrisse uma parte, hoje só era tirar dinheiro do fundo e pagar os aposentados. Mas hoje tem zero e nós temos 100 mil aposentados.

.ba – Os aposentados do Tribunal de Justiça, do Ministério Público, dos tribunais de Contas, da Assembleia Legislativa, tudo despenca nos cofres do Estado?

RC – No ano passado eu lancei esse déficit na conta deles (risos). Até 2014 era lançado na conta do Estado. O que para mim sempre esteve muito claro, pelas resoluções dos tribunais de Contas do Estado e da União, e na própria Constituição, agora fica explícito na lei federal. Em 2016 nós já lançamos os débitos previdenciários na contabilidade de cada poder. Mas o déficit é grande, principalmente do Judiciário e do Executivo, e custa caro. E foi ficando ainda mais caro porque, ao longo dos anos, muitas decisões judiciais deram benefícios ou equipararam aposentados às condições da ativa. Então, por exemplo, há decisões que nós não concordamos, como em relação à GAP [Gratificação por Atividade Policial]. GAP é uma promoção. Foi feita uma lei que criou GAP I, II, II, IV e V, em que você promove soldados da ativa e isso foi estendido judicialmente, e muitos já ganharam e já está sendo pago, para o pessoal da inativa. É algo inusitado: aposentado ter promoção.

Foto: Camila Souza/ GOVBA
Foto: Camila Souza/ GOVBA

 

.ba – Em relação à Ponte Salvador-Itaparica, os chineses estão de olho na obra e estariam dispostos a participar. Teria um projeto do governo já na Caixa Econômica…

RC – Na minha ida à China, eu apresentei alguns projetos, entre estradas e ferrovias, e ele é o mais caro. É um investimento que requer mais estudos. Da minha viagem para cá, equipes diferentes deles, multidisciplinares, devem ter vindo aqui umas seis ou sete vezes para estudar o projeto da ponte. A parte estrutural está feita, a parte ambiental está feita, a de estudos metropolitanos também, mas eu acho que o que ainda não está bem resolvido é a viabilidade econômica. A estrutura que foi feita contava com recursos públicos, em um volume expressivo. Nesse quadro conjuntural, eu não vejo no horizonte a possibilidade de o governo federal portar recursos para essa ponte, não em um curto período de tempo. Então, nós estamos buscando outro formato imobiliário e hoteleiro que dê viabilidade à ponte. Eu diria que temos que preencher o lugar que estava reservado para recursos públicos com retorno privado.

.ba – Seria quanto, mais ou menos?

RC – No mínimo, R$ 2 bilhões.

.ba – O senhor acha que é possível conseguir o valor da iniciativa privada?

RC – Acho que sim. Se você estruturar um projeto imobiliário e financeiro… Nós estamos falando de recursos que têm que estar maturados em um longo período. Esse não é um investimento para quem busca retorno em um curto prazo. Isso é um investimento bom para fundo de previdência. Para as ‘viúvas’, como o mercado financeiro chama os investidores de projetos que se estruturam no modelo de 20, 30 anos. Qualquer coisa menos disso não é factível. Então, isso é um investimento para quem quer retorno certo, seguro, no longo prazo. Se você pegar o desenvolvimento do mercado imobiliário a partir da ponte, eu não tenho dúvida. Nós estamos falando de uma nova Rio-Niterói, guardadas as devidas proporções. Nós vamos ter estruturação, verticalização e hotéis do outro lado, na Ilha e no baixo sul. O volume de pessoas que você pode levar por balsa, por melhor que seja o serviço, não é o mesmo volume que você leva em uma ponte. Tem gente que, hoje, gostaria de ir mais vezes ao lado de lá e não vai por causa do transporte. Se tivesse uma ponte, tem gente que estaria todo dia do lado de lá, ou morando lá e trabalhando aqui. O que aconteceu em Lauro de Freitas? Você imagine do lado de lá, que é um lugar mais aprazível, mais bonito, mais aconchegante e muito mais valorizado se tiver a ponte. O mercado imobiliário vai até Valença, o baixo sul e o Recôncavo. Aquela região inteira vai ser valorizada. Nós estamos identificando projetos acessórios que poderíamos conceber que sustentem o projeto da ponte. Há muitos projetos hoteleiros, mas que só ficam de pé se as pessoas chegarem facilmente.

