Publicado em 04/05/2020 às 07h06.

Pesquisadores do Butantan combinam técnicas de biotecnologia para formular vacina

A nova estratégia é inspirada em um mecanismo usado por certas bactérias para “despistar” nosso sistema imune

Redação
Foto: National Institute of Allergy and Infectious Diseases (NIAID)
Foto: National Institute of Allergy and Infectious Diseases (NIAID)

 

Pesquisadores do Instituto Butantan vão combinar técnicas inovadoras de biotecnologia para formular uma nova vacina contra a Covid-19. O objetivo é induzir no organismo, de modo mais efetivo, diferentes tipos de resposta imune contra o novo coronavírus (SARS-CoV-2).

A nova estratégia é inspirada em um mecanismo usado por certas bactérias para “despistar” nosso sistema imune: elas liberam pequenas esferas feitas com o material de suas membranas como iscas para desviar a defesa do organismo. Essas vesículas, denominadas membranas pelos pesquisadores, têm a propriedade de ativar intensamente o sistema imunológico e, por isso, atraem células e moléculas da defesa do organismo.

Os pesquisadores vão aproveitar esse artifício das vesículas de membrana e acoplar a elas proteínas de superfície do novo coronavírus. Criadas em laboratório, essas vesículas atrairiam a defesa imune contra as proteínas de superfície do SARS-CoV-2, induzindo uma memória a ser mobilizada no caso de uma eventual infecção. A formulação estimularia não só a produção de anticorpos, mas também de outras células ligadas ao sistema imune, como macrófagos e glóbulos brancos.

“Para essa abordagem, juntamos duas estratégias diferentes que já vínhamos utilizando no desenvolvimento de vacinas contra outras doenças. A nova técnica permite que as formulações contenham uma grande quantidade de um ou mais antígenos do vírus em uma plataforma fortemente adjuvante, induzindo uma resposta imune mais pronunciada”, diz Luciana Cezar Cerqueira Leite, pesquisadora do Laboratório de Desenvolvimento de Vacinas do Instituto Butantan.

O estudo, apoiado pela FAPESP, integra uma plataforma de pesquisa que envolve o desenvolvimento de vacinas para coqueluche, pneumonia, tuberculose e esquistossomose, com base em técnicas desenvolvidas para a BCG recombinante (usada para prevenir formas graves de tuberculose em crianças). Recentemente, foi criada uma nova linha no projeto voltada ao desenvolvimento de uma vacina para a Covid-19.

“No mundo todo, e aqui no Brasil também, estão sendo testadas diferentes técnicas. Muitas delas têm como base o que já estava sendo desenvolvido para outros vírus, como o que causou o surto de SARS em 2001. Esperamos que funcionem, mas o fato é que ninguém sabe se vão realmente proteger. Neste momento de pandemia, não é demais tentar estratégias diferentes. A nossa abordagem vai demorar mais para sair, mas, se aquelas que estão sendo testadas não funcionarem, já temos os planos B, C ou D”, diz a pesquisadora.

Muitas vacinas consistem em soluções com o patógeno morto ou atenuado. São as chamadas vacinas celulares que, ao serem injetadas no indivíduo, têm por objetivo desenvolver a resposta imune contra o microrganismo, como anticorpos específicos e outras células de defesa de modo seguro, sem sofrer as consequências da doença. Dessa forma o indivíduo fica imunizado, tendo uma “memória de combate” do próprio sistema imune contra um determinado patógeno.

“As vacinas celulares são formas simples, e com frequência eficazes, de se obter um imunizante, porém, essas abordagens nem sempre funcionam, principalmente para patógenos com grande variabilidade antigênica ou organismos mais complexos, com mecanismos de evasão do sistema imune mais sofisticados”, diz a pesquisadora.

Estratégias combinadas – O grupo do Butantan propõe a combinação de duas estratégias para o desenvolvimento de uma vacina acelular. De um lado, tem-se as proteínas recombinantes de antígenos de superfície do novo coronavírus, que têm o papel de deflagrar a produção de anticorpos específicos contra o SARS-CoV-2. De outro lado, utiliza-se vesículas de membrana externa (Outer membrane vesicles conhecidos como OMVs) como matriz suporte dos antígenos, para que a partícula mimetize o vírus.

“As vesículas de membrana externa podem modular a resposta imunológica, em geral, aumentando e melhorando a proteção. Muitas vacinas têm o hidróxido de alumínio como principal adjuvante. No nosso caso, usaremos as OMVs para uma apresentação do antígeno com forte poder adjuvante embutido, que garante uma resposta melhor”, diz.

Maria Fernanda Ziegler | Agência FAPESP.

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