‘Triste país aquele que precisa de heróis’
Numa democracia republicana, quem resolve nossos problemas somos nós, promovendo a responsabilização de toda a sociedade
No último domingo (13), mais uma vez, a população brasileira saiu às ruas em todos os estados da federação, incluindo o DF, em uma série de manifestações populares contra o governo de Dilma Rousseff, reunindo mais de 3 milhões de pessoas, nas capitais e em outras 299 cidades.
Se a ausência de confrontos nos protestos foi motivo de alívio, essa primeira manifestação contra o governo em 2016, preocupou a cúpula do PT e a presidência da República que, com certeza, estiveram expectantes ao longo de todo o dia, pois os números das adesões ao chamado feito nas redes sociais, calculados pelos organizadores do evento ou pelas forças de segurança dos estados, superaram em muito as mais otimistas previsões, ultrapassando os observados em outros momentos de grandes mobilizações populares, a exemplo das manifestações de 15 de março de 2015 e, até mesmo, do Movimento das Diretas Já.
Embora governistas e aliados tentem minimizar os protestos, insistindo na mesma ladainha do golpismo motivado pelo inconformismo da direita com o resultado das eleições e que a crise é artificialmente produzida pela mídia, a verdade é que o governo se sente muito incomodado com o resultado dos protestos, exatamente pelas pautas que foram para a rua e, principalmente, pelo vulto que tomaram em todo o país, temendo, com certeza, o impacto dessas manifestações no processo de impeachment da presidente Dilma Rousseff. Afinal, se houve sementes plantadas, estas germinaram e cresceram por encontrarem os terrenos férteis da insatisfação e do cansaço para além da crise econômica, adubados pelas crises ética e moral, relacionadas à corrupção.
Vestidos de verde e amarelo e com a particularidade de apresentarem pautas perfeitamente sincronizadas, ao contrário de protestos anteriores que ostentaram reivindicações difusas, os manifestantes em uníssono gritaram palavras de ordem e ostentaram faixas e cartazes protestando contra a presidente Dilma, o PT e o ex-presidente Lula, mas apoiando a Operação Lava Jato e o juiz Sérgio Moro, mesmo sem os tradicionais pedidos de intervenção militar ou da volta dos militares ao poder.
Não adianta trocar de líderes ou de partidos, sem uma mudança cultural, pois o mal é sistêmico
Nestes protestos do dia 13 de março, para mim, a mensagem do povo brasileiro foi clara e dirigida não só para a presidente da república, ao PT e a Luiz Inácio Lula da Silva, atingindo, também, políticos e dirigentes do PMDB, PSDB, PTB, PP, os empresários, banqueiros e funcionários públicos que são investigados e processados na operação Lava Jato e a todos que de alguma forma estejam envolvidos com o esquema de corrupção, construído com base em um sistema de lavagem e desvio de dinheiro na Petrobras, em conluio com o cartel de empreiteiras. A nação quer punição para os culpados. Afinal, não foi sem sentido, que, até mesmo, lideranças dos próprios partidos políticos que ajudaram a convocar os protestos foram igualmente hostilizadas.
Em contraponto, o juiz Sérgio Moro, o procurador-geral da República, Rodrigo Janot, e os membros da Polícia Federal foram elevados à categoria de heróis nacionais. Sem negar a importância da coragem e da determinação com que levam adiante – e com maestria – a operação que, pela primeira vez na história deste país, tem colocado atrás das grades membros da nossa quase intocável classe política, preocupa-me o fato de termos nos acostumado a ser um país messiânico, de salvadores da pátria, de soluções milagrosas, fruto da herança cultural de nosso passado monárquico, sobretudo em um momento tão delicado como o que o Brasil atravessa.
Inegavelmente, a corrupção é um mal que tem se perpetuado na sociedade brasileira, com maior ou menor intensidade de acordo com a partitura e o maestro e, nessa lógica, entendo perfeitamente o porquê de o cumprimento do dever constitucional com o mínimo de lisura e competência neste nosso Brasil seja motivo de euforia e entusiasmo. Mas, sempre que releio a frase “Triste país aquele que não tem heróis. Triste país aquele que precisa de heróis”, do dramaturgo Bertold Brecht, fico pensando nas próximas eleições, pois, numa democracia republicana, quem resolve nossos problemas somos nós, não buscando apenas os culpados, mas promovendo a responsabilização de toda a sociedade.
A meu ver, a solução não está na troca de apenas um governante… Não adianta trocarmos de líderes ou de partidos, sem uma mudança cultural, pois o mal é sistêmico, além de endêmico.
Sinceramente, não sei se depois da Lava Jato, o Brasil será um país melhor, mas, secretamente, nutro a esperança de que seja um país diferente para, doravante, não precisarmos de novos heróis ou de paladinos da esperança, com o dramaturgo alemão sendo sempre lembrado, toda vez que um candidato a “salvador da pátria” aparecer no próximo programa eleitoral.
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