.ba – O senhor acha que começa a viabilizar o projeto ainda no seu governo?

RC – A tentativa é essa, mas assim, nós só vamos fazer o projeto, como os outros projetos que nós fizemos, se estiver estruturado. O metrô está andando bem porque foi bem estruturado. Mas eu diria que nós andamos metade do caminho na ponte. Concluiu-se todos os estudos ambientais, de solo, de fundação, de projetos arquitetônicos, de plano diretor metropolitano, das cidades do outro lado, isso tudo foi feito. O pedágio a gente consegue botar aí R$ 2,5 bi. Se a gente conseguir mais R$ 2,5 bi… O Estado pode contribuir com uma parte como contraprestação, ou seja, pagar mensalmente ao longo de 20, 30 anos, e uma parte teria que vir da iniciativa privada. Se eventualmente o governo federal quiser participar do projeto, ele entra com uma parte. Os chineses têm muito interesse na área imobiliária – muito. Quem estrutura um projeto desse tamanho sabe que precisa de uma receita acessória.

 

“Não sabia que Salvador estava excluída do mapa de recursos federais nas áreas de Saúde e Educação. Realmente, é uma grande surpresa saber disso.”

 

.ba – Um deputado de oposição nos falou: “Olha, a gente não quer prejudicar a Bahia, Geddel sempre teve interesse em fazer obras no estado, mas a gente vai fechar a torneira para a sangria de ações do governo federal assinadas pelo governo do Estado”. O senhor falou protocolarmente que a relação com Temer era “funcional”, mas com a pouca arrecadação do Estado e o chamado “fechamento de torneira”, o senhor teme que haja impacto no volume de obras que serão levadas à população?

RC – Olha, primeiro que não tem ‘sangria’ nenhuma aqui, muito pelo contrário. A Bahia tem se destacado pela excelência da boa execução de projetos estruturantes. A PPP [Parceria Público-Privada] do metrô é usada hoje no país inteiro como exemplo de sucesso. O Hospital do Subúrbio tem sete premiações internacionais, inclusive do Banco Mundial, e também reconhecido e usado no país inteiro. Os projetos com recursos federais hoje em curso na Bahia, à exceção do Minha Casa, Minha Vida, são todos eles pensados, planejados e propostos ao governo federal pelo governo do Estado. Mesmo a ferrovia Fiol [Integração Oeste-Leste] é um projeto pensado pelo engenheiro baiano Vasco Neto, proposto no primeiro governo de Wagner ao presidente Lula, que em seguida passou a sua execução para a presidenta (sic) Dilma. Nós hoje conseguimos, inclusive, uma empresa chinesa para dar continuidade à obra com recursos dos chineses. Só está precisando de uma confirmação da Valec do formato de como remunerar a empresa chinesa. Eu já falei com o ministro dos Transportes [Maurício Quintella Lessa] que, se necessário for, a Bahia aceita receber o ativo do que está hoje executado pela Valec, que ele seja transferido para o Estado, que a Bahia assina o contrato com os chineses para colocar a obra em andamento. Da nossa parte está resolvido. O que nós queremos do governo federal é que ele cumpra os contratos que tem, dos projetos que estão em execução das obras do PAC. Os novos projetos nós estamos estruturando todos com a iniciativa privada. Ameaçar fechar a torneira, as pessoas até poderiam fazer, mas deviam ficar com vergonha de fazer. Além de fazer, ainda anunciar que vai fazer, aí os eleitores vão responder no momento adequado.

.ba – Um dos motes da campanha de ACM Neto é justamente esse, de que o governo do Estado não faz uma obra com recursos próprios, ao contrário da prefeitura de Salvador… Isso fica muito forte para a população, de que o Estado faz com recursos federais e o Município faz com o dinheiro dele…

RC – Eu gostaria de saber quais foram. A Barra eram recursos federais. Foi paga com recursos municipais porque a licitação foi feita errada. A licitação foi feita em RDC [Regime Diferenciado de Contratações Públicas] e não podia ser feita em RDC. Por isso não foram utilizados recursos federais naquela obra. A Caixa não aceitou e não poderia aceitar. Eu mesmo disse: ‘se vocês aceitarem RDC para pavimentação e calçamento me avisem que também quero seguir no mesmo caminho’. A licitação foi feita em RDC e executada em RDC. Ali tinha recurso federal. Não foi utilizado porque o ministério não permitiu. Não sei se depois eles ajustaram e o ministério pagou, mas até onde eu sei não pagou. Também não sou fiscal da lei. O Tribunal de Contas é que vai se manifestar. As obras na área de educação são recursos de onde? As reformas dos postos de saúde são recursos de onde?

