Publicado em 29/12/2021 às 11h25.

Terra em convulsão, humanos inertes!

O Ser Humano parece não estar preocupado com os sucessivos alertas no Planeta sobre a fragilidade da vida na Terra

Liliana Peixinho

 

Foto: Grupamento Aéreo da PM-BA
Foto: Grupamento Aéreo da PM-BA

 

O que acontece, agora, nesse dezembro de clima convulsivo, catastrófico, na Bahia, com 72 cidades em emergência, é a intensidade, volume e velocidade das águas, enchentes, isolamentos. Milhares de famílias desabrigadas, desesperadas, sem comida, doentes, tudo ao mesmo tempo, num curto espaço de tempo.

A visibilidade é feita pela própria população, em tempo real, sem saídas. Não fosse o uso da tecnologia celular, os fatos nos chegariam mais lentamente, picotados, editados.

Mesmo numa Pandemia, onde a vida ficou cada dia mais vulnerável, o comportamento das pessoas, mundo afora, com raras exceções, demonstra desconsiderar esforços científicos,    contribuições humanitárias, sofrimentos coletivos, e seguem adiante, alheios ou insensíveis ao que lhes rodeiam.

Eventos climáticos extremos, que remetem a análises populares de “fim de mundo”,  acontecem com mais frequência e intensidade, em cada canto da Terra. São fatos das relações, ações e atuação do Ser humano no  ambiente onde a vida funciona como um todo, não em partes.

Mais que figuras de linguagem, expressões como tsunami, tempestade de areia, furacão, enchente, incêndio, seca, são fragmentos  convulsivosde um Sistema explorado pelo capital do mal.

Sistema onde proliferam vírus, doenças, fome, miséria, negligencia. Cadeia de desarmonia social séria que atinge a vida aqui, aí, acolá, com mais frequência e intensidade

Chegam de forma célere, num caldeirão devastador. Destroem tudo que fora construído em  labutas diárias. Deixam rastros que impactam, pra sempre, histórias de vidas.

Nesse 2021, segundo ano da pandemia, ricos ficaram mais ricos, e pobres mais pobres. A alta concentração de renda é afronta social. A exploração da mão de obra, a precarização do trabalho, o desmonte de estruturas institucionais responsáveis pela promoção da Preservação de Ecossistemas, da Educação, da Justiça, da Cultura, da Economia, da Cidadania, da Segurança, integram planos criminosos, autoritários, desumanos. As reações da Sociedade não alcançam, no tempo e espaço, a velocidade dos estragos.

Nesse cenário, algumas dores, como as perdas de vidas pela Covid-19,  atingiram a todos, sem discriminação. Outras dores são consequência direta do descaso, incompetência e irresponsabilidade daqueles que tem obrigação legal de proteger e não cumprem com o papel social que lhes foi confiado.

O voto de credibilidade na representação, conquistado através de lutas populares históricas, eleição a eleição, é renovado pela esperança, fé e boa vontade do eleitor, envolvido em longos ciclos de discursos e decepção.

A exploração do trabalho é histórica e só piora. Nesse 2021, a fome saiu de casa e foi para a rua. O desespero da barriga vazia, da falta de renda, do desemprego, do desalento, corre atrás de caminhões de lixo, monta plantão nos fundos de supermercados à espera de descarte de alimentos, guarda lugar na fila de açougues para disputar ossos. A miséria está escancarada, visível em qualquer esquina, e procura lugares sob marquises, bancos de praças, viadutos, calçadas, para passar noites, em frio, fome, sede, sem afetos.

São milhões de famílias distantes das mínimas garantias de dignidade de vida. Sobreviver minimamente, à qualquer custo, é fato, indigno, desumano, criminoso.

Em meio a essa realidade, acirrada pelos efeitos do descontrole social em cuidados com um vírus, poderoso, mutante, implacável, sorrateiro, a negligencia abre espaço para doenças  relacionadas à fome ao descaso histórico com a vida..E se alastram sem a blindagem necessária à proteção e dignidade que a vida precisa, merece, em direitos, bravamente conquistados, mas não garantidos.

A ação Humana no ambiente vida, sem os devidos cuidados, de uns com outros, revela o Mal Estar Civilizatório, o Estado das Coisas, do quanto estamos distantes da necessidade do conhecimento bem aplicado à favor da vida, em contraponto ao marketing agressivo do discurso, longe  da prática.

A realidade, os fatos, os feitos, o conhecimento, se perdem numa teia de publicações, em comunicação ruidosa.

