Estúdio de Carybé mantém viva uma Bahia em vias de extinção; conheça
O bahia.ba visitou o local de trabalho do grande pintor, mantido intacto pela família. A última paleta de cores do artista é uma das preciosidades encontradas

Carybé. Ponto. Ocioso seria ressaltar uma vez mais a importância do grande artista. Inútil também enumerar seus feitos inúmeros. Por outro lado, nunca é demais falar de Carybé: um dos maiores criadores de nossa cultura visual: presente no Terceiro Centro de Saúde, no bairro da Liberdade, em Salvador, e no Aeroporto de Miami, nos Estados Unidos da América, com a mesma força e naturalidade. “O cidadão brasileiro Hector Júlio Páride Bernabó nasceu na cidade de Buenos Aires, de pai italiano e mãe brasileira, boa mistura”, assim o apresenta Jorge Amado no prefácio de “As Sete Portas da Bahia” – livro em que o talento para a escrita, ainda não devidamente avaliado, do pintor, gravador, escultor, desenhista etc, alcança talvez seu ponto máximo.
E é algo da vida do cidadão, ou melhor, do homem Carybé, que pretendemos revelar com esta visita ao seu estúdio (ele preferia essa palavra a ateliê), instalado na casa onde viveu desde 1961 até morrer em 1997, no número 9 da Rua Medeiros Neto, no coração das Pitangueiras, em Brotas. Quem nos guia neste santuário, mantido pela família tal qual deixado pelo artista, é o neto dele, o designer Gabriel Bernabó. “Esta casa ele comprou com o dinheiro dos murais do aeroporto de Nova York, aqueles que agora estão em Miami. Antes disso, morou de aluguel numa casinha vermelha que tinha um sapateiro e foi derrubada recentemente, perto da Pedra da Sereia. Depois, naquele casarão que restauraram e pintaram de marrom, no Largo de Sant’Ana, ainda no Rio Vermelho. E em um apartamento no Jardim Brasil, acho que no edifício Alcione. Até 1961, não teve dinheiro para comprar uma casa”, explica ele.


Se faltava dinheiro, sobrava talento. Talento que atraiu a atenção da super antenada Pagu, ainda em 1950. A modernista publicou no dia 26 de novembro daquele ano, no jornal Fanfulla: “Agora um andejo sul-americano, Carybé, que expõe no Museu de Arte. Carybé é artista, muito. Carybé sabe desenhar. Carybé se equilibra na tensão da linha para nos dar uma sugestão do que viu, do que visualiza, do que sente… E acontece que estas coisas que o Museu de Arte está mostrando na sua pequena sala de exposições vivas são registros de suas andanças pela Bahia, a Bahia famosa, a boa terra da Bahia, das igrejas barrocas. Vede, portanto, nestes documentos de um artista em excursão pela Bahia, o reflexo de suas impressões daquilo tudo. Do seu povo, de seus tipos, de seus santos, dos altares, daqueles trechos amoráveis”.


O desenrolar da saga é bastante conhecido: naquele mesmo 1950, a convite do então secretário da Educação Anísio Teixeira, Carybé produz painéis para o Centro Educacional Carneiro Ribeiro (Escola Parque) e fixa a bunda nômade na Bahia, onde, a partir de então, compõe a vida local como agente e como paisagem. Como agente e como a gente. Como artista e como povo. Poucos criadores estão tão presentes e palpáveis na capital baiana quanto ele. Por isso, entrar em seu estúdio é como penetrar uma das artérias coronárias da cidade. “Nossa preocupação em manter este lugar passa também por manter o seu clima, por isso, embora com muito cuidado, não temos frescuras”, diz Gabriel, filho de Sossó, autorizando sentar, olhar, pegar. O local é ainda sede do Instituto Carybé, responsável por ações que mantêm ativas as obras do pintor, como as recentes exposições “Cores do Sagrado” (até 28/02/2017 em cartaz na Caixa Cultural São Paulo) e “Aquarelas do Descobrimento” – ilustrações para a “Carta de Pero Vaz Caminha”.
“Temos também uma página no Facebook, com quase 15 mil seguidores”, diz ele, destacando a importância de não deixar estagnar uma obra plena de invenção e versatilidade. “Uma das missões do Instituto é revelar que Carybé era muito mais que o ilustrador dos livros de Jorge Amado, muito mais que um grande pintor, muito mais!”, completa. O estúdio guarda verdadeiras preciosidades, como a última paleta de cores do artista e o seu cavalete com uma tela começada. Oficina, que é, ali ferramentas típicas como pincéis e estiletes dividem espaço com outras ferramentas, como livros, muitos livros. Livros ilustrados por Carybé, livros de Carybé, e livros da coleção pessoal do artista, livros de leitura: “Ele me apresentou ‘Viagem ao Fim da Noite’, de [Louis-Ferdinand] Céline. ‘Ninguém Escreve ao Coronel’, de García Márquez, era um de seus favoritos. ‘Macunaíma’, outro”, assegura Gabriel.