.ba – O prefeito diz que são recursos da prefeitura…

RC – [dá muxoxo e bate duas vezes na mesa] Ele não recebe recursos do FNDE [Fundo Nacional de Desenvolvimento da Educação] não, é? É o único município do país que não recebe… Eu não consigo entender como uma versão, às vezes, prevalece aos fatos. O Município de Salvador não recebe o Fundo Nacional de Saúde [FNS], não? São só os outros municípios? Não sabia que Salvador estava excluída do mapa de recursos federais nas áreas de Saúde e Educação.  Realmente, é uma grande surpresa saber disso. Aliás, dos cinco mil e tantos municípios do Brasil, não conheço um que não faça obras com recursos próprios. Servem para que os recursos municipais se não for também para fazer obra? Não entendo como isso pode ser elemento de força na campanha. Isso eu não consigo entender. Só se o debatedor do outro lado for muito frágil para isso encaixar como um ganho.

Foto: Camila Souza/ GOVBA
Foto: Camila Souza/ GOVBA

 

.ba – Em 2018, o senhor não vai cair nessa “pegadinha” contra ele, né?

RC – Esse negócio de que a obra foi feita com qual recurso é besteirol. O que interessa são bons projetos. O problema é qual é a qualidade do projeto. Eu, por exemplo, não fiz e não faria nenhum projeto daquele tipo para o Rio Vermelho.

.ba – O senhor disse que foi troca de passeio…

RC – E foi. O que é que foi feito ali? Aliás, eu nem vi vocês da imprensa comentando. Teve show de inauguração da obra. Se você passar hoje, tem obra lá? A obra continua? Depois do show a obra recomeçou e continua até hoje. Se fosse eu que tivesse inaugurado uma obra e, na semana seguinte, tivesse furando tudo de novo…

.ba – A prefeitura diz que é a segunda etapa…

RC – Segunda etapa? Eu realmente quero conhecer essa segunda etapa. Eu não faria essa obra. Não botaria R$ 70 milhões ali na mão de uma construtora para fazer uma obra daquela. Foi troca de passeio e daquela lona plástica [dos quiosques]. Eu insisto com isso. Eu vi na TV, inclusive, uma matéria grande sobre a falta de oferta de vagas de ensino infantil no Brasil, colocando o problema das cidades brasileiras, que poucas avançaram nesses últimos quatro, cinco anos na construção de creches. A nossa aqui, se for comparar entre as capitais e as principais cidades, mesmo da Bahia, está em pior situação. Se eu pegar as dez maiores cidades da Bahia, Salvador é pior do que as outras nove em termo de oferta de ensino infantil. Não é retórica, não. Eu não teria feito aquela obra. Eu teria pegado o recurso e construído creches ou melhorado a oferta de PSFs [postos de Saúde da Família] em Salvador que, no máximo, chega a 35%. É, provavelmente, a pior cidade da Bahia em oferta de PSF. Isso não sou eu que digo, é o Ministério da Saúde. É só pesquisar no site. A maioria dos municípios passa de 50% de cobertura.

.ba – O projeto do BRT, que não teve autorização de recursos pela presidente afastada Dilma Rousseff, não era bom, em sua opinião?

