Publicado em 11/04/2016 às 14h50.

A vida é escolha

A despeito das alternativas que tínhamos no momento da decisão, jamais seremos os compositores das vidas não vividas que estavam à nossa disposição

Jorge Melo

 

ESCOLHAS
Imagem ilustrativa

 

A vida é feita de escolhas, mas viver não é entrar em um lugar previamente escolhido, não escolhemos nascer, não escolhemos nossos pais, irmãos, familiares, nem mesmo nosso nome foi escolha nossa. Logo, ninguém é uma escolha absoluta de si mesmo.

Nessa lógica, podemos conjecturar a respeito de outros caminhos que poderíamos ter percorrido ou, até mesmo, perguntar, desconsiderando as escolhas feitas e imaginando que outras opções tivessem sido elegidas, se a nossa vida seria distinta do que foi ou do que é. No entanto, a despeito das possibilidades e alternativas que tínhamos ou não no momento da decisão, jamais seremos os compositores das vidas não vividas que estavam à nossa disposição.

Este fato, embora possa dar às nossas vidas um gosto terrivelmente dramático, não nos isenta de vivenciarmos os dilemas de termos que fazer umas escolhas em detrimento de outras. Afinal, ao pensarmos a vida como resultado de escolhas, é como se, a cada instante, estivéssemos diante de uma esfinge a nos confrontar com um enigma. Todavia, diferentemente daquela de Tebas, os enigmas destas esfinges não residem em uma estranha questão que o monstro dirigia aos viajantes, nem no fato de ele devorar quem não a decifrasse.

Sempre mudando as perguntas quando encontramos as respostas, os estranhos quebra-cabeças das nossas esfinges pessoais centram-se na insuficiência do reconhecimento de si para poder decidir. Nesse sentido, são inúmeros os dilemas que surgem ao longo de nossas vidas, tais como: qual profissão escolher, onde trabalhar, mudar ou não de trabalho, abrir nosso próprio negócio, sair da casa dos pais, namorar, casar, viver junto, ter filhos, separar, divorciar, voltar para a casa dos pais, morar só, casar de novo… Mas, como cada escolha tem um revés, não existe diferença entre o ato de escolher e o ato de renunciar. Talvez por isso, não seja tão fácil, fazer escolhas, tomar decisões.

É… viver não é preciso, mas escolher é preciso, pois, como nos ensina Carlos Drummond de Andrade, o tempo foge. Não há tempo para tudo. Não poderemos escutar todas as músicas, ler todos os livros, nem abraçar todas as pessoas que desejamos. Assim, é necessário aprendermos a arte de “abrir mão” a fim de nos dedicarmos àquilo que é essencial.

Escolher implica perdas e o medo de abrir mãos das demais opções sempre nos perturba. Enquanto não escolhemos, todas as possibilidades ficam à nossa disposição, embora não possamos usufruir de nenhuma delas. Assim, suportar a pressão na hora de decidir sobre coisas que podem mudar a nossa vida ou a vida de outras pessoas não é algo fácil.

 

É necessário aprendermos a arte de ‘abrir mão’

a fim de nos dedicarmos àquilo que é essencial

 

O que precisamos ter consciência é que ao decidirmos seguir um caminho, inexoravelmente pagaremos um preço por isso, pois, teremos que enfrentar as consequências das nossas escolhas o que, convenhamos, não raro, é angustiante. Afinal, se somos livres para fazermos escolhas, somos reféns das suas consequências.

Queiramos ou não, mesmo em um mundo amplamente condicionante das escolhas de cada um, quer por modismos, juízos sociais e/ou pressões afetivas, não basta que nos olhemos no espelho dos outros, pois nossas escolhas são intransferíveis, ninguém poderá sonhar nossos sonhos, nem nos substituir na tarefa de decidirmos o que faremos, o que seremos ou por onde devemos seguir em busca de nós mesmos, por mais doloroso que seja o ato da escolha e as suas consequências.

A vida é escolha, mas antes de escolhermos, em nossa necessária teimosia de seguirmos os nossos próprios caminhos, por mais que nos confortemos com a ilusão da nossa singularidade, lembremo-nos que as consequências são inevitáveis.

Embora tenhamos a liberdade de dizer sim ou não para os eventos de nossas vidas, não devemos, de forma alguma, descartar a possibilidade de ouvirmos outras opiniões, nos momentos de dúvidas e angústias, pois, ainda que, na condição de conselheiros, as opiniões de pais, mestres, familiares e amigos tendam a vir carregadas de juízos de valores, não raro julgando as nossas escolhas, no mínimo, servem para nos alertar que se estivermos conscientes das consequências, talvez nossas vidas comecem a ter resultados mais acertados a cada dia e, com certeza, com menores possibilidades de arrependimentos, em caso de resultados diferentes dos esperados

Feito isto, caminhemos e quando alguém nos pedir para irmos por aqui ou por ali, façamos nossas as palavras de José Régio, no seu “Cântico Negro”:

“Vem por aqui” — dizem-me alguns com os olhos doces

Estendendo-me os braços, e seguros

De que seria bom que eu os ouvisse

Quando me dizem: “vem por aqui!”

Eu olho-os com olhos lassos,

(Há, nos olhos meus, ironias e cansaços)

E cruzo os braços,

E nunca vou por ali…

(…)

Não, não vou por aí! Só vou por onde

Me levam meus próprios passos…

 

Jorge Melo

Antonio Jorge Ferreira Melo é coronel da reserva da PMBA, professor e coordenador do Curso de Direito do Centro Universitário Estácio da Bahia e docente da Academia de Polícia Militar.

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