Publicado em 09/10/2025 às 06h00.

Quem foi John Lennon: 85 anos do gênio dos Beatles que reimaginou o mundo

Uma vida marcada por genialidade, rebeldia e um legado de paz que ecoa para a eternidade

João Lucas Dantas
Foto: Reprodução/ Redes sociais

 

No dia 9 de outubro de 2025, John Lennon completaria 85 anos. Nascido em Liverpool (Inglaterra) em 1940 e assassinado em Nova Iorque (EUA) em 1980, o músico transformou‑se de um jovem rebelde para um dos artistas mais influentes do século XX.

Ao lado dos Beatles, transformou o rock, e nas décadas seguintes, como artista solo e ativista, deixou uma obra repleta de coragem, vulnerabilidade e vontade de mudar o mundo. Mesmo décadas após sua morte, suas canções e atitudes continuam inspirando movimentos pacifistas e artistas contemporâneos.

Cofundador da banda, foi um dos quatro responsáveis por uma verdadeira revolução musical iniciada em 1960, que mudaria para sempre a história da música popular e do rock mundial. Poucas vezes o termo “gênio” se encaixa tão bem para descrever uma figura de tamanha magnitude. Compositor e músico fora de série, mostrou ao mundo que qualidade, experimentalismo, psicodelia, paz e amor podem andar de mãos dadas.

Passagem pelos Beatles

Lennon conheceu Paul McCartney em uma festa da igreja local em 1957. Os dois rapidamente começaram a ensaiar e compor juntos em casa. George Harrison (1943 – 2001) juntou‑se pouco depois, e nasceria o grupo que, anos mais tarde, se tornaria os Beatles. Ringo Starr entrou em agosto de 1962, substituindo o baterista Pete Best após ser convidado pelo então trio.

O biógrafo Ian Leslie (autor de John & Paul: A Love Story in Songs) observa que a parceria Lennon‑McCartney criou algumas das maiores obras da música popular e que “não havia John sem Paul, e vice‑versa”. Ambos impulsionavam um ao outro; enquanto Lennon era sarcástico e explosivo, McCartney era romântico e meticuloso. Essa tensão criativa produziu clássicos como Tomorrow Never Knows e Eleanor Rigby, que revelaram caminhos divergentes, mas complementares.

Na verdade, eleger um Beatle mais importante, é como escolher uma artéria coronária mais relevante para o corpo humano. Ambas trabalham de forma unida e eficiente para bombear o coração, assim como Lennon e McCartney jamais teriam alcançado a qualidade etérea que chegaram, sem o auxílio de George e Ringo, que, vale lembrar, também eram grandes compositores.

Com o grupo formado em 1960, e após a chegada de Ringo, o sucesso não tardou e singles como Love Me Do e Please Please Me, em 1963, catapultaram a banda rapidamente, os tornando um fenômeno cultural. Entretanto, com a exposição, começaram as controvérsias, com aquele grupo de jovens na faixa etária dos 20 anos cada.

Em 1966, Lennon declarou que os Beatles eram “mais populares que Jesus”, causando incêndios de discos e protestos. A partir de 1969, as tensões criativas, disputas de gestão e o desejo de explorar caminhos próprios levaram ao fim do quarteto, culminando em 1970 com o lançamento do último disco, Let It Be.

Apesar das dissensões, a relação entre Lennon e McCartney nunca se rompeu totalmente. Em meio aos ensaios para Get Back, John brincou dizendo que eles eram “como amantes” e, após anos de críticas como a mordaz música da carreira solo How Do You Sleep?, os antigos parceiros lentamente voltariam a se aproximar.

O fim dos Beatles foi resultado de uma soma complexa de fatores criativos, pessoais e empresariais. Após anos de convivência intensa e pressão mundial, as diferenças artísticas entre os quatro músicos começaram a se acentuar. John Lennon queria explorar sonoridades mais experimentais e engajadas politicamente; Paul McCartney buscava manter a coesão pop e melódica; George Harrison sentia-se cada vez mais subestimado como compositor; e Ringo Starr enfrentava o desgaste emocional de um grupo em conflito.

A morte do empresário Brian Epstein, em 1967, foi um golpe decisivo, ele era o elo diplomático que equilibrava os egos e mantinha a organização do quarteto. Com a ausência dele, os quatro mergulharam em disputas administrativas e falta de direção.

As sessões do White Album (1968) e, mais tarde, do Let It Be (1969), foram marcadas por tensões, gravações separadas e discussões constantes. Ao mesmo tempo, Lennon envolvia-se cada vez mais com Yoko Ono, integrando-a ao processo criativo, o que alterou a dinâmica interna. McCartney tentava manter o grupo unido, mas os outros já demonstravam cansaço e interesse em seguir caminhos próprios. O clima de camaradagem e colaboração que havia sustentado o grupo desde Liverpool dava lugar a ressentimentos e divergências artísticas.