RC – Eu não colocaria ali BRT. Isso eu já disse a ele. Acho que caberia um VLT, saindo da Lapa, passando na Garibaldi ou Vasco da Gama e entrando no Lucaia para ir ao Iguatemi. É um transporte que tem uma capacidade maior que o BRT. O projeto dele está colocando viadutos onde vai ser a Coca-Cola, no Itaigara e no Hiper Posto com inclinação que, depois, se a demanda justificar, não poderá ser um VLT. A inclinação de rampa está maior do que 4% e o VLT só sobe até uma rampa de 4%. Isso eu falei com ele: ‘prefeito, muda esse projeto. Esse projeto não permite que outro prefeito, no futuro, coloque o VLT aqui’. Eu acho que já caberia agora um VLT, mas tudo bem. Não tem dinheiro para botar o VLT agora, pelo menos faça a construção em um modelo que no futuro permita colocar um VLT. Mas, até onde eu sei, o projeto não foi mudado e o que será executado vai encher ali de viadutos e com a rampa maior do que 4%. Então, tudo é a qualidade do projeto. Não sou eu que estou dizendo. Sugiro que vocês entrevistem 10 arquitetos e peça para eles avaliem a qualidade do projeto da Barra. Do ponto de vista urbanístico, ficou uma área árida, deserta, reduziu a atividade econômica, causando desemprego naquela região.

.ba – Todos os seus aliados têm afirmado que Neto vai utilizar 2016 como catapulta para 2018. Essa é a avaliação que dizem que o senhor mesmo faz. É verdade?

RC – Não. Essa eleição não tem nada a ver com a eleição de 2018. Absolutamente nada a ver. Os momentos são diferentes e as eleições são diferentes. Eu ganhei bem em Feira de Santana [em 2014]. Ganhei em Salvador. E os dois prefeitos [ACM Neto e José Ronaldo, ambos do DEM] se jogaram na campanha [de Paulo Souto] com toda a sua militância, toda a sua estrutura, máquina… jogaram pesado. Em Salvador, parecia que quem era candidato era o prefeito, tamanha era a quantidade de placas, de anúncios, de vezes que ele aparecia na TV. Eu perdi em Teixeira de Freitas, que era administrada pelo PT. Perdi em Eunápolis e Itabuna, que eram administradas por aliados. Em cidade grande, a influência do prefeito diminui muito. Vai depender da situação em 2018.

 

“A empresa que é especialista em obra de construção civil virou gestora hospitalar e o dono foi preso. Foi levada para depoimento ainda outra pessoa que é muito próxima da administração.”

 

.ba – O senhor não acha que ACM Neto quer se cacifar em 2016 para 2018?

RC – Ele quer ganhar a eleição. Eu dei muita risada quando eu o ouvi dizer que poderia não ser candidato. Quem que alimenta esses sonhos? Eu dava risada quando ouvia dizer que ele iria para o PR, que iria para o PTB, que iria para o PMDB, que iria para o PDT. Nos últimos quatro anos, vocês da imprensa, cogitaram ele em vários partidos. Eu dava risada. Não poderia ser ingenuidade de articulista político. É evidente que ele quer se eleger, mas isso em nada, em minha opinião, vai interferir na eleição de 2018. Até porque, na medida em que seja reeleito para o Executivo, ele passa a responder por coisas que não responderia. Por exemplo, ele prometeu um hospital na campanha de 2012. Alguém já foi atendido no hospital que ele construiu, não?

.ba – Foi feita a licitação para o hospital na Fazenda Grande…

RC – Não foi isso que ele disse na campanha. Ele não disse que ia encerrar o mandato com uma licitação de hospital. Ele disse, e tem gravado, que ia entregar funcionando no primeiro mandato dele. Eu me lembro. Me socorra, Neto. Eu preciso de um hospital. Entregou? Não, não entregou. Então, onde estão a eficiência, a competência, a rapidez e a prioridade para a saúde? Ele pegou com 30% e está com 30% a oferta de postos de saúde. Ser gestor, você tem bônus e tem ônus. O fato de estar no cargo de prefeitura dá visibilidade, traz ganhos, mas também traz questionamentos que vão precisar ser respondidos. Ele fez escolhas e hoje eu digo que eu posso comparar o valor das obras. Eu não consigo enxergar como se gastou R$ 70 milhões naquela obra do Rio Vermelho. Para você ter uma ideia, para fazer oito pistas na Orlando Gomes, com dois complexos de viadutos, eu gastei R$ 157 milhões.

.ba – O senhor acha que mereceria uma auditoria?

