Publicado em 07/07/2016 às 17h00.

‘Feira do Rolo’ opera em alta também no ambiente virtual

Grupo fechado, o Mercado Livre Cidade Baixa atua como uma réplica da feira de quinquilharias que funciona a céu aberto na Baixa do Fiscal

Jaciara Santos
Foto: Reprodução/ Facebook
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As ofertas variam do inusitado ao bizarro. Um celular MotoG2 com a tela trincada, mas que funciona direitinho, sai por apenas R$ 250. A chapa de fritar hambúrguer – de aparência não muito agradável, embora ainda dê no couro – é oferecida por R$ 80, com direito a choro. Aluguel de pontos de TV a cabo, anabolizantes de uso não recomendado, trajes de gala para formatura, vestidos tradicionais de casamento e – pasme! – até histórico de conclusão do ensino médio.

Não, você não está em um “mercado das pulgas” de Paris, Bogotá ou de uma remota cidadezinha chinesa. Tudo isso (e muito, mas muito mais mesmo) está a apenas um clique de distância na rede social Facebook, no grupo Mercado Livre Cidade Baixa, a correspondente virtual da Feira do Rolo da Baixa do Fiscal – a também chamada Feira do Pau, local de compra mencionado por nove entre dez suspeitos autuados em flagrante por posse de armas de fogo não registradas.

Foto: Reprodução/ Facebook
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E são inimagináveis os itens comercializados no MLCB. Se ligue. Mas não se anime muito. Navegar nas águas nem sempre muito límpidas desse mar de ofertas não é para qualquer um. O grupo é fechado. Ou seja, para vender, comprar ou somente bisbilhotar as “barbadas” disponíveis só se for membro da comunidade. E, para entrar, é preciso receber convite.

E foi como convidado de um brother da comunidade MLCB que o calouro de farmácia da Uneb P.J.S., 51 anos, descobriu aquele mundo pitoresco. Na primeira visita, um choque: “Dei de cara com um anúncio de venda de cédulas!”, conta, ainda espantado. A publicação era explícita, sem rodeios. “Dizia mais ou menos assim: ‘Vendo notas fake com marca d’água, fita de segurança e tratamento de envelhecimento’. Tinha cédulas de 10, 20, 50 e 100 reais”, relata o internauta.  Mas, como até para a liberalidade excessiva existe um limite, a oferta foi retirada do ar horas depois e já não pode mais ser visualizada.

Foto: Reprodução/ Facebook
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Histórico escolar – O mesmo não aconteceu com outra oferta que tangencia a ilegalidade. Há uma semana, no dia 29 de junho, o bahia.ba flagrou no MLCB um post que anunciava a venda de histórico escolar de conclusão do ensino médio. Embora na internet esse tipo de serviço não configure exatamente uma novidade, o preço do documento é surreal: apenas R$ 1. A reportagem tentou contato com o anunciante, mas não obteve êxito.

Com quase 65 mil ofertas já veiculadas, o Mercado Livre Cidade Baixa aposta na telefonia móvel como seu grande filão. Tem aparelhos para todas as necessidades, taras e bolsos. Sonhando com um iPhone ostentação por um precinho de celular paraguaio? Em meio a uma infinidade de opções, é possível escolher entre o que está com a tela bloqueada e aquele outro com a bateria viciada. Qualquer um dos dois sai por apenas R$ 350 e o cliente leva na hora.

Algumas ofertas dão o que pensar. Como o relógio Subaqua Noma III, com valor de mercado que pode chegar a mais de R$ 2 mil, mas que no MLCB sai por módicos R$ 800. A pechincha está relacionada a uma pequena trinca no mostrador, adquirida sabe Deus como.

Foto: Reprodução/ Facebook
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Querendo TV a cabo? Que a Sky não nos “ouça”, mas só não tem acesso a sua programação fechada quem não quiser. Oferta de sublocação de pontos é o que não falta. Tudo com precinhos camaradas e condições tentadoras.

alisson academia
Professor Alison: ‘O que difere o antídoto do veneno é a sua dosagem’ (Foto: Acervo pessoal)

 

‘Bombas’ – Outros anúncios que também chamam a atenção na feira de pulgas virtual envolvem os suplementos nutricionais direcionados ao público fitness. O Somatodrol, por exemplo, é oferecido como se fosse uma caixa de bombons desprovida de qualquer risco, embora seja uma bomba de efeito retardado. A advertência no site oficial do produto não deixa dúvidas: o consumo deve ser acompanhado por nutricionista ou médico, principalmente no caso de cardiopatas e renais crônicos.

Foto: Reprodução/ Facebook
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Outra bomba vendida no MLCB como água e que promete fazer a cabeça (e outras partes do corpo) da galera das academias é o Finaplix 100 – Trembolone acetate, um anabolizante injetável. No site Tipos de Anabolizantes, espaço virtual dedicado à musculação, a trembolona, substância ativa do produto, é descrita como “uma das drogas mais fortes injetáveis já inventadas até hoje no mundo do bodybuilder”.

Entre seus efeitos adversos estão a queda de cabelos, acnes, pele oleosa, atrofia testicular, hipertrofia da próstata, aumento da pressão arterial e tosse frequente. Ou seja, você pode até ficar bombado e com os músculos que sempre quis, mas corre o risco de ficar careca precocemente, desenvolver um quadro de hipertensão e até ter problemas na hora H…

E o que dizem os especialistas? Graduado em Licenciatura Plena pela Universidade Católica do Salvador, o professor de educação física Alison Renan Bispo dos Santos, de 32 anos, alerta para os cuidados indispensáveis ao uso de suplementos nutricionais. E ele fala de cátedra. Com mais de dez anos de atuação no mercado (possui capacitação em atividades voltadas ao emagrecimento e musculação voltada ao emagrecimento) é categórico: “O acompanhamento de um profissional em qualquer área é fundamental para uma ação bem-sucedida. A opinião do nutricionista é fundamental para o controle e sugestão quanto à seleção e ingestão balanceada dos alimentos”.

Sobre o Somatodrol, especificamente, ele ensina: trata-se de uma substância que tem como função aumentar índices de definição e níveis de força do indivíduo, gerando aumento de massa muscular e redução do porcentual de gordura. E, sim, o suplemento pode até ser usado, desde que seja sob a supervisão de um profissional habilitado e não apenas por modismo.

“Entre amigos e alunos, costumo repetir que o que difere o antídoto do veneno é a sua dosagem”, destaca e aconselha: “Ninguém deve fazer ingestão de substâncias, suplementos ou medicamentos por conta própria e de forma desordenada. É indispensável, sempre, buscar a opinião de um profissional”.

Tem de tudo – Mas, respire. Nem só de produtos ilegais, imorais ou que emagrecem vive a pulsante bolsa de ofertas do MLCB. Tem de tudo: pets novinhos, mochilas com pouco uso, delivery de alimentos, bebidas e perfumes importados (do Paraguai?), acessórios, roupas de grife (autênticas? vai saber!) e o que mais ousar a sua vasta imaginação.

Foto: Reprodução/ Facebook
Foto: Reprodução/ Facebook

 

Lançado em meados de 2013, o Mercado Livre Cidade Baixa só perde para a Feira do Rolo da Baixa do Fiscal em um ponto. Até agora, não há registro da comercialização de armas de fogo com numeração raspada. Até agora.

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