A disputa final veio com questões financeiras e de gestão. McCartney queria que o advogado de sua confiança, Lee Eastman, administrasse os negócios da banda; John, George e Ringo preferiram Allen Klein. Essa divisão selou o distanciamento. Em abril de 1970, McCartney anunciou oficialmente sua saída, marcando o fim dos Beatles.

Apesar de cada um seguir uma carreira solo bem-sucedida, o grupo deixou para trás um legado inigualável. Em apenas uma década, reinventaram a música popular, redefiniu o conceito de banda e transformou a cultura do século XX.

Os Beatles na Abbey Road
Foto: Reprodução/ Redes sociais

 

Além dos Beatles: a busca por voz própria

Depois do fim da banda, Lennon mergulhou em uma fase de introspecção. Seu primeiro álbum pós‑Beatles, John Lennon/Plastic Ono Band (1970), trouxe letras confessionais e vocalizações cruas; ele “gritava mais do que cantava”, expondo traumas da infância e a perda de sua mãe, Julia Lennon (1914 – 1958). O disco foi aclamado pela crítica, mas vendeu menos do que os trabalhos em grupo.

Determinado a alcançar um público maior, Lennon suavizou as arestas em Imagine (1971). Produzido por Phil Spector (1939 – 2021), o álbum combinou melodias doces com críticas sociais. A faixa‑título alcançou o topo das paradas e é descrita pelo próprio como uma mensagem “antirreligiosa, antinacionalista, anticapitalista, ainda que coberta de açúcar”, chegando a compará‑la a um “manifesto comunista”.

As faixas Crippled Inside, Jealous Guy, Oh My Love e Gimme Some Truth examinam ciúmes, medo e hipocrisia política, enquanto How Do You Sleep? ataca McCartney, revelando feridas do recém‑encerrado grupo. “Então o Sgt. Pepper te pegou de surpresa/ Olhe melhor através dos olhos daquela mãe/ Aqueles esquisitos tavam certos/ quando diziam que você tava morto/ O único erro que você fez estava em sua cabeça/ Ah, como você consegue dormir a noite?“, proferia Lennon.

John continuaria a experimentar em Mind Games (1973), um álbum produzido por ele mesmo durante o período de separação de Yoko. A obra foi criticada pela inconsistência e vista como um conjunto de momentos dispersos, com canções que variam da magnífica faixa‑título a “rock’n’roll descartáveis” como Bring on the Lucie e Meat City. Ainda assim, ele utilizou músicas como Aisumasen e Out the Blue para expressar o desejo de reconciliação, e retornou a melodias delicadas em faixas como I Know I Know e You Are Here.

Durante seu “fim de semana perdido” em Los Angeles, Lennon iniciou Walls and Bridges (1974). Após sessões fracassadas de um álbum de covers com Phil Spector, ele voltou a Nova Iorque para produzir o disco e convidou amigos sob pseudônimos. O single Whatever Gets You Thru the Night, com participação de Elton John, tornou‑se seu primeiro número 1 solo, graças à insistência do amigo de que a música seria um sucesso.

Entre as canções, o sonho místico #9 Dream, inspirado por uma frase sussurrada num sonho, e baladas como Going Down on Love e Bless You expõem a solidão e o desejo de reconectar‑se com Yoko. O álbum foi apelidado de Lost Weekend album e é visto como um dos trabalhos mais sinceros de Lennon.

John Lennon e Yoko Ono
Foto: Reprodução/ Redes sociais

 

John e Yoko: amor, arte e ativismo

Lennon conheceu a artista conceitual Yoko Ono em uma exposição em Londres, em 1966. Ele afirmou posteriormente que seu amor por ela valia mais do que fama ou fortuna: “Isso é mais do que um hit, mais do que tudo”. O casal casou‑se em Gibraltar em março de 1969, e a união rapidamente se tornou artística e política.

Nas duas luas de mel – as célebres Bed‑ins for Peace em Amsterdã e Montreal –, eles ficaram deitados por uma semana enquanto recebiam a imprensa e defendiam o fim da Guerra do Vietnã. Lennon explicou que, se iria aparecer nos jornais, “ao menos que fosse pela paz”. No segundo bed‑in, gravou Give Peace a Chance com participantes como o ativista Dick Gregory, canção que se tornou hino dos protestos contra a guerra. Pouco depois, eles lançaram a campanha War Is Over! If You Want It e, com o Harlem Community Choir, a música natalina Happy Xmas (War Is Over).

Além das performances de protesto, o casal envolveu‑se em causas progressistas. Ao se mudarem para Nova Iorque em 1971, tornaram‑se alvos do governo Nixon, que tentou deportá‑los. Eles participaram do rally pela libertação do poeta John Sinclair, condenado a dez anos de prisão por posse de maconha, ao lado de Stevie Wonder.