RC – Isso não cabe a mim. Eu não sou fiscal. Aí é para o Tribunal de Contas dos Municípios e o Ministério Público. Agora assim, um leigo comparando, olha se você consegue ver R$ 70 milhões que foram colocados no Rio Vermelho. Cento e vinte, R$ 116 milhões colocados na Barra… Por coincidência, quem fez as obras do Rio Vermelho foi o mesmo que estava administrando as UPAs [Unidades de Pronto Atendimento].

.ba – A mesma empresa?

RC – Que o proprietário foi preso umas duas semanas atrás na operação da Polícia Federal [Copérnico]. Para não ser injusto, além da troca de passeio, do asfalto e da lona, foi colocada uma grama artificial naquele campo ali. Aquele complexo de viadutos do Bairro da Paz, aquele viaduto que tem no meio da Orlando Gomes e as oito pistas foram R$ 157 milhões. É só comparar. A empresa que é especialista em obra de construção civil virou gestora hospitalar e o dono foi preso. Foi levada para depoimento ainda outra pessoa que é muito próxima da administração.

Foto: Camila Souza/ GOVBA
Foto: Camila Souza/ GOVBA

 

.ba – O senhor tem três candidatos da sua base na eleição municipal de Salvador. Se nós perguntamos quem é o seu favorito, obviamente, o senhor não vai responder. Mas eu gostaria muito de saber o motivo de o seu discurso ter sido muito mais longo e apaixonado na convenção de Isidório, em relação aos eventos de Alice Portugal e Cláudio Silva.

RC – Eu confesso que não cronometrei, mas acho que, de tempo, o mais longo foi o de Alice. Foi muito longo, tanto é que o pessoal dizia que parecia que eu era o próprio candidato. O de Isidório, talvez pelo espaço ser menor, pareceu ser mais longo.

.ba – O senhor chegou a comparar a sua história de vida com a dele…

RC – Veja, eu acho que a candidatura de Isidório tem um apelo social muito grande. Evidente que, se ele tirar as extravagâncias de comunicação que ele usa, que são ferramentas de comunicação, não mais do que isso, o que ele faz [na Fundação Dr. Jesus] é algo singular no Brasil. Não tem nenhum outro que faça. Vamos aos fatos: nenhuma clínica pública ou privada do país sequer tem 200 dependentes químicos no mesmo ambiente. Ele tem 1,1 mil ali dentro. Isso não é trivial. Quase ninguém trabalha com porta aberta: lá as portas ficam abertas. Faz parte da metodologia. Não sei como explicar aquilo do ponto de vista técnico. Ele juntou coisas do ensinamento dele de militar, com a questão religiosa e conseguiu um resultado que nenhuma outra instituição consegue. Quem vai lá na instituição tem uma lição de vida. E só dá certo, talvez, porque ele mora lá dentro com a família. Não é faz de conta. Talvez se fosse aquilo tudo, mas ele não morasse, não ficasse de pé. Por isso a ênfase que eu dei, porque eu acho que isso é um problema grande hoje na sociedade, não só da Bahia, mas também do Nordeste. O país não trata o problema das drogas de forma séria. É uma epidemia o que nós estamos vivendo. O pessoal fica falando de dengue, zika, chikungunya, mas não tem nada mais devastador hoje do que o efeito das drogas. Foram quase 70 mil assassinatos ano passado. É um negócio impensável. Não tem nenhum lugar do mundo em que morra tanta gente como aqui, nem países em guerra. Não existe. Isso tudo é efeito das drogas. Eu acho que nós precisamos ter elementos de comunicação com essas pessoas e ele, em minha opinião, vai passar uma mensagem muito positiva de humanismo e cuidado com o próximo que nós precisamos resgatar.

.ba – O senhor acredita que o impeachment terá impacto nas eleições deste ano?

RC – Tudo tem consequências. Faça uma pesquisa em qualquer município, inclusive Salvador, e pergunte se gostou ou não gostou de quem votou em favor do impeachment… Todo mundo está quieto. Quem votou está quieto. Ninguém fala mais na votação do impeachment. Tem gente que diz ‘não é comigo não. Eu nem estava lá, não vi, não sei’. Porque o povo nordestino, baiano e soteropolitano rejeita a tese do golpe que foi dada e os prejuízos que isso tem causado ao Nordeste.

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