A Pandemia Covid-19- decretada pela OMS em março de 2020, acelerada em 2021 e com ameaças para 2022-  é um marco histórico, com quase 5 milhões de vidas ceifadas planeta afora, sendo  quase 620 mil só no Brasil. Vidas interrompidas de forma indígna, traumática, negligente, difícil de se aceitar.

Enquanto famílias tentam reencontros de Natal, em mesas fartas, pessoas continuam a agonizar sob novas variantes, surtos virais, acúmulo de doenças evitáveis, negligenciadas, destratadas em suas origens.

Quem dera essa Pandemia, e seus entornos, fosse alerta a nos ensinar a mudar hábitos, atos, costumes no consumir, no limpar, higienizar, proteger, ouvir, olhar, sentir. E, finalmente vislumbrar a percepção do quanto Tudo tem a ver com o Todo.  Pensar que nada está isolado. Saber que se alguém faz um gesto do outro lado da Terra, onde é noite, em Lua, este gesto tem  conexão com o que um outro está a fazer, em outro lugar, onde é dia, em Sol. E assim  poder refletir que o bem, ou o mal estar humano, tem relação com o que   cada um, em Sol ou Lua, pode estar a provocar, realizar, promover nessa grande casa chamada Terra.

Que estímulo a Humanidade precisa para despertar, de forma profunda, sobre Valores como cuidado individual e coletivo, solidariedade,  simplicidade, olhar atento ao redor, na coragem e compromisso do  fazer, em prazer do Bem-viver coletivo?

O mundo, em dois anos, está a sinalizar sobre  necessidades de mudanças. Dois anos de pandemia e seus reflexos não seria um tempo longo, suficiente, para reflexão sobre o valor da vida?

Essa dádiva preciosa, que tanto gostamos, não merece ser preservada ?

É tempo de reforçar    a necessidade em equidade, garantia de direitos, acesso às mesmas condições de oportunidades.

É tempo de agirmos sobre o sentido da finitude da vida. Tempo de exercitarmos, cada um, o viver de forma prazerosa, digna.

Fome, desigualdade,  pobreza, lixo, água suja, violência, doenças evitáveis, comida que engana o estômago, idoso doente que morre sem afetos de filhos, gente que descarta comida como lixo ao tempo que nem observa o outro, ao lado,  com fome, ir catar essa comida em lugar impróprio, não seriam facetas a combater de um Ser demasiado desumanizado?

2021 foi ano onde o comando do Brasil  elevou o desgaste nas relações  econômicas, políticas, sociais, em tensões marcadas pelo autoritarismo, mentira, desrespeito, violência, perseguição à imprensa com agressões verbais,. físicas e morais à jornalistas. Quando um Governo persegue, desrespeita e agride a imprensa, está a transgredir o sagrado direito democrático de informar.

No ano em que a Cúpula Mundial se reuniu em Glasgow para debater os rumos da vida no Planeta e se constatou a falta de compromisso do Brasil com problemas humanitários sérios como desmatamento, uso  massivo de agrotóxicos, produção de commodities que acaba com riquezas naturais do Brasil, garimpo ilegal na Amazônia, incêndios florestais,  falta de direitos em territórios tradicionais como indígenas, quilombolas, pequenos agricultores. É hora de reações proativas eficientes, inteligentes, sensatas.

E 2021 chega ao fim com o agravamento de eventos climáticos extremos, em diversas regiões do Brasil, como na  Bahia, submersa. Eventos que desmontaram estruturas de moradia, impedem deslocamentos, acumulam prejuízos no comércio popular, devastam plantações de pequenos agricultores, faltam alimentos, morrem pessoas, criação de animais, deixam municípios isolados, acirram  problemas da fome, isolam  acessos comunitários. A continuidades das fortes e volumosas chuvas, com enchentes, em cenários devastadores de vida, levam organizações e o Governador da Bahia a pedir ajuda ao mundo.

E 2022 chega com essa carga pesada de necessidades. Coragem, compromisso e amor-ação pedem passagem em SOS.

Liliana Peixinho

Liliana Peixinho é jornalista, ativista social, integrante de diversos grupos de luta e defesa de direitos humanos. Fundadora e coordenadora de mídias livres como: Reaja – Rede Ativista de Jornalismo e Ambiente, Mídia Orgânica, O Outro no Eu, Catadora de Sonhos, Movimento AMA – Amigos do Meio Ambiente, RAMA -Rede de Articulação e Mobilização em Comunicação.

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