Programa de intercâmbio reduz 80% das vagas para baianos
Oito estudantes do curso de Engenharia da Ufba receberam a notícia do corte na semana passada; Capes ainda não se posicionou porque presidente viajou para os EUA
No dia 22 de março de 2016, o estudante de Engenharia Elétrica da Universidade Federal da Bahia (Ufba), Rafael Fucs, 21 anos, recebeu uma notícia que, em tese, mudaria sua vida: foi selecionado em terceiro lugar em um programa conjunto de pesquisa, realizada pela Coordenação de Aperfeiçoamento de Pessoal de Nível Superior (Capes), para fazer intercâmbio na França.
Antes de se inscrever em um dos projetos da Capes, o jovem, que nunca tinha ouvido uma palavra em francês, resolveu estudar sozinho o idioma, até então desconhecido. Focado, ele começou o curso em dezembro de 2015, com dedicação de dez horas por dia. “Eu comprei dois livros que vinham com CD. Passava o dia estudando”, disse.
No dia 20 de fevereiro, Fucs fez o teste de proficiência de língua estrangeira – uma das exigências para concorrer a bolsas de intercâmbio do programa Ciência sem Fronteiras – do nível intermediário, denominado de B2. “Tirei nove na prova, valendo dez”, relatou, orgulhoso. Quando viu seu nome entre os dez classificados no projeto Capes/Brafitec – como consta no edital (clique aqui) –, o estudante foi só alegria. “Comecei a planejar a viagem, as portas me seriam abertas. Abriria portas para toda a Europa e Canadá. Iria praticar inglês e francês. Voltar fluente em ambas as línguas”, pontuou.
No mesmo dia em que recebeu a boa nova, o futuro engenheiro começou a providenciar os documentos para realizar o seu sonho. Em pouco tempo, já tinha regularizado a situação para embarcar. Ele ia estudar na EIGSI, em La Rochelle, no sudoeste francês. “Mandei todos os documentos para a França, tirei passaporte e recebi a Carta de Aceite (clique aqui). Já estava pensando em vender o carro”, contou, ao relembrar que lutou para conquistar o automóvel, mas que, a fim de realizar o sonho, não relutava em se desfazer do bem.
No dia 22 de abril, exatamente um mês depois, foi do céu ao inferno: recebeu a ingrata notícia de que o programa sofreu um corte profundo que tirou o sonho de centenas de estudantes no Brasil, inclusive o dele. As seis vagas viraram apenas duas por projeto. O terceiro lugar de Rafael virou desclassificação.
A informação chegou por meio de uma circular (clique aqui). “Para o ano de 2016 serão seis cotas de bolsistas para ida em setembro/2016, independente do número do IES [Instituto de Ensino Superior] brasileiras participantes do projeto”, informa o texto. O projeto, do qual ele faz parte, engloba mais duas universidades: Unesp e UFSC. Cada instituição teria dez vagas de bolsistas disponíveis.
Abaixo-assinado – Com o corte, Fucs resolveu criar um abaixo-assinado na internet. Em poucos dias, o documento digital alcançou mais de cinco mil assinaturas. Até a publicação da reportagem, o contador marcou 5.345 assinaturas. Na página, outros estudantes do Brasil inteiro reclamam do mesmo problema.
“Em dezembro, fui selecionada para o programa Paristech, no qual os melhores alunos de cada curso são selecionados para estudar dois anos na França e obter a dupla diplomação. Entretanto, os alunos selecionados pelo Paristech dependem do recebimento da bolsa Brafitec para se sustentar em Paris. No tempo transcorrido, desde então, gastei muito dinheiro em cursos de francês e teste de proficiência, além de ter recusado um estágio, porque contava que iria ganhar a bolsa e ir estudar na França na metade do ano. O corte nas bolsas não só foi uma falta de respeito com os alunos, como também causa danos financeiros e psicológicos. Afinal, foram meses de planejamento e esforço que foram menosprezados pela Capes”, reclamou Iasmim Biasi, estudante de Porto Alegre.
Mas também há comentários favoráveis, como o de Felipe Oliveira, do Rio de Janeiro. “Diferentemente de outros programas de intercâmbio, os programas apoiados pela Brafitec são sérios com orientadores e contratos de previsão de volta dos graduandos quase ou já formados, influenciando diretamente de maneira positiva na educação, economia e desenvolvimento do país”, opinou.
Histórias cruzadas – O caso de Rafael se assemelha ao de outros estudantes baianos, como o do seu xará, Rafael Costa, 25. “O momento da classificação foi muito gratificante, pois foi resultado de um esforço grande para ser aprovado no processo seletivo”, disse, ao rememorar a sua nona colocação no projeto e lamentar a redução do número de vagas: “Teve um custo significativo tudo isso e o envio para a universidade francesa”.
Depois de se esforçar bastante, ter que aprender outro idioma, manter o Coeficiente de Rendimento [CR], abdicar de momentos com a família e de lazer para estudar bastante, investir em professor de francês, material de estudo, fazer atividades dentro da universidade para contar no currículo, o estudante Danilo Sandes, 25, também da Ufba, lembra o momento da aprovação. “Uma das maiores conquistas da minha vida. Uma das melhores sensações”, exaltou.
Mas, como seus colegas, sofreu com a medida. “Foi um balde de água fria. Depois de tantos planos, organizar documentos, aceitação da escola de engenharia francesa, retirada do passaporte e de tudo que foi investido ou abdicado, foi uma decepção, uma frustração”, lamentou.
Justificativa – Procurada pelo bahia.ba desde a quarta-feira (27), a Capes disse que “espera um parecer técnico para divulgar os dados” e justificar o corte expressivo das vagas para intercâmbio.
Além disso, outro motivo alegado pela demora em responder o questionamento é de que o presidente do órgão ligado ao Ministério da Educação, Carlos Afonso Nobre, viajou nesta sexta-feira (29) para os Estados Unidos.
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