Médicos do Hospital da Chapada Diamantina pedem demissão coletiva
Gestão da unidade é da Associação de Promoção da Maternidade e da Infância, que está sendo investigada pela Polícia Federal por suspeita de fraude em licitações
Por Aurélio Nunes, especial para o bahia.ba
Com salários atrasados desde agosto, onze médicos que trabalham nos setores de emergência, UTI Covid-19 e UTI Geral do Hospital Regional da Chapada Diamantina (HRCD) comunicaram à administração da unidade que não farão parte dos plantões de dezembro caso as pendências não sejam regularizadas até a próxima segunda (30).
Os plantonistas reivindicam ainda reajuste dos valores de contrato, que atualmente é de R$ 2.400 brutos por 24 horas na UTI e estariam defasados em relação a outras unidades estaduais, além de “renovação do contrato com alterações que garantam o pagamento nas respectivas datas e direitos aos médicos”.
“Somos um grupo pequeno de médicos, quase todos sobrecarregados, trabalhando com carga horária acima do limite físico, com salários atrasados, e até agora ninguém apareceu para dar uma resposta de como será resolvido o problema: nem a Sesab, nem a empresa que administra o hospital e que neste momento está em meio a uma investigação de fraudes de licitações”, critica um dos médicos, referindo-se à Associação de Promoção da Maternidade e da Infância (APMI) de Castro Alves, organização social de saúde (OSS) responsável pela gestão do HRCD.
A reportagem do bahia.ba teve acesso aos ofícios, todos com a mesma redação, enviados na segunda-feira (23) ao diretor clínico Adriano Silva Pires, que não respondeu às ligações e mensagens deixadas em seu celular. Também entrou em contato com o secretário de Saúde do Estado da Bahia, Fábio Villas-Boas. Ele encaminhou o assunto à sua assessoria de comunicação, que, até o momento do fechamento desta matéria, não havia se posicionado. O diretor administrativo do hospital, Francisco Macedo, se limitou a dizer que as denúncias “não procedem”. A jornalista que ele indicou como assessora de imprensa responsável diz que não trabalha mais para a APMI.
Fraudes
No último dia 19, a APMI foi alvo de uma operação deflagrada pela Polícia Federal com objetivo de desarticular esquema de fraude em licitações e desvio de recursos públicos destinados à gestão do Hospital Regional de Juazeiro (HRJ). As investigações apontam que mais de R$ 6 milhões foram desviados entre setembro de 2017 e dezembro de 2019 por uma organização criminosa que fraudou licitações públicas e passou a dominar a gestão de inúmeras unidades da rede estadual de saúde, sob gestão indireta, por intermédio de diferentes OSS’s, quase sempre registradas em nome de “laranjas”.
Ainda segundo a PF, essas instituições gestoras direcionavam o resultado das licitações a empresas de fachada ligadas ao grupo, sem que muitos dos serviços fossem efetivamente prestados ou os produtos fossem fornecidos. O nome da operação, Metástase, faz alusão à corrupção como uma espécie de câncer que se espalha pela sociedade. Na segunda-feira (23), a APMI foi descredenciada pela Sesab da gestão do Hospital de Juazeiro.
A situação da APMI preocupa os médicos do Hospital da Chapada, que esperam por uma decisão semelhante à decisão tomada pela Sesab em relação ao Hospital de Juazeiro.
Eles relatam que, além dos salários atrasados, são obrigados a lidar com escalas de trabalho exaustivas; falta de medicamentos na farmácia e equipamentos obsoletos. “Como temos alguns médicos contaminados por coronavírus, e a equipe é pequena, temos que nos desdobrar para cobrir os plantões de quem está afastado por contrair o coronavírus. Plantões de 24 horas têm virado de 48horas, de 72 horas, e já chegamos ao absurdo de um colega que ficou cinco dias seguidos de plantão”, reclama uma médica.
“Embora o hospital tenha sido inaugurado em dezembro de 2017, muitos aparelhos que vieram de outras unidades são antigos, como o raio-x, que às vezes dá problema, e o hemogasômetro, que é fundamental para pacientes que estão no ventilador, e está desde a semana passada sem funcionar”, denuncia.
Embora os médicos sejam os que mais reclamam, os atrasos salariais impactam de maneira ainda mais dramática a vida dos mais de 200 funcionários do HRCD. Enfermeiros, técnicos de enfermagem, equipes de limpeza e de segurança ainda não receberam o salário de outubro. “Ganho R$ 1.450 por mês, e gasto R$ 480 de transporte porque moro em outra cidade. Se eu não receber meu salário até sexta-feira (27), não tenho como trabalhar na semana que vem”, declara uma funcionária.
A situação do HRCD é particularmente preocupante para os moradores dos 11 municípios do entorno de Seabra, que têm na unidade o único hospital geral com atendimento SUS 24 horas para casos de urgência e emergência clínica, cirúrgica, obstétrica, pediátrica, traumato-ortopédica e psiquiátrica. São 110 leitos, 10 para UTI Geral e ganhou seis leitos de UTI e uma enfermaria específica para o tratamento do novo coronavírus.
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