Rede de vítimas de abuso sexual vê com ‘grande preocupação’ a eleição de Leão XIV

A eleição do papa Leão XIV é vista pela Rede de Sobreviventes de Abusos por Padres (Snap, na sigla em inglês) com “grande preocupação” diante do que considera um histórico ruim do religioso ao lidar com casos de abuso sexual na Igreja Católica.

O americano Robert Francis Prevost, de 69 anos, foi eleito nesta quinta-feira (8) o novo líder máximo de 1,4 bilhão de católicos. Leão é criticado por acolher um padre acusado de crime sexual contra crianças nos Estados Unidos e por falhar na condução de denúncias recebidas quando atuava no Peru.

A associação afirma que quando chefiou a organização dos agostinianos em Chicago, o agora papa permitiu que o padre James Ray morasse no convento St. John Stone em 2000, apesar de o religioso ter restrições ministeriais desde 1991.

“Já como bispo de Chiclayo, no Peru, três vítimas recorreram às autoridades civis em 2022 depois de não haver avanço no processo canônico aberto pela diocese. As vítimas afirmam que Prevost não abriu investigação, enviou informações insuficientes a Roma e permitiu que o padre continuasse celebrando missas”, diz a Snap, segundo a Folha de São Paulo.

Na duas situações, as entidades religiosas negaram as críticas a Prevost. A Ordem de Santo Agostinho disse na época que Ray foi monitorado por outro religioso enquanto estava hospedado no convento.

A diocese de Chiclayo negou qualquer acobertamento e afirmou que o agora papa havia aconselhado as mulheres a apresentar queixa à polícia. Fundada em 1988 nos EUA, a associação Snap atua hoje denunciando casos de abusos praticados por líderes religiosos e pedindo reformas que garantam proteção dos católicos, apoio às vítimas e responsabilização da Igreja.

Ainda quando o papa Francisco estava internado, há dois meses, a Snap acionou seus membros e os incentivou a se envolver no que já se mostrava ser um conclave iminente. A entidade mapeou todos os dez cardeais americanos que votariam na eleição e conclamou seus membros a entrarem em contato com cada um desses religiosos, “deixando-os saber por que eles não são aptos a ser o próximo papa”. Um dos integrantes da lista era Robert Prevost.

Oito dias depois desse chamamento, em março, a Snap apresentou uma queixa formal contra Prevost direcionada ao secretário de Estado da Santa Sé, o cardeal italiano Pietro Parolin —que era, então, o número 2 na hierarquia do Vaticano e, por consequência, o favorito no processo de sucessão de Francisco.

A associação se baseou no decreto Vos estis lux mundi, promulgado pelo papa Francisco em 2023 para definir procedimentos de prevenção e combate a abusos dentro da Igreja, e disse ter “sérias preocupações” quanto à conduta de Prevost.

O documento relatava o que chamou de “ações ou omissões destinadas a interferir ou evitar uma investigação civil ou canônica, administrativa ou penal, contra certos clérigos da Diocese de Chiclayo”, então liderada pelo americano. “Em nossa opinião, essa conduta do cardeal Prevost constitui um abuso de poder, ofício ou função eclesiástica que prejudicou os vulneráveis e causou escândalo, um delito abordado no cânon 1378 do Código de Direito Canônico”, diz o documento.

Outro caso, o do bispo James Ray, nos EUA, também foi mencionado pela Snap. O órgão pediu que as autoridades do Vaticano investigassem a situação completa, com a divulgação pública dos resultados. A entidade não disse se recebeu alguma resposta sobre os pedidos feitos em março.

Hoje, a associação de vítimas afirmou que muitos dos que votaram neste conclave protegeram abusadores ativamente. O grupo diz ter recebido informações de sobreviventes e delatores de todo o mundo, mas não citou os nomes de quem seriam esses cardeais. A Snap conclui perguntando ao novo papa. “O senhor pode acabar com a crise de abusos —a única questão é: vai fazer isso?.”