Livros e esculturas. Esculturas de diversos tamanhos, materiais e origens. Protagonista de histórias sobre roubos de imagens sacras, não se sabe se alguma peça encontrada aqui faz parte desse acervo legendário. Falando sobre as esculturas do próprio Carybé, Gabriel explica um pouco do método criativo do avô: “Ele usava cera de dentista para modelar em tamanho pequeno. Depois então fazia as esculturas de fato, partindo daquela escala”. Em uma prateleira no alto, três bonequinhos chamam a atenção: Jorge Amado, Dorival Caymmi e Carybé, lado a lado: “São um presente do artista piauiense João Valdênio”.



A casa tem cachorro. O quintal tem passarinhos. A piscina tem pomar. Abundam pitangas, pimentas, bananas, jaca, manga, hortelã-grosso, limão-cravo. Se os desenhos de Carybé têm volume que parecem relevo, aqui sua obra ganha cheiro. E som. A inconfundível assinatura do artista em metal, para gravar na madeira, está lá, quietinha. Outra manha revelada: “Esse bastão ele usava para fazer detalhes, pontos que exigissem maior firmeza. Serve para apoiar o braço”.


Em 2014, em parceria com o Instituto Carybé, o jornal Correio* encartou gratuitamente fascículos de “As Sete Portas da Bahia”, revivendo o desejo original do artista, de popularizar o acesso à sua obra. De Cajazeiras ao Corredor da Vitória, todo mundo tem um Carybé para chamar de seu. “É um retorno natural. A arte dele vem das ruas, do povo. Principalmente do povo baiano. Esse projeto com as ‘Sete Portas’ possibilitou que este mesmo povo possa fruir ainda mais dessa obra”, diz Gabriel. E no prefácio já citado do livro, Jorge Amado dá a medida da grandeza, mais que do artista, do homem Carybé, este que aqui, com esta visita ao seu estúdio, encontramos.




Jorge Amado: “Aqui não quero falar dos desenhos – o desenhista Carybé ganhou, ex-aequo com o desenhista Aldemir Martins, o Grande Prêmio da Bienal de São Paulo – nem da pintura, nem sequer dos painéis espalhados mundo afora pelo artista fabuloso. Meu interesse é apenas dizer que, quando tudo se faz na Bahia para degradar a grandeza da cidade, roubar-lhe o verde das árvores, a brisa do mar, as velas dos saveiros, poluir o céu e as praias (…) nessa hora de agonia e vileza, Obá Onã Xocun, dito Carybé, nascido Hector Júlio Páride Bernabó na primeira encarnação, tomou dos instrumentos, da goiva, do formão, do macete, dos materiais mais nobres, a madeira, o cimento, o barro, e armado com a força dos orixás, fixou para sempre a face da verdadeira Bahia, a que está sendo assassinada. Quando já nada restar de autêntico, quando tudo já se fizer apenas representação, mercadoria a transformar-se em dinheiro na sociedade de consumo, a memória perdurará pura pois o filho de Oxóssi e de Oxum, o obá de Xangô, guardou a verdade íntegra na criação de uma obra sem igual pela autenticidade, pela beleza, feita com as mãos, o talento e o coração”.
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