Durante o chamado “fim de semana perdido” (período de separação de Yoko, que durou entre 1973 e 1975), Lennon teve um relacionamento com a assistente May Pang; porém, ele e Yoko reconciliaram‑se em 1975, renovaram seus votos e dedicaram‑se à criação de Sean Lennon. Afastaram‑se das gravações para viver a maternidade e paternidade, retornando ao estúdio em 1980. Lennon afirmou que sentia que o público havia amadurecido e que estava pronto para compor novamente. Mesmo enfrentando críticas misóginas contra Yoko, ele reconheceu que sua “deusa” o ajudou a sobreviver e que as hostilidades eram dolorosas.

Em 1980, ele e Yoko, retornaram com Double Fantasy, alternando composições de ambos. A autobiográfica Watching the Wheels foi gravada em agosto daquele ano com músicos como o baixista Tony Levin e o baterista Andy Newmark.

Lennon explicou que a música refletia seu período de retiro: olhar para si mesmo era mais difícil do que gritar slogans como Revolution ou Power to the People. O álbum ainda traz (Just Like) Starting Over e Woman, canções nas quais ele celebra a nova fase familiar e a relação com Yoko.

Tensões e reconciliações com os Beatles

O rompimento dos Beatles em 1970 foi marcado por acusações mútuas e disputas legais. Lennon sentia‑se sufocado pela estrutura empresarial da banda. A mídia alimentou a narrativa de rivalidade; porém, testemunhos revelam que a amizade não se encerrou.

Com o passar dos anos, ambos retomaram o contato. Em 1974, Lennon participou de sessões informais com os outros Beatles; nos anos finais, trocou cartas e telefonemas com McCartney, planejando possíveis colaborações.

Embora fontes consultadas não detalhem gravações conjuntas após 1974, os relatos indicam que a reconciliação pessoal ocorreu antes de sua morte.

John Lennon ao lado de Mark Chapman
Foto: Reprodução/ redes sociais

 

Fim trágico e o despertar de um mundo em luto

Em 8 de dezembro de 1980, Lennon e Yoko retornavam para o edifício Dakota, em Nova Iorque, após uma sessão de gravação. Um fã armado, identificado como Mark Chapman, disparou quatro vezes; Lennon sofreu hemorragia massiva, choque e morreu poucos minutos depois, no Hospital Roosevelt.

O assassino declarou aos porteiros: “Acabei de atirar em John Lennon” e alegou inveja como motivação. Mais cedo naquele dia, John havia autografado um disco para Chapman e comentado com Yoko que gostaria de ver o filho Sean antes que ele fosse dormir.

O crime gerou vigílias em todo o mundo; milhares reuniram‑se em Central Park, Chicago e Liverpool em silêncio e lágrimas. A comoção global demonstrou a profundidade do vínculo do público com Lennon.

Legado que não se apaga

O impacto de John Lennon permanece visível 45 anos após sua morte. Suas músicas continuam a ser regravadas e reimaginadas; artistas como U2, Oasis e Coldplay citam sua influência. Dificíl seria dizer qual músico (a) não se inspirou no quarteto de Liverpool, em uma era pós-Beatles. Hinos como Give Peace a Chance ainda ecoam em manifestações pacifistas, e Imagine é cantada em encontros pelos direitos humanos e em cerimônias de união.

Seus álbuns solo, de Plastic Ono Band a Walls and Bridges, mostram uma disposição rara de expor fragilidades e evoluir musicalmente, enquanto a parceria com Yoko inspirou artistas a unir vida, arte e ativismo. Lennon enfrentou críticas, mas nunca deixou de experimentar ou defender suas convicções; sua trajetória prova que a música popular pode ser tanto entretenimento quanto ferramenta de transformação social.

Aos 85 anos de seu nascimento, John Lennon continua sendo uma figura que desafia categorias. Como Beatle, ajudou a reinventar a música pop; como artista solo, abordou temas pessoais e políticos com coragem; como ativista, utilizou sua fama para defender a paz e os direitos civis; como parceiro de Yoko Ono, viveu uma relação de amor e arte que desafiou convenções.

Seu assassinato pôs fim a uma vida criativa, mas não ao seu legado. Celebrar Lennon é enaltecer a capacidade da música de imaginar um mundo melhor e inspirar aqueles que ainda acreditam no poder da paz.

João Lucas Dantas
Jornalista com experiência na área cultural, com passagem pelo Caderno 2+ do jornal A Tarde. Atuou como assessor de imprensa na Viva Comunicação Interativa, produzindo conteúdo para Luiz Caldas e Ilê Aiyê, e também na Secretaria Municipal de Cultura e Turismo de Salvador. Foi repórter no portal Bahia Econômica e, atualmente, cobre Cultura e Cidade no portal bahia.ba. DRT: 7543/BA

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