Vaza Jato: OAS diz ter assumido obra deficitária na Bolívia para agradar Lula
Em delação, empreiteiro relatou que palestras de petista na Costa Rica e no Chile visavam 'influenciar governos'; ex-presidente nega ilícito
O empresário Léo Pinheiro, ex-presidente da OAS, afirmou, em negociação de delação premiada, que a construtora assumiu uma obra na Bolívia para agradar ao então presidente Lula (PT) em seu primeiro governo, entre 2003 e 2007. A informação é do jornal Folha de S. Paulo e do site de The Intercept Brasil, que assinam reportagem conjunta nesta segunda-feira (16).
Segundo a publicação, Léo Pinheiro menciona o petista como intermediador de negócios da empresa com governos na Costa Rica e no Chile.
À época, o então presidente, segundo ele, queria evitar um estremecimento nas relações do Brasil com o governo de Evo Morales.
Conforme a reportagem, a obra mencionada é a construção de uma estrada entre as cidades de Potosí e Tarija, que havia sido iniciada pela Queiroz Galvão em 2003. A Queiroz, porém, teria se envolvido em uma disputa com o governo de Evo, que cobrava a reparação de fissuras em pistas recém-construídas, e teve contrato rompido em 2007.
De acordo com o relato do empreiteiro, Lula articulou financiamento do BNDES no país vizinho e prometeu à OAS a obtenção de um outro contrato na Bolívia como forma de compensação por tocar um projeto problemático.
O governo brasileiro, disse Léo Pinheiro, afirmou que o impasse proporcionava “riscos diplomáticos” ao país. A paralisação da construção da estrada começou a gerar protestos nas regiões afetadas.
Em encontro em data não informada, Léo Pinheiro diz ter afirmado ao então presidente Lula que a obra seria deficitária, diante dos trechos que precisariam ser consertados e dos preços previstos.
A resposta, ainda de acordo com o relato, foi a de que Evo estaria disposto “a compensar economicamente a empresa, adjudicando um outro contrato em favor da OAS”.
Segundo o depoimento, a Bolívia retirou sanções impostas à Queiroz Galvão, autorizou a transferência do contrato e licitou um outro trecho no qual a OAS se saiu vencedora. Após a empresa assumir a obra em 2009, segundo Pinheiro a situação desandou mais adiante, já no governo Dilma Rousseff (PT), quando a área técnica do BNDES pôs entraves ao financiamento.
O contrato da OAS acabou cancelado pela Bolívia e, segundo Pinheiro, à empresa só restou negociar para retirar seus equipamentos e obter uma devolução de garantias, “após apelos de Lula”.
Léo Pinheiro está preso desde 2016 e foi o principal acusador de Lula no caso do tríplex de Guarujá (SP), pelo qual o petista foi condenado e cumpre pena em Curitiba desde abril do ano passado. Sua delação já havia sido fechada com a Procuradoria-Geral da República, mas só foi homologada neste mês pelo STF (Supremo Tribunal Federal).
Palestras do ex-presidente
De acordo com a reportagem da Folha em parceria com o Intercept, o depoimento que cita o imbróglio na Bolívia foi citado em uma proposta de delação em junho de 2017. Nesse documento, além de casos já conhecidos, como o tríplex, o ex-presidente da OAS também menciona Lula ao falar de palestras contratadas pela empresa na Costa Rica e no Chile para “influenciar em negócios da empresa”.
Segundo o relato, no país da América Central Lula foi contratado pela empreiteira em 2011, por US$ 200 mil, para uma conferência, e intermediou um encontro de Léo Pinheiro com Óscar Arias, ex-presidente costa-riquenho e prêmio Nobel da Paz de 1987.
Também relatou reunião com a então presidente Laura Chinchilla, na qual Lula teria apresentado a empresa para que atuasse em concessões públicas. O negócio, contou Pinheiro, foi concretizado.
Outro lado
Segundo a Folha, a defesa de Lula disse por meio de nota que “a mentira negociada é a estratégia da Lava Jato para promover uma perseguição política contra o ex-presidente”. Ela também afirma que o petista jamais solicitou ou recebeu qualquer vantagem indevida.
O embaixador da Bolívia no Brasil, José Kinn, afirma que não conhece as declarações de Léo Pinheiro.
Sobre a obra assumida pela empreiteira, disse que a Queiroz Galvão se recusou a reparar 92 km de estrada que estavam “com sérios defeitos” e que a empreiteira brasileira pediu permissão para transferir o contrato à OAS.
Segundo ele, “a OAS declarou que estava fazendo um sacrifício” e pediu que a Bolívia oferecesse outra obra, o que foi negado. “Em nenhum momento nos comprometemos a ‘compensar’ com outro trabalho”, afirmou o embaixador.
A defesa de Léo Pinheiro não quis comentar.
A atual direção da OAS tem dito que os relatos feitos por ex-executivos “não competem mais” à companhia e que está colaborando com a Justiça.
A Folha diz ter procurado a fundação de Ricardo Lagos para comentar o assunto, mas não obteve resposta. Michelle Bachelet sempre negou irregularidades em relação ao financiamento de sua campanha.
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